sábado, 16 de junho de 2018

Portugal | Deixem-nos rir: Bancada do PS contra “nova” legislação laboral…


A “nova” lei laboral foi criticada pela bancada parlamentar do PS em reunião de há dois dias. Talvez porque não é nova mas sim a do costume, em que quem se lixa é o “mexilhão”, quer dizer, os trabalhadores. Talvez também porque Costa e outros do atual governo já olham para caminhos esconsos futuros das suas zonas de conforto e abastança.

À luz do passado nunca se sabe se uns quantos que governam e olham para se “governarem” não farão uns “jeitos” a fim de assegurarem os seus futuros com opíparos vencimentos em grandes empresas: GALP, EDP, Mota Engil, etc. e as mais que vierem. À luz do passado tem sido assim, uns quantos dos governos idos (CDS, PSD, PS) safam-se maravilhosamente servindo o grande patronato nessas empresas. Pelas suas competências ou lindos olhos? Os portugueses sabem o que deles pensam e o que deles sentem e dizem. Aos próprios visados isso entra-lhes a 100 e sai-lhes a 200. O que lhes importa é olharem para as continhas bancárias e/ou offshores e verem-nas recheadas. São na realidade desonestos e desavergonhados. Cambalacheiros.

Pelo menos presume-se que não seja por acaso que neste governo, como em governos anteriores, a corrupção, o conluio e o nepotismo não sejam considerados tema a atacar e a legislar seriamente no seu combate. E isso diz imenso, se não tudo, dos partidos e dos políticos que em Portugal vagabundeiam em esquemas sombrios e enjeitem a transparência com um forte “te arrenego” secreto mas evidente. Aliás, dizem-se sempre a favor da transparência, contra a corrupção, mas na prática denunciam-se favoráveis a manterem tudo na mesma e a usufruírem da negritude que lhes permite tirarem descaradas vantagens e enriquecerem num ápice de forma que alarvamente consideram legal apesar de todos sabermos que são métodos imorais, tantas vezes criminosos – mas que beneficiam de “alçapões” criados pelo legislador – que são ou foram eles próprios. Ou seja, estão a legislar em causa própria e das suas pandilhas.

E vem agora a bancada do Partido Socialista (PS) deixar perceber, na prosa do Diário de Notícias que se segue, que é crítico acerca da “nova” legislação laboral… Deixem-nos rir, a hipocrisia devia ter limites. (MM | PG)

Deputados do PS criticam nova lei laboral feita pelo Governo

Norma da proposta de lei do Governo que duplica (para seis meses) o período experimental de trabalho contestada na bancada socialista. Vão ser introduzidas alterações

Uma reunião da bancada parlamentar do PS na quinta-feira à noite serviu ao Governo para perceber as reservas do grupo parlamentar socialista à revisão do Código do Trabalho que o Executivo conseguiu acordar na Concertação Social (exceção feita à CGTP, que não alinhou).

Segundo o DN apurou junto de várias fontes da bancada, as reservas foram sobretudo expressas pelos deputados Tiago Barbosa Ribeiro (coordenador dos deputados do PS na comissão de Trabalho e Segurança Social), João Galamba e Wanda Guimarães (histórica dirigente sindical do PS). Na reunião esteve presente o ministro da pasta, Vieira da Silva, e ainda o principal "pivot" governamental para as negociações dentro da "geringonça", Pedro Nuno Santos, secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (que só ouviu, não falou).

Em causa esteve, sobretudo, a norma da proposta de lei do Governo que, em determinadas condições, alarga o período experimental de trabalho de três para seis meses. Tal como os partidos à esquerda do PS, os três deputados contestaram esta norma, alegando, nomeadamente, que as empresas poderão dar uma utilização abusiva a esta inovação legislativa, usando na prática o período experimental como um contrato a prazo não renovável.

Segundo o DN soube, foram feitas considerações sobre a possibilidade de se introduzir na proposta de lei um dispositivo travão para impedir o tal uso abusivo - mas sem que isso aplique uma violação do acordo na Concertação Social em torno das normas que o Governo agora quer levar a votos.

Ouviram-se também reparos sobre a necessidade de o PS se manter sintonizado com a solução de esquerda que tem apoiado o Executivo de António Costa em vez de privilegiar acordos que, na prática, aproximam o PS e o Governo do PSD.

No final da reunião, o líder parlamentar, Carlos César, reconheceria implicitamente as críticas internas à proposta de lei governamental dizendo que a bancada apresentará propostas de alteração ao diploma governamental quando ocorrer a discussão na especialidade, para que as suas normas sejam "melhoradas" e "clarificadas".

Segundo disse, o acordo de concertação social - muito criticado pelo BE e PCP - inclui "medidas positivas" e que "foi muito importante que áreas patronais pudessem concorrer para essa melhoria da vida e da segurança no trabalho". Contudo, logo a seguir salientou que "é importante também, no entender do PS, que algumas áreas sejam ainda melhor clarificadas e que as iniciativas do Governo sejam aqui melhoradas". "E foi isso mesmo que transmitimos ao senhor ministro. Vamos analisar em detalhe as propostas e iremos apresentar propostas de alteração e estabelecer um diálogo com todos os partidos políticos", disse.

