Vítor Santos | Jornal de Notícias
| opinião
Passámos a viver lá na vertigem
do trapézio, no arame estreito e inseguro, aspirados por uma pandemia que nada
tem de bom ou bonito. Não encontro fatores positivos neste momento crítico.
Cruzo-me, cruzamo-nos todos, com
heróis acidentais, por devoção ou obrigação, pessoas que se destacam com ações
que nos comovem. Mas não, não é preciso vermos os nossos queridos em risco, não
é preciso faltarem meios em lares e hospitais, não é preciso estarmos
confinados em casa para nos tornarmos mais preocupados com o próximo, mais
solidários, mais criativos. Sabíamos todos disto, não? Sabíamos, claro.
Quando o vírus der tréguas,
quando chegar a vez de ficar ele confinado por uma vacina, voltaremos ao mesmo,
ao isolamento social onde antes uma boa parte de nós se encontrava. Pode
parecer uma visão pessimista. Mas o tempo, acredito, vai encarregar-se de nos
mostrar que assim será, tirando uma quantidade razoável de hábitos que, por
receio, haveremos de mudar.
Importa, por isso, nesta fase,
manter o futuro respirável, sem colocarmos em causa a segurança comum. Fazê-lo
será encontrar um quotidiano normal dentro da anormalidade que serão os
próximos tempos. E isso não depende exclusivamente dos vários poderes e dos
reguladores da saúde. Está nas mãos de todos, individualmente e dentro das
pequenas comunidades. Em ambiente familiar e de trabalho, sobretudo. É
imperioso potenciarmos a solidariedade e a criatividade no sentido de encontrar
formas de conviver e trabalhar com o conforto possível. Sem nos desviarmos um
milímetro do centro do arame ténue em que nos movimentamos. Mas avançando. Sem
lamúrias - chegam, justificam-se, as daqueles cujos familiares e amigos
perderam a vida, as dos que estão doentes, as dos que não receberam o salário
de março, as dos que já perderam o emprego. São tempos estupidamente difíceis.
Compete-nos ultrapassá-los sem adormecer à sombra de vírus, sob pena de, quando
acordarmos, nos custar ainda mais sair da escuridão em que este nos mergulhou.
*Editor-executivo
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