<> Artur Queiroz*, Luanda
As voltas que o mundo dá. Ainda
há uns dias os EUA eram uma democracia, os chefes d a banda estremecidos
democratas e já manda na Casa dos Brancos um criminoso, condenado pelo juiz
Juan Merchan
Pedro Tanda é deputado da UNITA. Portou-se na Assembleia Nacional como o chefe de um gangue de bairro. Um marginal irresponsável. Mas dadas as suas funções, tem imunidades que impedem a sua prisão na hora. Um parlamentar que não tem orgulho nos 50 anos de Angola Independente ainda está de joelhos ante os colonialistas de Lisboa e os racistas de Pretória. Um legislador que acusa o Executivo de estar a matar o povo não tem a mínima noção do seu papel na Casa da Democracia. Vou fazer um favor ao energúmeno. O Povo Angolano está a passar mal porque no meio século de independência Nacional, mais de metade do tempo foi guerra.
Guerra contra invasores estrangeiros que nos atacaram com matilhas de mercenários mais tropas regulares do Zaire (RDC) e do regime racista da África do Sul. Guerra assegurada pela UNITA que num gesto de traição suprema serviu de biombo aos racistas sul-africanos. Rebelião armada da UNITA contra a democracia, entre 1993 e 2002 (nove anos), quando perdeu as primeiras eleições multipartidárias. Ainda hoje há acções de desminagem! Ainda hoje há comunidades que não podem trabalhar a terra porque falta remover as minas terrestres semeadas pelos bandidos armados. As voltas e revoltas que o mundo dá. Pedro Tanda fala contra ele e a sua quadrilha! A sua intervenção é a confissão do criminoso.
O que Pedro Tanda disse e fez é bem pior do que alugar os carros de função e de apoio a casa, como fez um dos seus colegas e, por isso, foi expulso da Assembleia Nacional. O mundo dá muitas voltas e revoltas mas Pedro Tanda deu a volta completa ao círculo da infâmia. Portou-se no Parlamento como um bandido vulgar quando devia comportar-se como um representante do Povo. A UNITA não tem deputados, tem incendiários da Jamba. A UNITA não tem dirigentes. Tem savimbistas fanáticos prontos a matar a democracia na primeira oportunidade.
Os deputados eleitos nas
primeiras eleições multipartidárias ficaram à espera que acabasse a rebelião
armada, para fazerem o seu trabalhado de legisladores e fiscalizadores do
Governo.
De Cabinda chega um grito de alerta. Um grito de socorro! Os pescadores não trabalham. As praias estão cheias de “crude”. Um desastre ambiental. Calma. Muita calma. Já foi criada uma comissão multissectorial para descobrir o que é aquela “substância oleosa na bacia de Malembo.” As voltas e revoltas que o mundo dá. Vou ter de ir a Cabinda explicar aos comissionistas que aquela merda é petróleo. É um crime ambiental As petrolíferas cometeram o crime. É facílimo saber quais. Já não há jornalistas em Cabinda? Onde anda o repórter Kapita? E o grande Coelho?
As voltas e revoltas que o mundo dá. O ministro Viegas de Abreu foi ao Lobito e já está. O velho Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB) tem uma Agência de Facilitação de Trânsito e Transporte. Ai se Exalgina Gamboa ainda fosse presidente do Tribunal de Contas! O artista tinha que explicar, kwanza a kwanza, como se faz esse truque para comer dinheiro. Mas tem um nome bonito: Agência de Facilitação de Trânsito e Transporte. Grande ilusionista! Está de parabéns o Corredor do Lobito. Ele vai a todas, saca em todas, acumula mundos e fundos até a catar piolhos na cabeça de um ministro.
Vamos regressar às eleições de 2008 e ao ambiente efervescente que se vivia. O MPLA perguntou aos seus deputados eleitos em 1992 se queriam constar das listas em 2008, 16 anos depois de presença no parlamento. Muitos declinaram continuar. Alguns pediram encarecidamente para ficar. Um deles foi João Melo. Ao mesmo tempo, em alguns sectores da imprensa privada surgiam pressões dos que queriam continuar mas estavam “tremidos”. Um deles era João Melo.
Nessa altura este vosso criado trabalhava no Jornal de Angola. Fazia o meu trabalho conforme estava definido no contrato de trabalho. Por isso tinha que cumprir dois horários por dia. Isso desagradava a muita gente! Sofri ataques terríveis, sobretudo racistas. Um dia o ataque veio do próprio João Melo e na página de opinião do Jornal de Angola, onde me desunhava para cumprir as responsabilidades que assumi. Não gostei e mandei-lhe uma mukanda. Dei-lhe um prazo para pedir desculpas públicas Caso não o fizesse, usava o jornal para responder. Não se desculpou. Respondi.