César também salientou a necessidade de preservar os alinhamentos do PS à sua esquerda: "Nós faremos um esforço para que outros partidos, designadamente aqueles que partilham connosco este projeto governativo nesta legislatura, também concorram para essas melhorias e, se possível, participem na sua aprovação."

No dia 6 de julho, o Parlamento vai discutir a proposta de lei do governo que saiu da concertação social, mas o diploma não irá sozinho a debate: há mais 19 projetos em cima da mesa, sete do BE, seis do PCP, três do PEV e um projeto de resolução do CDS.

João Pedro Henriques e Susete Francisco | Diário de Notícias

Portugal | Ódio


Isabel Moreira | Expresso | opinião

O feminismo passa sem alarido se for silencioso. O feminismo passa sem espancamentos se não tiver rostos e vozes, se não tiver, enfim, visibilidade. Se o feminismo se atreve a ganhar voz e, portanto, espaço, descobrimos o que sempre aqui esteve: ódio.

Descobrimos que o sexismo e a misoginia são cancros sociais. As feministas atrevem-se a expandir as suas reivindicações, porque sabem que a violência doméstica “que a todos une” só pode ser combatida se tudo o que diz respeito a desigualdade de género, a estereótipos de género, for combatido. Atrevem-se.

É por isso que homens e mulheres feministas alertam para a eficácia negativa de livrinhos de escola diferenciados ou para campanhas antitabágicas com a “princesa” e a mãe “culpada”.

Nesse alerta há resultados e, subitamente, somos invadidos por campanhas de ridicularização, que são ódio.

Se fosse ingénua, teria dificuldade em perceber o que leva tanto cronista e comentador furioso nas redes sociais a insultar quem se bate pela igualdade em vez de optar pelo debate.

Como não sou ingénua, sei que o ódio espontâneo que a visibilidade do feminismo gera é ele próprio prova do sexismo e da misoginia que sempre aqui esteve.

Tem sido extraordinário descobrir, como tantas pessoas, que sou histérica, urbana, alguém com acesso à comunicação social (alguém, ou uma mulher?), dada à censura, enfim, sou muitas coisas que homens “sem privilégio algum” colaram na minha e noutras testas.

Conservar é muito mais cómodo do que fazer pelo progresso.

Temos histórias para contar.

Temos história para fazer.

E podemos.

Advogados e juristas são-tomenses queimam os seus diplomas em sinal de protesto


Advogados e juristas são-tomenses queimaram os seus diplomas universitários em protesto contra a reforma da justiça e a exoneração compulsiva dos magistrados do Supremo Tribunal de Justiça.

É um caso inédito. Juristas e advogados queimaram na tarde desta segunda-feira (11.06) os seus diplomas universitários na praça pública, numa manifestação contra a reforma da justiça em curso em São Tomé e Príncipe que está a ser implementada pelo Governo desde início do ano.

A comunidade jurídica do arquipélago não concorda com a implementação da referida reforma que no entender da Ordem dos Advogados visa apenas atingir um grupo de pessoas, garante a bastonária Célia Pósser.

"Desde a criação do Tribunal Constitucional, a exoneração compulsiva dos juízes, e posterior promulgação da lei tem acontecido muitas aberrações ao nível da reforma da justiça. Nós agora temos uma lei que prevê para nomeação dos novos juízes do Supremo, um concurso público e depois vem dizer na mesma lei que os juízes são nomeados pela Assembleia Nacional . Essa disposição legal vem anular todas as decisões tomadas pelos antigos juízes do Supremo Tribunal de Justiça e considera-as inexistentes", refere a bastonária.

Para a bastonária da Ordem dos Advogados, a decisão da Assembleia Nacional em exonerar os antigos magistrados do Supremo Tribunal de Justiça, e considerar nulas as suas decisões abre o caminho para várias interpretações e com consequências negativas para o Estado são-tomense.

"Isto é uma aberração, e não diz a data limite para os processos considerados sem efeito. Podem ser decisões tomadas há dez ou vinte anos, quero dizer que são inexistentes neste momento. É uma medida totalmente inaceitável”, afirma.

Comunidade Internacional atenta à crise na Justiça

Para os observadores, a queima dos diplomas por parte dos juízes e magistrados é uma demonstração de descontentamento pela inversão do Estado de direito democrático em São Tomé e Príncipe. Uma manifestação também aplaudida também pelo Sindicato dos Magistrados, segundo o seu presidente Leonel Pinheiro, em entrevista a  DW África.

"Nós congratulamos com este gesto da Ordem, porque entendemos que é mais uma forma de lutar contra aquelas atitudes e ações que tendem por em causa, o Estado de direito democrático”, disse o magistrado.

O sindicato dos magistrados posiciona-se ao lado da Ordem dos Advogados e entende que esta decisão do Governo e da Assembleia Nacional descredibiliza o sistema judiciário.


Recorde-se, que recentemente a União Internacional de Juízes de língua portuguesa afirmou num comunicado que segue com muita atenção crise na justiça em São Tomé e Príncipe e aproveitou para exigir às autoridades competentes o cumprimento escrupuloso da separação de poderes. Esta posição veio na sequência da exoneração compulsiva de Alice Carvalho, Silva Gomes Cravid e Frederico da Glória, magistrados do Supremo tribunal de Justia, em virtude de terem devolvido a Cervejeira Rosema ao empresário angolano, Melo Xavier.

