Os autores do Barómetro da Imigração, um inquérito da Fundação Francisco Manuel dos Santos, reconhecem que os resultados foram influenciados pelos estereótipos difundidos pelos media.
Em entrevista à Lusa, dois dos autores do Barómetro da Imigração criticam a forma como os meios de comunicação social estão a acentuar a má imagem dos imigrantes, repetindo estereótipos para criar a ideia de uma invasão. Este inquérito divulgado em dezembro pela Fundação Francisco Manuel dos Santos mostrou como uma grande parte dos portugueses sobrestimam em muito o número de imigrantes a viver no país e percecionam a imigração como uma ameaça, em particular a oriunda do subcontinente africano.
A propósito de uma rixa ocorrida no domingo no Largo do Intendente - que quase toda a comunicação social noticiou como tendo ocorrido na rua do Benformoso ou no Martim Moniz - Rui Costa Lopes, investigador do Instituto de Ciências Sociais, diz ter a certeza de que esse acontecimento “não abriria os três telejornais se tivesse sido noutro local ou se tivesse envolvido outras populações, como em Portalegre”, o que no seu entender deve fazer refletir sobre “os critérios jornalísticos nas tomadas de decisão sobre o que é que faz notícias de capa”.
Outro exemplo dado na abordagem mediática ao fenómeno migratório é o das filas à porta da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) para obter documentação, dando a ideia de uma “invasão”, em vez de se abordar a “ineficiência dos recursos”, acrescentou o investigador.
Outro dos autores do inquérito é Pedro Góis, da Universidade de Coimbra, que alerta para a fragilização destas comunidades através da “repetição das mesmas imagens, dos mesmos locais e das mesmas pessoas que têm uma cor diferente”.
“Se eu procurar sempre os mesmos locais para ilustrar os imigrantes, e são locais muito pouco óbvios para os cidadãos, essa imagem vai funcionar como ‘looping’ na memória e vamos associar os migrantes a esses locais, pode ser à porta da AIMA, da Loja do Cidadão, do Centro de Saúde ou da rua do Benformoso”, acrescentou, concluindo que “a rua do Benformoso não é representativa da imigração no país”, porque “a maioria dos migrantes estão dispersos pelo território nacional e são invisíveis, pelo que não dão boas imagens”.
Media promovem “imagem de multiculturalidade negativa” em Portugal e positiva quando tratam de outros países
E o mesmo vale para a forma como outras comunidades são retratadas nas televisões: “O que é a Cova da Moura se não essa representação estereotipada da comunidade cabo-verdiana em Portugal?”, prossegue o investigador, acusando os media portugueses de contribuírem para uma “imagem de multiculturalidade negativa” em Portugal, enquanto promovem a imagem contrária quando dão noticias sobre outros países.
Pedro Góis, que também dirige o Observatório das Migrações, reconhece que foi com base na “extrapolação deste estereótipo” difundido na cobertura mediática sobre os imigrantes que “muitos portugueses responderam ao nosso barómetro”, mesmo que “vivam em Portalegre e não tenham visto, nos últimos meses, imigrantes”.
A visibilidade mediática deve ser um dos temas a abordar em futuros inquéritos, com o próximo a centrar-se na imagem que os imigrantes têm do resto da população.
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