O director José Ribeiro opôs-se à publicação. Defendeu o infractor. Não quis que eu entrasse em polémica com um deputado do MPLA ainda que ele estivesse a execrar o MPLA. Aceitei mas dado o meu feitio religioso, fiquei lixado. Um dia destes, João Melo deu uma entrevista onde anunciou: “Decidi dedicar-me em exclusivo à escrita e à internacionalização do meu trabalho”. Ao ler esta declaração, José Ribeiro comentou: “Que figurão! O ministro que destruiu a Comunicação Social angolana em 2017, saneando jornalistas e fechando projectos inovadores, que apoiou perseguições a empresários e a destruição da economia de Angola agora diz que se vai internacionalizar. Que figurão!”
José Ribeiro não percebeu que João Melo se vai internacionalizar no Leste da República Democrática do Congo e no Sudão Faz lá muita falta. As voltas e revoltas que o mundo dá. Hoje, tantos anos depois, vou publicar o texto de resposta aos insultos de João Melo. Internacional, mas com tudo à mostra. Leiam:
“Os jornalistas escrevem de memória e a memória é o seu principal instrumento de trabalho, mais que a Língua. De ti, João Melo, tenho uma memória agradável. Recordo a manhã em que entraste na Redacção da Emissora Oficial de Angola, tímido, e me entregaste uma mukanda do Hélder Neto onde ele dizia que eras filho do meu querido e saudoso camarada Kamaxilu, o jornalista Aníbal de Melo. Solicitava que te desse trabalho. Acabei de ler o recado do Hélder e disse-te que estavas admitido. Perguntaste-me quando começavas e eu disse-te: - Começas já, senta-te ali naquela secretária! Ficaste um pouco abananado, como quem não acredita no que lhe está a acontecer. Foi assim que começou a tua carreira.
Li a tua crónica de hoje e verifico que adoptaste o ataque que me foi feito por alguns canalhas e segundo o qual uso uma “linguagem de carroceiro”. Meu caro João, não entres por aí, porque estás a dar o flanco. Como fui eu que te atrelei à carroça desconjuntada do jornalismo angolano, posso sempre dizer que se eu sou o carroceiro, tu és a besta insanável que puxa a carroça. Como vês é fácil devolver as faltas de respeito e os insultos pessoais.
Meu caro João, quando entraste na Redacção da Emissora Oficial eu andava há muitos anos no jornalismo e já tinha ensinado a profissão a alguns jovens tão talentosos como tu. Quando eu e o Horácio da Fonseca fomos trabalhar na Voz de Luanda com o Pedro Moutinho e o fabuloso Paulo Cardoso, conseguimos levar para a emissora o David Mestre, ele que tinha gravíssimos defeitos de dicção e comia os “erres”. Felizmente, percebeu que a voz é o grande espectáculo da Rádio, reconheceu que sem dicção não ia a lado nenhum e saiu pelo seu pé. Algum tempo depois virou poeta e publicou, por subscrição dos boémios desse tempo, o livro Kir-Nan, que mais tarde ele queimou num auto de fé, na ilha da Chicala. Até tu seres admitido na Emissora Oficial de Angola, ter levado o David Mestre para os estúdios onde reinavam o Pedro Moutinho e o Paulo Cardoso foi a minha coroa de glória. A partir daquela bela e longínqua manhã, passaste a ser tu.
O teu texto de hoje vem no caminho de outros que tens escrito ultimamente. Tu dás-te ares de professor do MPLA, professor do Governo e hoje, professor dos órgãos do sector público de comunicação social. João Melo, tu és deputado há 16 anos e pediste à direcção do MPLA mais quatro. Isso só pode querer dizer que tens ambições políticas e sonhas (legitimamente) um dia seres mais que deputado. Como amigo, deixo-te um conselho: Não sejas ridículo porque o ridículo em política mata. E sobretudo não te exponhas publicamente à chacota dos que sabem que tu sabes muito pouco, para tanta prosápia doutoral. Se te limitares a emitir as tuas opiniões e te abstiveres de dar lições aos outros, ainda chegas a ministro.
Na tua crónica de hoje cometeste dois pecados mortais. Primeiro, imitaste o Agualusa. Ao falares em “linguagem de carroceiro” no Jornal de Angola, sem dizeres quem usa essa linguagem, estás a dar uma bofetada ao Zé Ribeiro, ao Filipe Zau, ao Costa Andrade ou ao Arnaldo Santos, o único cronista angolano que temos no activo e que devia ser tratado nas palminhas. Isto sem contar comigo, a quem tu deves respeito e consideração, ainda que estejas convencido de que sou carroceiro e tu és professor.
