Sergio Moro começa a receber os
despojos de uma rapina que está longe de acabar. Juiz de primeira instância
percebeu entre seus surtos de grandeza que estaria na política, e não no
direito, a sua maior oportunidade de brilhar num país sedento de salvadores
Carlos Fernandes, DCM*
Minha avó costumava dizer que
formiga quando quer voar, cria asas. Essa metáfora da sabedoria popular talvez
seja a que melhor explica todos os esforços de um juiz outrora desconhecido que
acabou sendo alçado à incompatível condição de herói nacional.
Inebriado pelos holofotes do qual
foi imediatamente submetido pela grande imprensa, o juiz de primeira instância
percebeu entre seus surtos de grandeza que estaria na política, e não no
direito, a sua grande oportunidade de brilhar num país sedento de salvadores.
A operação Lava Jato, que a
princípio não passava de tão somente mais uma investigação entre tantas outras,
transformou-se no seu grande passaporte para o estrelato.
Infestada de políticos corruptos
de todas as estaturas e agremiações partidárias, não tardou para que o
magistrado enxergasse na específica criminalização do PT, o foco de toda a sua
atuação para que os despojos de uma grande rapina também lhe fosse devido.
Unidos a fome com a vontade de
comer, o partidarismo ululante de Sérgio Moro achou o respaldo necessário para
que abdicasse de vez da condição de juiz e passasse a engrossar as fileiras dos
seus detratores.
A caçada que se deu a partir daí
ao grande troféu a ser exibido nas primeiras páginas dos jornalões,
escandalizou juristas de todas as tendências garantistas ao redor do mundo.
Moro sabia que se Lula não fosse
condenado, preso e inabilitado de concorrer às eleições que se avizinhavam, o
seu trabalho não estaria completo e sua parte no butim não lhe seria dado.
Aqui cabe um esclarecimento
preliminar. Dinheiro, por si só, é para principiantes, o que a malta que tomou
de assalto a presidência da República queria mesmo era o poder, fonte, entre
tantas outras coisas, de recursos financeiros praticamente inesgotáveis.
Definidos dessa forma os despojos
a serem faturados, bastaria a legitimação do golpe de 2016 via processo
democrático.
A eleição de Jair Bolsonaro é o
resultado maior, até aqui, de todo o trabalho realizado pela “República de
Curitiba” encabeçada pelo sempre lustroso Sérgio Moro.
Mercadoria entregue, chega a hora
da recompensa.
Os tratamentos para o seu cargo –
acordados ainda em período de campanha como deu com a língua nos dentes o
vice-presidente eleito, Hamilton Mourão – escandalizaram, mais uma vez, o
universo jurídico nacional e internacional.
A conversa oficial e a consequente
e completamente esperada aceitação do magistrado das alterosas, coroaram um
acordo prévio firmado há um bom tempo atrás.
Moro, para quem em sua primeira
entrevista pós-Lava Jato havia afirmado categoricamente que “jamais entraria
para a política”, estreará como um super-ministro no mais autoritário e
intolerante governo brasileiro desde o fim da ditadura militar de 64.
Sua atração irremediável pelas
câmeras poderá a partir de agora ser saciada diariamente ao lado de baluartes
da corrupção nacional como Magno Malta e Onyx Lorenzoni, além, é claro, do seu
agora superior imediato, o próprio Jair Bolsonaro.
Como se vê, o voo da formiga se
mostra promissora e mira outros horizontes. O STF, cujo o presidente eleito
poderá ter a oportunidade de nomear dois novos ministros em seu mandato, é uma
de suas metas mais escancaradas.
Mas a ninguém pode ser dado o
direito de duvidar: uma vez político, sempre político. E como, provado está,
fazer cumprir a lei não lhe apetece, ser um dia presidente é sempre uma
alternativa a se avaliar.
E enquanto tudo isso acontece, o
mais famoso preso político da atualidade continua a cumprir a sua prisão
injusta (e agora oficialmente comprovada sobre a que termos se deu) sob os
olhares estupefatos de toda a comunidade jurídica mundo afora.
É realmente atordoante a
inacreditável capacidade desse país de se reinventar para que se apresente
sempre como um terrível e melancólico território fadado ao empoderamento de uns
poucos ao custo da mais absoluta expropriação e pobreza de seu povo.
E como tudo nesse país sempre
pode piorar, é ao som dos aplausos dos ignorantes que a rapina continua e não
tem data para acabar.
* em Pragmatismo Político
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