Em 21 de abril, um acórdão do STJ decidiu sobre a "restituição imediata da gestão da Cervejeira Rosema e todos os bens penhorados e apreendidos na presente execução e outros bens móveis ou imóveis, incluindo todas as ações da Ridux pertencentes à Cervejeira Rosema, a acionista maioritária daquela firma, à sociedade angolana Ridux, na pessoa do seu administrador Mário Silva Mello Xavier".

O Parlamento são-tomense aprovou, cerca de duas semanas depois, com 31 votos a favor e seis contra, um projeto de resolução que "exonera e aposenta compulsivamente" três juízes do presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), incluindo o presidente - todos os que decidiram no acórdão sobre a devolução da Rosema.

O primeiro-ministro Patrice Trovoada, que se encontrava fora do país caucionou no seu regresso a decisão parlamentar, sublinhando que ela resulta do "comportamento de muita gente que não ignora a lei, conhece a lei, sabe o que é justo e não é justo, mas que põe acima de tudo os seus interesses particulares".

Ramusel Graça | Deutsche Welle

ANGOLA | O desafio do Executivo ao sector privado


Mais uma vez os privados são chamados a desempenhar o papel que deles se espera numa economia de mercado, como a angolana, em que o Estado tem procurado, gradualmente, trocar o seu papel interventivo a favor do regulatório.

Jornal de Angola | editorial

Já lá vai o tempo das históricas e famosas  “unidades económicas estatais”,  também conhecidas pelas iniciais “U.E.E.”, que caracterizavam as empresas detidas, geridas e controladas pelo Estado. Pouco tempo depois da abertura à economia de mercado, Angola testemunhou o ensaio de um conjunto de iniciativas, algumas que ficaram na História como o “Programa de Redimensionamento Empresarial” que, entre outros fins, visava dar espaços aos operadores privados. 

Muito recentemente, quando sopravam os ventos das “parcerias público-privadas”, parecia crescer a tendência para o Estado envolver-se em sociedades com entidades privadas, uma experiência que se revelou desaconselhável a julgar pelo facto da balança quase sempre pender desfavoravelmente para o Estado. 

Na verdade, em todos estes ensaios nem sempre o papel dos privados foi directamente proporcional às expectativas levantadas na medida em que se conhecem, até  hoje, muito poucas experiências bem sucedidas. Contrariamente à ideia segundo a qual “Estado é o problema” e o “privado a solução”, quando se trata do papel a ser exercido como operador económico e comercial, a realidade angolana contraria um bocado essa percepção. 

É verdade que as instituições do Estado devem continuar a fazer prova das reformas que promovem no sentido de assegurar aos privados as atribuições e papel  que efectivamente estes devem desempenhar. 

Precisamos rapidamente de evoluir para um estádio diferente do actual em que os privados continuam a olhar para o Estado como o seu parceiro e preferencial cliente. Em que grande parte das pessoas em busca do primeiro emprego pretendem ser empregados preferencialmente nas instituições do Estado. 

Dificilmente Angola poderá transformar-se numa verdadeira economia de mercado se continuarmos a ter operadores económicos e comerciais que apenas tenham o Estado como o seu principal parceiro. 

Em todo o caso, acreditamos  que vamos ainda a tempo de fazer as correcções que se impõem, numa altura em que o Executivo volta, mais uma vez, a lançar o repto ao sector privado. 

Esperemos que os empresários e empreendedores angolanos estejam preparados  para o anúncio do ministro do Comércio segundo o qual, nos próximos dias, o Executivo vai apresentar um  Projecto Integrado para a Comercialização da Produção Rural, para impulsionar o desenvolvimento, integração nacional e o escoamento de produtos do campo para os grandes centros de consumo. Tal como se espera em qualquer economia de mercado, ao Estado caberá essencialmente  o papel regulatório, sendo o mais importante a possibilidade dos empreendedores privados contribuírem para o fomento de emprego e de criação de riqueza. No mundo rural há inúmeras oportunidades que, como pretendemos acreditar, com a intervenção dos operadores privados Angola vai ficar mais e melhor servida.

"Nada mudou na Justiça angolana", diz Rafael Marques


O Tribunal Provincial de Luanda agendou a sentença do julgamento de Rafael Marques e Mariano Brás para 6 de julho. Hoje foram ouvidas as alegações finais. A DW África falou com o ativista no final do processo.

A defesa do ex-Procurador-Geral da República de Angola João Maria de Sousa pediu a condenação dos jornalistas Rafael Marques e Mariano Brás, acusados de crimes de injúria, e uma indemnização de quatro milhões de kwanzas (€14 000) ao ofendido. A DW Ãfrica falou com Rafael Marques para perceber em que ponto está a situação.

DW África: Depois das alegações finais, acha que ainda existe matéria para não absolver os réus Rafael Marques e Mariano Brás?

Rafael Marques (RM): Provou-se em tribunal que todo o processo de aquisição do terreno em causa (três hectares em Porto Amboim) pelo então Procurador-Geral da República (PGR) foi ilícito. Agora o que o Ministério Público (MP) foi defender em tribunal é que esses ilícitos eram da responsabilidade da administração local.

DW África: Isso quer dizer que a 6 de julho Rafael Marques e Marino Brás serão absolvidos?
RM: É a justiça do regime e isso só o regime pode respondeer. Não serei eu a responder porque pela atitude do MP e com as provas que foram apresentadas vê-se claramente qual a direção que estão a seguir.

