Cecilia
Lin - Andreia Sofia Silva – Hoje Macau
A aprendizagem do
mandarim está hoje no topo dos objectivos de muitos portugueses, que anseiam
por melhores oportunidades de trabalho na Ásia. Mas o que começa por ser quase
uma necessidade transforma-se numa paixão. O Hoje Macau foi descobrir como é
que jovens portugueses encaram a língua e a religião de uma cultura diferente
daquela em que nasceram
Desafio e paixão.
Poderiam ser estes os adjectivos para qualificar a ligação que cada vez mais
jovens universitários têm com a cultural oriental, a partir do momento em que
começam a aprender mandarim. O mistério inicial ligado aos inúmeros caracteres
desconhecidos rapidamente se transforma na vontade de aprender mais e mais.
Em Portugal há duas
instituições universitárias que possuem o Instituto Confúcio e onde o ensino de
línguas orientais já deixou de ser encarado com olhos estranhos: a Universidade
de Lisboa (UL) e a Universidade do Minho (UM). A universidade localizada em
Braga foi mesmo pioneira neste tipo de cursos.
Sérgio Santos tem
25 anos e está no segundo ano da licenciatura em Línguas e Culturas Orientais
(LCO) da UM. Para ele, a disciplina preferida é o mandarim. “As aulas orais são
as mais interessantes”, diz o estudante que confessa que o chinês é dos idiomas
mais desafiantes para um ocidental. “Há diversos sons que não temos na nossa
língua materna e que são complicados de dominar, o que torna a comunicação
bastante difícil muitas vezes.”
Quanto à gramática,
Sérgio assume que “o nível é acessível. A maneira como os chineses formam as
palavras é deveras interessante, como por exemplo 收音機, que é a
máquina que recebe som, ou seja o rádio. São este tipo de pormenores que me
estimulam a continuar a estudar mandarim”.
No caso de Andreia
Carvalho, de 22 anos, o estudo do mandarim preenche a sua vida há três anos.
Como a própria refere, “tem sido uma aventura muito grande. É mesmo um desafio.
Apesar da dificuldade, acho que é uma coisa óptima. Exercita a mente, ajuda a
relaxar e obriga-nos a usar a memória. Cada vez gosto mais de aprender esta
língua. O que me levou a estudar chinês foi o interesse cultural, porque a meu
ver a cultura chinesa é extremamente rica. Os festivais, as cores, a música, as
paisagens, tudo isso me fascina”.
Quando a
licenciatura terminar, talvez Andreia venha conhecer as terras orientais que
agora só conhece através dos livros na sala de aula. “A possibilidade de ir à
China é algo que me ocupa o pensamento desde que comecei a estudar. Estou
realmente ansiosa por ver de perto todas as maravilhas que vejo nas
fotografias, e comer aquelas comidas deliciosas. Além disso, fico mais ansiosa
por fazer novos amigos na China, e para além de poder aprender sobre a cultura
chinesa, posso também ensinar-lhes um pouco da nossa cultura”.
“O chinês faz-nos
fortes”
Na capital lisboeta Ana Magalhães, da UL, resolveu começar a aprender mandarim há dois anos. Desde então que mostra muito respeito pela professora Wang Jian Mei, dona de uma “voz doce e serena, além de ser sorridente”. “Para nos pôr dentro do espírito da cultura, deu-nos a todos nomes chineses, e o meu é Ma Su Na. Ela procurava sempre tranquilizar-nos, e contava as suas experiências enquanto estudante, e dizia que quando era criança também lhe custou aprender os caracteres.”
Depois das
dificuldades iniciais, em que
Ana assume que ficou muitas vezes “angustiada”, tudo mudou.
“Para mim estudar chinês é uma experiência que estimula a paciência e
ponderação, e que nos fortalece. O chinês faz-nos fortes.
Ana fala mesmo em
“jornada” para descrever todo o percurso de um aluno desta língua oriental. “O
mandarim não é só uma língua em que se aprendem palavras, frases ou tons, mas é
toda uma filosofia. E cada caracter representa uma história concreta,
codificada numa imagem que evoca um conceito abstracto, uma noção, uma ideia,
uma visão do mundo. Estudar os caracteres implica não só um grande esforço de
memória visual mas também, e acima de tudo, um crescimento pessoal e interior”.
