Baptista-Bastos –
Diário de Notícias, opinião
A desorientação do
Governo é tal que o FMI está em "conversas técnicas", pelo menos há
três semanas, a fim de "ajudar a repor as coisas." Não se sabe o que
a expressão quer dizer; mas o facto em si levantou uma onda de "dignidade
nacional." Uma espécie de emoção patriótica, embora mais desvanecida e
lisa daquela que animou as hostes republicanas, quando do Ultimato, assomou à
flor da mágoa. Faltou, claro!, a fibra colectiva dessa emoção e as crepes que
envolveram a estátua de Camões. Apenas Bagão Félix, que me lembre, testemunhou
a sua dor, dizendo sentir-se envergonhado. O resto dos nossos
"senadores" dedicou-se a outras charadas. Alguns até demonstraram uma
ofegante felicidade. Mas a verdade é que a presença dos burocratas do FMI é um
vexame inominável, além de ser a patética explicação de que Passos e os seus
não sabem o que fazer da barafunda que cozinharam.
Enquanto os do FMI
procuram, na sombra e no conforto dos gabinetes, ajudar à nossa modernidade
económica, o dr. Passos, cada vez mais confuso e assombrado, escreveu uma carta
de socorro ao dr. Seguro. Estranho documento, cujo resultado era esperado. O
chefe socialista proclamou que cumplicidades nocivas ao bem-estar dos
portugueses, nem pensar! Que Passos não sonhasse, sequer, em beliscar a
Constituição, documento nobre, garante indefectível da nossa democracia.
Comentadores
impolutos logo viram, na iniciativa de Passos Coelho, uma armadilha sinistra.
Ele desejava, no mais secreto do seu espírito, implicar o dr. Seguro na
aventura desprezível de anular o Estado Social, e de pôr definitivamente os
portugueses a pão e laranjas, salvo seja! Porém, o dr. Seguro, com a firmeza
moral e a espessura ideológica que se lhe reconhecem, bradou: comigo, não!
Destacados
socialistas haviam advertido, apoplécticos e assustados, das intenções do
primeiro-ministro, já reveladas, sombriamente, em vocábulos inquietantes como
"refundação" e "modelações." Marques Mendes, em más
imitações gestuais do professor Marcelo, não vê mal nenhum nos conselhos do FMI
e muito menos nas aproximações "ao maior partido da oposição." Há que
salvar a pátria! Há que preservar o que nos resta de nacional! O receio do caos
toca as almas piedosas. E até D. José Policarpo, não esqueçamos o santo homem!,
vituperou os que preferem a algazarra dos esfomeados à resignada obediência a
quem manda e faz.
Apenas Mário Soares
grita, a toda a hora e a todo o instante: "Rua com estes gajos!" O
dr. Cavaco não quer meter-se nesse embrulho; entretém-se com o Facebook e
redigir as banalidades do costume. Por seu turno, o dr. Seguro, putativo
candidato ao governo de Portugal, assevera que só irá para o poder com o voto
amoroso dos portugueses. Que fazer nesta balbúrdia? Esperar que a indignação se
liquefaça numa escorrência repugnante e fétida.
(Por decisão
pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico)
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