DW África: Mantêm-se ainda as acusações de injúria contra os dois jornalistas feitas pelo ex-PGR?

RM: Mantêm-se não só as acusações de injúria como o MP também exige a minha condenação pelo crime contra a segurança do Estado por ter dito que o José Eduardo dos Santos (ex-Presidente de Angola) protegia os corruptos.

DW África: Então até agora nada está esclarecido neste processo...

RM: Diria o contrário...claro que tudo está esclarecido neste processo. No tribunal provou-se que houve ato de corrupção, porque o Procurador recebeu o terreno, assinou o título de concessão sem ter pago um único kwanza ao Estado angolano. Qualquer ato de recebimento de um património do Estado com perda para o Estado é um ato de corrupção. Agora, o que o MP defende é que esse ato de corrupção é da responsabilidade da administração local. Quer dizer, há corrompido mas não existe o corruptor.

DW África: Como é que um ex-PGR não teve o cuidado de analisar um processo em que o seu próprio nome constava?

RM: Esta é a pergunta que qualquer pessoa sensata faz. Mas quando se trata da administração da justiça em Angola, não estamos a falar de sensatez ou de lei. Em Angola, quando são casos que envolvem altas figuras do regime não falamos nem de bom senso, nem de respeito pela legalidade. Falamos simplesmente de quem tem poder.

DW África: Mesmo com a nova era "inaugurada" com a chegada à Presidência de Angola de João Lourenço em que a situação parece bem melhor?

RM: Quando o MP hoje (15.06) vem acusar-me em tribunal por ter dito que José Eduardo dos Santos protegia os corruptos e quando exigem a minha condenação o que é que mudou na Justiça angolana?

DW África: Estará tranquilo até o dia 6 de julho, dia da sentença?

RM: Sempre estive tranquilo porque sou um cidadão de consciência livre.

António Rocha | Deutsche Welle

BRASIL | Eleições 2018: A caricatura neoliberal e globalizante de Bolsonaro


Pré-candidato tenta seduzir o ”mercado”, corteja Trump e os EUA desbragadamente e, por ora, reina no eleitorado reacionário

Sucesso entre jovens homens brancos endinheirados e escolarizados do Centro-Sul, o perfil médio do brasileiro hoje disposto a votar nele para presidente, Jair Bolsonaro era só mais um deputado até 1999.

Aí começou o segundo governo FHC e ele perdeu a estribeira na Band. Defendeu fuzilar o presidente que “atende o FMI para poder honrar compromissos junto à agiotagem internacional”, o tucano responsável por uma “dívida impagável”, merecedora de “moratória urgentemente”.

A repentina notoriedade logo o levaria ao SBT, e a uma nova explosão: “Barbaridade é privatizar, por exemplo, a Vale do Rio Doce como ele (FHC) fez, é privatizar as telecomunicações, é entregar nossas reservas petrolíferas para o capital externo”.

Aquele quarentão raivoso ficaria espantado se descobrisse o que se tornou aos 63 anos. Certamente, proporia paredão para si próprio. Quem sabe um haraquiri, o ritual suicida dos guerreiros japoneses. 

Na ambição de chegar ao poder na hoje imprevisível eleição, o ex-capitão do Exército entrou numa disputa com o PSDB de FHC sobre quem é mais neoliberal e antinacionalista, quem é mais amigo do “mercado” e de Tio Sam. Promete privatizações por atacado, fechar outras tantas estatais, bate continência para a bandeira dos Estados Unidos, jura que vai “respeitar contratos”, forma cifrada de dizer que não fará auditoria da dívida nem reestatizará empresas.

Conversão sincera aos dogmas do Consenso de Washington, aqueles que passam vergonha na Argentina por esses dias? Ou tentativa de iludir o establishment econômico e político brasileiro para ser aceito?

Certo é que no “mercado” há uma fatia razoável disposta a abraçar Bolsonaro, pois contra postulantes do campo progressista vale tudo. Algo como uns 40% dos investidores, nas contas de um analista do setor que passa dias e noites a examinar o cenário eleitoral. Um drama para Geraldo Alckmin, o presidenciável do PSDB, partido queridinho do establishment desde o governo FHC.

O ex-governador paulista não avança nas pesquisas, e a principal razão é Bolsonaro rivalizar com ele no eleitorado conservador. Desde abril, o deputado oscila de 15% a 20%, enquanto Alckmin patina por volta dos 5%. O presidenciável reacionário não perde do tucano nem em São Paulo, estado que Alckmin governava até outro dia. No máximo, empata.

Na terça-feira 5, foi divulgado um manifesto em Brasília, por articulação de FHC e do secretário-geral do PSDB, o deputado mineiro Marcus Pestana, a pregar a união eleitoral de partidos governistas. O documento e os discursos achincalham os “radicalismos” do campo progressista e de Bolsonaro, mas o verdadeiro alvo era o extremista do PSL.

Um aceno à união de Henrique Meirelles, do MDB, Rodrigo Maia, do DEM, Álvaro Dias, do Podemos, e por aí vai. A aflição na turma do impeachment é tanta que, para FHC, vale até embarcar em Marina Silva, da Rede, pré-candidata que não orbita no governismo. 

