Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*
A propósito da venda ao desbarato da RTP, o ministro português da Defesa, José Pedro Aguiar Branco, diz que o Governo, o seu Governo, “cumpre as promessas que faz”.
Pelos vistos terá também prometido, seja no caso da RTP, do BPN ou de outros, pagar para que alguém compre com esse dinheiro o que o Governo quer vender.
Mas, por agora, importa mesmo perguntar se Aguiar Branco quando diz que o Governo “cumpre as promessas que faz” está, por acaso, a incluir o primeiro-ministro.
Isto porque Passos Coelho desde há muito que adoptou a técnica de José Sócrates, que tanto criticou, de dizer às segundas, quartas e sextas e uma coisa, e às terças, quintas e sábados outra. Sendo que ao domingo, como convém, vai à missa tomar a hóstia que tira todos os pecados do mundo.
“Aqueles que são responsáveis pelo resvalar da despesa têm de ser civil e criminalmente responsáveis pelos seus actos”, prometeu em tempos, num pontal qualquer do pântano português, Passos Coelho. Quando será que “cumpre as promessas que faz”?
Ao que parece, apesar de todos os antecedentes, ainda há quem dê o benefício da dúvida ao primeiro-ministro. A ingenuidade e a falta de memória têm altos custos. É caso para perguntar a Passos Coelho o que ele perguntou aos portugueses sobre José Sócrates: “Como é possível manter um governo em que um primeiro-ministro mente?”
Mentir é, aliás, uma forma de vida de Passos Coelho. Em tempos ele afirmou: “Estas medidas põem o país a pão e água. Não se põe um país a pão e água por precaução”. Resultado? Pôs os portugueses a água mas cada vez mais sem pão.
Foi ele quem disse: “Estamos disponíveis para soluções positivas, não para penhorar futuro tapando com impostos o que não se corta na despesa”. Resultado? Pôs os portugueses a pagar mais impostos, penhorando até o futuro dos filhos e netos.
Foi Passos Coelho quem disse: “Aceitarei reduções nas deduções no dia em que o Governo anunciar que vai reduzir a carga fiscal às famílias”. Resultado? Acabou com as deduções e aumentou a carga fiscal das famílias.
Foi ele quem disse: “Aqueles que são responsáveis pelo resvalar da despesa têm de ser civil e criminalmente responsáveis pelos seus actos”. Resultado? As despesas resvalaram e de que maneira mas, como dono do país, mandou às malvas essa ideia de os autores serem civil e criminalmente responsabilizados.
Foi Passos Coelho quem disse: “Ninguém nos verá impor sacrifícios aos que mais precisam. Os que têm mais terão que ajudar os que têm menos”. Resultado? Continua a trabalhar em prol dos poucos que têm milhões, esquecendo totalmente os milhões que, por sua culpa, têm pouco ou nada.
Quando será que “cumpre as promessas que fez”?
Também foi ele quem disse: “Queremos transferir parte dos sacrifícios que se exigem às famílias e às empresas para o Estado. Já estamos fartos de um Governo que nunca sabe o que diz e nunca sabe o que assina em nome de Portugal”. Resultado? O Estado transferiu os sacrifícios que lhe deviam caber para as famílias e para as empresas.
Foi Passos Coelho quem disse: “Para salvaguardar a coesão social prefiro onerar escalões mais elevados de IRS de modo a desonerar a classe média e baixa”. Resultado? Pura e simplesmente acabou com a classe média, atirando-a para o nível do lixo.
Foi igualmente o actual primeiro-ministro quem disse: “Se formos Governo, posso garantir que não será necessário despedir pessoas nem cortar mais salários para sanear o sistema português”. Resultado? Despedimentos nunca vistos, desemprego em níveis históricos, cortes nos salários e nos subsídios.
Foi a mesma criatura quem disse: “A ideia que se foi gerando de que o PSD vai aumentar o IVA não tem fundamento. A pior coisa é ter um Governo fraco. Um Governo mais forte imporá menos sacrifícios aos contribuintes e aos cidadãos”. Resultado? Aumentos brutais do IVA, imposição de terríveis sacrifícios aos cidadãos.
O mesmo Passos Coelho também disse: “Não aceitaremos chantagens de estabilidade, não aceitamos o clima emocional de que quem não está caladinho não é patriota”. Resultado? Chantagens e mais chantagens. Pressões e mais pressões. Institucionalização do princípio de que até prova em contrário todos são culpados.
Passos Coelho foi ainda quem afirmou: “Já ouvi o primeiro-ministro dizer que o PSD quer acabar com o 13º mês, mas nós nunca falámos disso e é um disparate”. Resultado? Que cada um olhe para o que se passa consigo. Basta isso.
Então como é? Quando será que o Governo “cumpre as promessas que faz”? Aguiar Branco não responderá seguramente a estas questões. E como amanhã é domingo, vai com certeza acompanhar Passos Coelho à missa e tomar a hóstia que tira todos os pecados do mundo.
Tira os pecados do mundo e faz dos portugueses umas bestas.
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
Título anterior do autor, compilado em Página Global: Isaías Samakuva e a UNITA acreditam que Angola é o que não é: um Estado de Direito
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