Ana Sá Lopes –
Jornal i, opinião
Cavaco e Portas de
acordo: Passos e Gaspar põem em causa o interesse nacional
Nem o Presidente da
República nem o parceiro de coligação apoiam o volte-face na estratégia do
primeiro-ministro e do ministro das Finanças – que de um momento para o outro
decidiram recusar pedir à troika a revisão do programa português à luz das novas
condições obtidas pela Grécia, vulgo mais tempo e juros mais baixos.
Cavaco Silva, que
está longe de ser um modelo de clareza, teve uma posição inequívoca na
quarta-feira à noite: “Eu não vejo razão para que não seja reduzida a comissão
que é cobrada a Portugal pelos empréstimos que recebeu do Fundo Europeu de
Estabilidade Financeira, matéria que, aliás, penso que já tinha sido falada há
algum tempo. Tal como não vejo razão para que não seja alargado o período de
reembolso dos empréstimos do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira.” O
Presidente da República não poupa Vítor Gaspar, que anunciou a renegociação
para depois recuar – ver como Cavaco alude à “matéria que já tinha sido falada
há algum tempo”.
O Presidente admite
que o governo pode estar em maus lençóis, mas lembra a Passos e a Gaspar que
têm a obrigação de defender o país: “A vida na União Europeia é uma negociação
permanente e eu sei isso por experiência própria. As negociações são, às vezes,
muito, muito difíceis, mas nós não podemos desistir. Por isso há interesses que
Portugal, independentemente da situação da Grécia, não pode deixar de continuar
a defender.” Um governo que desiste não está, diz claramente o Presidente da
República, a defender o interesse nacional. Embora Cavaco Silva não seja adepto
de soluções radicais, deve estar consciente de que este é um argumento
suficiente para que seja invocada aquela famosa alínea da Constituição que diz
que o Presidente pode demitir o governo “se estiver em causa o regular
funcionamento das instituições”, aliás, como defende Mário Soares que, aos 88
anos, ocupa o lugar de verdadeiro líder da oposição.
Mas não é só o
Presidente a dizer que a desistência de Passos e Gaspar põe em causa o
interesse nacional. O parceiro de coligação, Paulo Portas, veio dizer
claramente que “concorda com o Presidente”. Ora, se Paulo Portas concorda com o
Presidente, o governo em funções perdeu legitimidade institucional para
prosseguir esta política. Portas pode ser o número 3 do governo – como Passos
Coelho docemente indicou –, mas acabou de escrever directamente à troika e
partiu a coligação num tema crucial. O governo é hoje uma coisa fantasmagórica.
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