Um dia depois do esvaziado lançamento do manifesto, outra ação destinada a injetar ânimo na pré-campanha de Alckmin. Por iniciativa de Pestana, houve uma sessão de autógrafos do livro O Voto do Brasileiro, de Alberto Carlos Almeida. A obra reúne uma série de dados sobre as últimas três eleições presidenciais no Brasil e de alguns outros países, e conclui que existe um certo padrão eleitoral regional.

No caso do Brasil, esse padrão seria determinado pelo tema econômico e pode ser visto assim: o Nordeste é “cidadela” do PT, e São Paulo, do PSDB. Daí que, para Almeida, a tendência é 2018 repetir a polarização entre petistas e tucanos. O próprio cientista político admite, porém, que há algo “um pouco fora do scritp” em 2018. “Bolsonaro impede” que a cidadela tucana deságue votos até aqui no PSDB. 

A caricatura neoliberal e globalizante do ex-capitão contribui para a hesitação na “cidadela” tucana. São Paulo é reduto do “mercado” no Brasil. Em novembro passado, em entrevista à Band, Bolsonaro saiu-se com essa: “Tem estatal que não tem de ser privatizada, tem de ser extinta. Outras estatais têm de ser privatizadas, sim”. E ressalvou: “As estratégicas, você tem de ver o modelo. Você não pode entregar para o capital que pagar mais”. Nestes casos, como, por exemplo, a Eletrobras, o governo deveria ter poder de veto nas decisões da ex-estatal.

O economista que Bolsonaro aponta como seu “ministro da Fazenda” caso seja eleito é defensor de “privatizar tudo”. Inclusive a joia da coroa, aquela cuja quebra do monopólio e abertura do capital detonaram a fúria bolsonarista contra FHC no passado. “Por que não pode vender os Correios? Por que não pode vender a Petrobras?”, disse o neoliberal Paulo Guedes, em fevereiro, à Folha.

E Bolsonaro? “A Petrobras eu posso considerar a privatização, mas seria uma das últimas empresas, e olhando para qual capital seria transferida”, afirmou em outubro, em Nova York, à agência Bloomberg, uma espécie de circuito interno de notícias da banca global.

Os planos tucano-alckmistas são praticamente iguais. Na quarta-feira 6, o presidenciável do PSDB comentou em Brasília: “Pretendo privatizar o máximo que puder”, exceto Banco do Brasil e prospecção de petróleo. Ou seja, para Alckmin, a Petrobras deve furar poço e só, nada de refinar e distribuir combustíveis. Era a visão do tucano Pedro Parente, o patrono da greve caminhoneira recém-demitido.

O principal assessor econômico da pré-campanha de Alckmin, Persio Arida, colaborador do Plano Real e do governo FHC, discorda de ressalvas, igual Guedes. “Não existe nada que seja estratégico no Brasil.” Deve ser por falta de coisas “estratégicas” no País que o leilão de campos do pré-sal na quinta-feira 7 tenha tido participação recorde de petroleiras estrangeiras.

A declaração de Arida foi dada em uma entrevista do tipo “tiroteiro” contra o bolsonarismo. Em 30 de maio, ele foi em São Paulo à agência de notícias Infomoney, outro porta-voz do “mercado”, para rebater o que tinha sido dito ali uma semana antes por Guedes. Para este, “Alckmin é irrelevante”, “um bom homem num Titanic chamado establishment, que perdeu a decência e está com um problema sério”. Mais: Guedes tascava que o tucano estará fora do segundo turno, daí o PSDB terá o dilema de apoiar Bolsonaro ou alguém da centro-esquerda.

Arida estava particularmente irritado com a colaboração de Guedes na difusão, pelo bolsonarismo, de que o PSDB seria um partido social-democrata igual ao PT. “Você acha que Arminio Fraga (outro colaborador de Alckmin) não é liberal? (...) Que eu não sou liberal? Aliás, eu sou liberal por inteiro, não sou liberal pela metade, porque sou liberal na economia e nos costumes.”

Tachar o PSDB de centro-esquerda na economia é um delírio bolsonarista que parece inspirado na campanha de Donald Trump em 2016. O magnata norte-americano posou de anti-establishment, seus apoiadores pregavam que o establishment era meio esquerdista e que este era o motivo do sofrimento do povo norte-americano.

Uma explicação para a aparente loucura foi proposta pela professora de filosofia e política Nancy Frasier, da universidade nova-iorquina New School for Social Research, logo após a posse de Trump, em janeiro de 2017. O triunfo dele teria sido antes de tudo uma derrota do “neoliberalismo progressista”, definido como o uso político, pela alta finança global, de causas feministas e raciais, por exemplo, para o neoliberalismo econômico ser palatável ao eleitor. Modernidade comportamental a serviço do grande capital.

Para Nancy, o propagador do “neoliberalismo progressista” foi Bill Clinton, presidente por lá entre 1993 e 2000. A esposa dele, Hillary, teria encarnado o establishment neoliberalista progressista na eleição perdida para Trump.

A tentativa bolsonarista de carimbar Alckmin e o PSDB como establishment meio esquerdista teve a contribuição involuntária de uma das maiores consultorias globais de risco político. Em uma análise de agosto de 2017 sobre as perspectivas eleitorais por aqui, a Eurasia classificou o ex-governador paulista como “a Hillary do Brasil”, alguém fadado à derrota.