A compreensão do
confucionismo
Quando entrou no curso de LCO, Sérgio Santos achava que o Confucionismo não passava de uma religião como outra qualquer. Mas depressa percebeu que não era bem assim. “Agora sei que é uma filosofia muito importante na China, que data desde a Dinastia Zhou (周). Actualmente, também tem um peso muito importante na vida quotidiana dos chineses. Algumas das suas ideias são muito interessantes, como o facto de a vida depois da morte ou a espiritualidade não lhes interessar. Conheço alguns filósofos confucionistas como o Meng Zi (孟子) e o Xun Zi (荀子).”
Na opinião de Andreia
Carvalho, da UM, há cada vez mais abertura para conhecer as religiões
orientais, enquanto pedaço da cultura. “Os jovens portugueses são muito
curiosos em relação a novas culturas e religiões, talvez a fim de se
identificarem com algo e descobrirem o seu verdadeiro eu. Mais que nunca a
cultura oriental tem-se revelado das mais interessantes. Quando me refiro à
cultura oriental, refiro-me às culturas chinesa, coreana e japonesa. A sua
influência tem sido cada vez maior no ocidente.”
Já Jessica Marinho,
também aluna do curso de LCO, acredita que não há muito desejo da parte dos
europeus em aprender a cultura oriental. “Aprender mandarim tem sido para mim
uma experiência muito diferente, nunca tinha aprendido uma língua asiática e
não sabia nada sobre a cultura chinesa. Acho a cultura chinesa é muito
interessante, é muito rica e tem muita história. Tudo tem um significado e isso
torna tudo mais importante.”
Apesar de apontar
uma abertura de mentalidades, Andreia Carvalho considera que é difícil para os
jovens deixarem de lado o catolicismo e abraçarem as religiões orientais de
raiz. “Os jovens interessam-se bastante por culturas que tenham pontos de
atracão muito fortes, como festivais, música ou locais de interesse. Seria mais
fácil os jovens adoptarem uma corrente ou um certo pensamento, como o Taoísmo
ou o confucionismo. Mas, mesmo assim, os jovens de hoje em dia já têm um
pensamento mais ou menos definido quanto a certas correntes.”
Taoísmo: a religião
nativa da China
O presidente da Associação de Taoistas de Macau (ATM), Ng Peng Chi, explicou ao Hoje Macau as linhas mestras desta religião. “Normalmente as pessoas pensam que o Budismo é oriunda da China mas não é, é o Taoísmo. Dos mais de 40 templos de Macau, 80% são taoistas. Taoísmo é um politeísmo religioso. Tem duas facções que dependem se os crentes são casados ou não”. Ng Peng Chi é da facção Zhengyi, o que significa que pode casar e ter filhos, porque herdou isso dos antepassados. “O meu pai, avô e bisavô eram todos taoistas, mas pensamos de maneiras diferentes. O meu pai é mais reservado e só fala com crentes, mas eu fundei esta associação e fiz esforços para que a música taoista possa vir a ser Património Cultural de Macau, porque assim posso promover a religião junto dos residentes”. No geral, “o pensamento do Taoísmo é inacção, o que significa: não force, não compita com o mundo, é o sublinhar de uma sociedade harmoniosa”, acrescenta.
Confucionismo: o
pensamento central da sociedade chinesa
Não é uma religião mas sim um sistema filosófico chinês criado por Kung-Fu-Tzu. Huang Shih-Han, professor de filosofia numa universidade de Taiwan, explica ao Hoje Macau como funciona. “Na época imperial, existiam dois sistemas de educação, e se o Taoísmo era para os imperadores, o confucionismo era para os cidadãos. Por causa disso o pensamento de Confúcio ainda hoje se ensina nas escolas, e é acolhido por muitas pessoas. O confucionismo dá todos os ensinamentos éticos para os cidadãos.” Huang Shih-Han sublinha ainda que o confucionismo tem dois sistemas. “Um é para os líderes, é a ideia da política: a base da moralidade e da justiça para alcançar a governação do país. Outro é para cada cidadão, com a realização pessoal. O primeiro sistema normalmente aponta para as leis, enquanto o outro significa a consciência moral de cada pessoa, que tem cinco elementos: Benevolência, Justiça, Etiqueta, Sabedoria e integridade”.
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