Nada justifica que me andes a morder os calcanhares à socapa. Porque quem quer ser mais quatro anos deputado, não pode andar com a boca tão rés ao chão. Não imites o Agualusa, meu caro João. Ele é que bate e esconde a mão. Ele é que se porta como um leproso moral, um vira lata que não conhece o dono. Como um canalha que não respeita aqueles que sacrificaram a vida e a liberdade para ele se pavonear por aí com um passaporte angolano enquanto destila ódio e peçonha raivosa contra Angola e o nosso povo. Não imites um presumível escritor de plástico que, no meu tempo, reprovava na quarta classe, por não ser capaz de fazer uma redacção em termos.
O teu segundo pecado mortal foi juntares a tua voz ao Vítor Silva quando ele me ofendeu profundamente e denunciou à Presidência da República um repórter do Jornal de Angola que usou uma expressão – “à socapa” – desadequada ao contexto da sua reportagem. O dever de solidariedade entre oficiais do mesmo ofício foi gravemente espezinhado pelo Vítor Silva. E ainda por cima, numa “nota da direcção” dirigida à minha pessoa.
Sempre escondendo a mão, resolveste bandear-te com o ofensor e o bufo. Não é que eu espere grande coisa de ti. Muito menos que tenhas cuidado em não pisar ninguém, no afã de chegares a ministro. Nada disso. Não espero nada dos serventuários do poder. E jamais esperarei, para não me desiludir. É por isso que nunca fui servidor do Estado e sempre ganhei a vida com o suor do meu rosto.
Tudo o que eu fui no jornalismo, deveu-se exclusivamente ao meu mérito e nunca por ser militante do MPLA. Pelo contrário, o MPLA é que beneficiou da minha posição na Emissora Oficial e depois no Diário de Luanda para levar a bom porto a sua mensagem. E muito mais tarde, em 1992, ajudei a que fosses eleito, quando na imprensa portuguesa fiz passar a mensagem do nosso partido. É claro que o mensageiro sempre acreditou – e continua a acreditar – na mensagem e no projecto do MPLA. Tomara eu que tu pudesses dizer a mesma coisa, caro João Melo.
Pelo tom desta minha prosa, já deves ter percebido que estou indignado com o teu texto publicado no Jornal de Angola de hoje. E que me sinto ofendido. Como nunca te ofendi e sempre te considerei, o teu comportamento é ainda mais reprovável. Por isso, fico à espera que tu, na próxima semana, desembuches e digas abertamente quem é que usa no Jornal de Angola uma linguagem de carroceiro. No caso de dizeres que sou eu, então fico com o direito de te responder publicamente e à letra. Em alternativa, exijo-te um pedido público de desculpas. Tens de dizer aos leitores que não me estavas a atacar nem tomaste partido por quem me insultou e desconsiderou.
Embora tenhas demonstrado falta de respeito por mim, dou-te o benefício da dúvida e fico à espera de explicações. Se na próxima semana não te retratares, então lamento mas vou ter de te incluir na lista dos meus inimigos. E desde já te digo que me tenho suportado estes anos todos, porque jamais gostaria de ter como inimigo o Artur Queiroz. Acredita!
Ainda com consideração e a velha amizade, Artur Queiroz.
PS Também te fica mal fazeres o papel do bonzinho do MPLA, em oposição aos mauzões que não conhecem as regras da democracia. Tu sabes que eu sou um anarquista libertário, sempre detestei o regime democrático e as suas aldrabices. Tu já foste pelo partido único, comeste nesse prato, chegaste onde chegaste à custa do MPLA. Não te faças passar pelo supra sumo da democracia nem faças o papel da baronesa que bateu com as mamas na mesa e, atendendo à boa educação que aprendeu na Suíça, em vez de dizer porra disse chiça! Fica-te mal fazeres-te passar pelo aristocrata que fica muito chocado com a linguagem dos carroceiros. Eu sou neto de conde e filho de barão. Meu avô e meu pai desprezaram a aristocracia e lutaram pela República. E eu ainda estou na luta pela liberdade e pela dignidade, quando já devia estar no repouso do guerreiro. Se calhar, um dia destes é o que faço. Quando no dia 6 de Setembro beber uma taça de champanhe pela vitória estrondosa do MPLA, vai ficar-me na boca um sabor amargo, porque estou a ajudar a eleger pessoas sem carácter nem dignidade. Se estás a pensar que me estou a referir a ti, devo dizer-te que acertaste. Mas é claro, ainda tens tempo de me provares que estou enganado”.
Feiticeiro! Não é que a vitória do MPLA foi mesmo estrondosa como eu tinha previsto dois meses antes das eleições? Não é que João Melo chegou mesmo a ministro do Corredor do Lobito? As voltas e revoltas que o mundo dá.
* Jornalista
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