Em viagem a Washington em fevereiro, o tucano viu-se obrigado a responder a uma pergunta de um jornalista sobre a comparação. “Gostei muito, pois a Hillary foi a mais votada. Se fosse no Brasil, estaria eleita.” Teatro. Alckmin está bravo até hoje. O carimbo ajuda a minar, entre os endinheirados e no mundo político, a ideia de que pode vencer a eleição.

Enquanto isso, Bolsonaro deita e rola na tentativa de emular Trump. No dia da vitória do magnata, ele tuitou: “Parabéns ao povo dos EUA pela eleição d @realDonaldTrump. Vence aquele q lutou contra ‘tudo e todos’. Em 2018 será o Brasil no mesmo caminho”.

Após o norte-americano anunciar, em dezembro de 2017, a polêmica decisão de reconhecer Jerusalém como capital de Israel, Bolsonaro rasgou elogios, disse que faria o mesmo e, em um comício disfarçado em Anápolis, cidade goiana, pediu “uma salva de palmas para Donald Trump”.

Dois meses antes, em outubro, Bolsonaro tinha viajado aos EUA e, em um vídeo de 48 minutos gravado ao chegar a Miami, comentou: “O Trump serve de exemplo para mim (…) Sei da distância minha para o Trump, mas pretendo me aproximar dele para o bem do Brasil e dos Estados Unidos”. A equipe do deputado até tentou marcar uma reunião na Casa Branca, mas não deu certo.

Essa viagem aos EUA, na qual levou seus três filhos políticos a tiracolo, é o símbolo máximo da caricatura que Bolsonaro tenta vender como nova face, a do ex-nacionalista antiliberal convertido em globalista neoliberal. Tour de uma semana com sinais de que o deputado, rude na mente e no trato, tem por perto apoiadores, digamos, letrados. Foi logo após voltar dos EUA, aliás, que Bolsonaro anunciou Paulo Guedes como seu “ministro da Fazenda”.

Ao chegar a Miami, de cara proclamou seus sentimentos pelos EUA. “Aqui, para mim, é um espelho. Nós deveríamos ter uma política muito mais intensa com os Estados Unidos”, disse. “Para mim, o maior parceiro econômico tem que ser os Estados Unidos.” No dia seguinte, fez uma palestra-comício e, quando surgiu a bandeira estadunidense no vídeo ao fundo do palco, virou-se para ela, bateu continência e gritou “USA” em coro com a plateia brasileira em Miami.

Diante de uma cena dessas, dá para entender melhor declarações feitas por Bolsonaro em Manaus, em dezembro. “Hoje em dia, ouso dizer que dificilmente a Amazônia é nossa” e, para “salvar ao menos parte da Amazônia”, é preciso buscar parcerias com países como os EUA para a exploração dos recursos minerais. Ué? Não seria o próprio Tio Sam, pelo poder e pela geografia, a maior ameaça à soberania amazônica? 

Bolsonaro também esteve em Nova York, meca financista global. Tomou café da manhã no Council of the Americas, reduto dos chefões de multinacionais. Um participante conta que o deputado passou vergonha. De cara, deixou claro que não estava preparado para falar sobre política econômica. E olha que o objetivo principal da viagem aos EUA era se apresentar ao mainstream, a turma da especulação financeira.

De qualquer forma, o recado foi dado sobre seus planos. No mesmo dia foi a um canal internacional de tevê israelense, o I24 News e, ao ser perguntado sobre como queria ser visto pelos investidores, respondeu: “Como um parlamentar que está fora do grande furacão que envolve a grande maioria dos políticos, a Lava Jato, uma pessoa diferente, liberal na economia e conservadora nos costumes”, disposta a buscar parcerias econômicas com Israel – para onde viajou em maio de 2016 – e EUA.

Mais: disse que “o Estado brasileiro é muito inchado” e prometeu mexer de novo na lei trabalhista, já estuprada no governo Temer, para que “possamos ganhar a simpatia do mundo dos negócios”. 

Os compromissos bolsonaristas em Nova York foram facilitados por um homem da selva financeira local, Gerald Brant, diretor de um banco de investimentos em Manhattan, o Stonehaven. Brant é filho de pai brasileiro e mãe americana, amigo da família Bolsonaro e nas horas vagas militante de movimentos que veem comunismo por toda parte.

Perfil parecido com o de uma dupla que preparou o terreno para a família Bolsonaro encontrar-se com evangélicos em Boston, cidade que abriga uma das maiores comunidades brasileiras nos EUA, umas 300 mil pessoas. Julio Morais e Dario Galvão são brasileiros que criaram, em 2001, e hoje comandam em Boston uma ONG conservadora, o Instituto de Administração Pública.

Bolsonaro deveria ter ido também a um debate em uma universidade em Washington, a capital do Tio Sam, mas aí o caldo entornou. Sua equipe havia concordado com o modelo do debate, mas fraquejou na última hora. Achou que era arapuca.

Um professor da George Washington University, James Green, que ensina cultura e história do Brasil, organizou uma carta com 400 assinaturas a reclamar do convite a Bolsonaro, “um extremista de direita racista, sexista e homofóbico”, cujo único interesse era “alcançar o reconhecimento internacional e solidificar a viabilidade política de sua candidatura”. 

O debate tinha sido organizado por Mark Langevin, diretor do departamento de pesquisas sobre o Brasil da universidade, um acadêmico de tendências progressistas. Segundo ele, o saldo final da passagem de Bolsonaro pelos EUA em outubro foi pífio. A mídia de lá deu “tratamento superficial” ao pré-candidato. E, apesar de toda bajulação da parte de Bolsonaro, “não existe sinal de que o governo Trump tenha ajudado” a pré-candidatura do deputado durante ou depois da viagem. “O governo Trump não coloca o Brasil na pauta.”

Culpa do PSDB, a sigla que partidariza o Itamaraty desde o início do governo Temer? José Serra, o primeiro chanceler, disse logo após a posse, em 2016, que a vitória de Trump seria um “pesadelo”. Se bem que seu sucessor, o também senador tucano Aloysio Nunes Ferreira, esteve na segunda-feira 4 com seu homólogo norte-americano, Mike Pompeo, e anunciou publicamente o que já era sabido há tempos pelo leitor de CartaCapital: os dois países voltaram a negociar a cessão ao Tio Sam da Base de Alcântara, no Maranhão. 

O bolsonarismo e Alckmin não trocam sopapos apenas para ver quem é mais neoliberal. A coisa descamba também para o lado pessoal. Em um evento em São Paulo em 24 de maio, o tucano disse que o rival “não sabe ouvir, não sabe dialogar, muito menos governar”, “não sabe ouvir crítica, então desrespeita”.

O troco veio um dia depois, da Bahia. “Os diálogos do seu Geraldo Alckmin são com o pessoal da Odebrecht. Ele está preocupadíssimo com o Paulo Preto. Esse perfil de governar, conversar com esse tipo de gente, eu não tenho mesmo.”

Em 15 de maio, durante uma sessão do Congresso, o deputado Major Olímpio, chefe do PSL em São Paulo, tinha usado o microfone para dar uma “boa notícia” ao povo, a abertura de uma investigação contra Alckmin, por ter recebido grana indevida da empreiteira, segundo delações. “Agora o Brasil vai saber quem é o santo da Odebrecht, o santo Geraldo Alckmin, o santo do metrô, da CPTM, do Rodoanel, da merenda, o santo que destruiu SP.” 

Prenúncio de um tiroteio divertido. Bolsonaro é réu no Supremo Tribunal Federal por injúria e apologia do estupro, ações penais nascidas de uma frase de 2014 sobre Maria do Rosário, deputada do PT gaúcho. Não estupraria a petista pois “ela não merece”.

Em abril, foi denunciado por racismo ao Supremo pela PGR Raquel Dodge, por ter feito um ano antes, no Rio, um discurso cheio de ofensas a quilombolas e estrangeiros. No ano passado, foi condenado a pagar multa por insultar gays.

Quer dizer, neoliberal, sim, mas ele e seus apoiadores querem ter o direito de ofender todas as minorias, se insurgem contra o que chamam de “politicamente correta”, um dos motivos para se voltarem contra a “centro-esquerda” e para botar o PSDB dentro do mesmo saco.

É outra semelhança com a campanha de Trump contra Hillary. Em janeiro, o Estadãonoticiou que os bolsonaristas sondaram a Cambridge Analytica, empresa que ajudou Trump na eleição – ajudou de forma escandalosa, ao obter irregularmente no Facebook dados particulares de 50 milhões de pessoas, conforme se soube recentemente.

O deputado do PSL negou ter havido a sondagem, mas é coerente com seus planos. Como terá poucos segundos de tevê na campanha, aposta tudo na web. Até aqui, tem a maior tropa de seguidores nas redes sociais entre os pré-candidatos. Uma turma pronta para dizer que tudo o que a mídia tradicional afirmar contra seu ídolo na campanha é mentira. Outra inspiração em Trump.

Apesar das ofensas contra as minorias, o bolsonarismo sondou a juíza aposentada Eliana Calmon, que é da Bahia, para ser vice do deputado do PSL. Ela recusou, como disse ao Globo do fim de maio, por achá-lo muito radical, e agora o ex-capitão namora o senador-pastor Magno Malta, do PR, para vice.

Bolsonaro negou em nota ter autorizado qualquer sondagem a Eliana em seu nome, mas a história é esquisita. O reacionário presidenciável não tem sofisticação intelectual para pensar sozinho que seria uma boa, para quebrar resistências eleitorais, ter como companheira de chapa uma mulher, do Nordeste e de um partido como é a Rede.

CartaCapital apurou que o telefonema para Eliana que deu origem à sondagem partiu da Polícia Federal. Teria sido obra do deputado Delegado Francischini, do PSL, eleito pelo Paraná, a terra da Operação Lava Jato? Mistério. 

André Barrocal  | Carta Capital

Imagem: Alessandro Layola

Leia em e Carta Capital: 

A crise brasileira à luz da teoria do caos


Inegavelmente vivemos numa situação de completo caos. Ninguém pode dizer para onde vamos. Há várias bifurcações. Caberá aos atores sociais determinar uma bifurcação que não represente a continuidade do passado que criou o caos

Leonardo Boff | Carta Maior

Já há muitos anos, cientistas vindos das ciências da vida e do universo começaram a trabalhar com a categoria do caos. Inicialmente também Einstein participava-se da visão de que o universo era estático e regulado por leis determinísticas. Mas sempre escapavam alguns elementos que não se enquadravam neste esquema. Para harmonizar a teoria, Einstein criou o “princípio cosmológico” do qual mais tarde se arrependeria muito porque não explicava nada mas mantinha a teoria standard do universo linear inalterada. Com o advento da nova cosmologia mudou completamente de ideia e começou a entender o mundo em processo ininterrupto de mutação e autocriação.

Tudo começou com a observação de fenômenos aleatórios como a formação das nuvens e particularmente o que se veio chamar de efeito borboleta (pequenas modificações iniciais, como farfalhar das asas de uma borboleta no Brasil, podem provocar uma tempestade em Nova York) e a constatação da crescente complexidade que está na raiz da emergência de formas de vida cada vez mais altas(cf.J.Gleick Caos: criação de uma nova ciência,1989).

O sentido é este: por detrás do caos presente se escondem dimensões de ordem. E vice-versa, por detrás da ordem se escondem dimensões de caos. Ilya Progrine (1917-2003), prêmio Nobel de Química em 1977, estudou particularmente as condições que permitem a emergência da vida. Segundo este grande cientista, sempre que exisitir um sistema aberto, sempre que houver uma situação de caos, (longe do equilíbrio) e vigorar uma não-lineariedade é a conectividade entre as partes que gera uma nova ordem vital (cf. Order out of Chaos,1984).

Esse processe conhece bifurcações e flutuações. Por isso a ordem nunca é dada a priori. Ela depende de vários fatores que a levam a uma direção ou à outra.

Fizemos toda esta reflexão sumaríssima (exigiria muitas páginas) para nos ajudar a entender melhor a crise brasileira. Inegavelmente vivemos numa situação de completo caos. Ninguém pode dizer para onde vamos. Há várias bifurcações. Caberá aos atores sociais determinar uma bifurcação que não represente a continuidade do passado que criou o caos. Sabemos que há oculto dentro dele uma ordem mais alta e melhor. Quem vai desentranhá-la e fazer superar o caos?

Aqui se trata, no meu modo de ler a crise, de liquidar o perverso legado da Casa Grande traduzida pelo rentismo e pelos poucos miliardários que controlam grande parte de nossas finanças. Esses são o maior obstáculo para superação da crise. Antes, eles ganham com ela. Não oferecem nenhum subsídio para superá-la. E possuem aliados fortes a começar pelo atual ocupante da Presidência e parte do Judiciário, pouco sensível à cruel injustiça social e à superação histórica dela.

Precisamos constituir uma frente ampla de forças progressistas e inimigas da neocolonização do país para desentranhar a nova ordem, abscôndita no caos atual mas que quer nascer. Temos que fazer esse parto mesmo que doloroso. Caso contrario, continuaremos reféns e vítimas daqueles que sempre pensaram corporativamente só em si, de costas e, como agora, contra o povo.

O caos nunca é só caótico. É gerador de nova ordem. O universo se originou de um tremendo caos inicial (big bang). A evolução se fez e se faz para colocar ordem neste caos. Devemos imitar o universo e construir uma nova ordem que seja includente de todos, a partir dos últimos.

*Leonardo Boff escreveu Brasil: concluir a refundação ou prolongar a dependência, Vozes 2018.

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Pentágono impõe sua agenda à América Latina, opina analista


Até hoje a luta contra as drogas e terrorismo eram as razões pelas quais o Comando Sul do Pentágono diz manter sua presença na América Latina. Contudo, nos últimos documentos já se fala da corrupção.

A especialista militar Silvina Romano notou na entrevista à Sputnik Mundo que esse problema tem um caráter civil e não tem nada a ver com governança militar na América Latina.

"A instalação da base militar em Neuquén, Argentina, é uma evidência da aproximação do presidente Mauricio Macri com o governo e setor privado dos Estados Unidos. Agora dizem que o problema principal na Argentina é o terrorismo. Eu me pergunto se este é realmente o principal problema para os argentinos", ressaltou Romano.

Além do mais, ela chamou atenção para os planos do Pentágono na América Latina.

"Dizem que a base em Neuquén vai ser aberta para ajuda humanitária, mas por trás disso está a presença territorial das forças militares dos EUA. A Patagônia é a entrada à Antártida, tudo isso se faz nos interesses da indústria militar dos EUA. Qualquer projeto do Comando Sul vai contribuir para a indústria das armas norte-americana", explicou a analista.

O terrorismo, a ajuda humanitária, a guerra contra drogas — "tudo isso são doutrinas impostas pelos EUA, é Washington que impõe a agenda e dita quais são os problemas que devem preocupar a nossa região", frisou a analista e pesquisadora.

Além disso, o Comando Sul, a missão permanente militar dos EUA na América Latina e no Caribe, busca intervir nas questões não ligadas à defesa ou segurança.

"De repente começaram a se preocupar com a corrupção, que sempre tem sido um assunto civil", diz Romano.

Conforme ela, há um documento de 2018 do Comando Sul em que a corrupção é classificada como "câncer que devora a democracia" na América Latina.

"A questão é como os EUA pretendem lutar contra ela. Quando falamos da guerra jurídica contra a corrupção, da liquidação de oponentes políticos, falamos sobre a guerra híbrida que é travada sempre e em várias frentes ao mesmo tempo: na mídia, psicologia, economia, etc.", concluiu Romano, investigadora do Centro Estratégico Latino-americano de Geopolítica (CELAG).

Sputnik | Imagem: AP Photo/ Victor R. Caivano

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