Deutsche Welle
Ao contrário de
outros países sul-americanos, até hoje o Brasil não se ocupou devidamente dos
crimes do regime 1964-1985. Para vítimas, medidas não vão longe o suficiente.
Disponibilização na rede abre caminhos.
O Brasil dá mais um
passo na recuperação de sua memória política, em especial na investigação do
período ditatorial mais recente. Nesta segunda-feira (01/04), entrou online o
site do Arquivo Público do Estado de São Paulo, permitindo, pela primeira vez, acessar
cerca de 1 milhão de documentos relativos à ditadura militar de 1964-1985.
Os arquivos revelam
quem foi perseguido e espionado pelo regime. Já os nomes dos responsáveis, no
entanto, foram omitidos. Os documentos são originários do Departamento Estadual
de Ordem Política e Social (Deops), órgão importante no aparato repressivo dos
militares, e foram guardados pela Polícia Federal, antes de serem confiados ao
estado de São Paulo, em 1990.
Divulgar, para que
não se repita
No site do arquivo,
Lauro Ávila Pereira, diretor do Departamento de Preservação e Difusão do
Acervo, avalia que a iniciativa pode ajudar a identificação daqueles agentes
públicos que, durante a época da ditadura, cometeram violações dos Direitos
Humanos. "Temos que lembrar que o Brasil é um dos poucos países da América
do Sul onde esse tipo de crime jamais foi punido." Pereira ressalta,
ainda, a importância didática do acervo online, que pode ser utilizado pelos
professores em sala de aula.
A disponibilização
resulta da parceria entre a Associação dos Amigos do Arquivo Público de São
Paulo e o projeto Marcas da Memória da Comissão de Anistia, do Ministério da
Justiça, com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(Fapesp).
A parcela agora
acessível, em torno de 1 milhão de fichas, prontuários e dossiês, compõe cerca
de 10% do acervo total. Sua seleção e digitalização exigiram mais de três anos,
e o processo de digitalização prossegue até 2014.
Um projeto análogo,
e já em pleno funcionamento, é o website Documentos Revelados, que contém
milhares de testemunhos históricos relativos ao último período ditatorial
brasileiro.
Disponibilizados em
formatos PDF e JPEG, os arquivos contemplam desde relatórios policiais,
depoimentos, análises periciais e processos judiciais, até cartas e fotografias
– além de jornais e panfletos produzidos por organizações que resistiram ao
regime militar. O editor do site, Aluízio Palmar, que se apresenta como
"um sobrevivente", baseou-se sobretudo em arquivos estaduais.
Hora da verdade –
finalmente?
Ao contrário de
outros países sul-americanos, como o Chile ou a Argentina, até hoje o Brasil
não elaborou devidamente os crimes da ditadura dos pontos de vista jurídico e
legislativo.
Somente em novembro
de 2011 a presidente Dilma Rousseff instituiu uma Comissão da Verdade, com o
objetivo de apurar violações dos direitos humanos ocorridos entre 1946 e 1988.
Na ocasião, ela sancionou também a Lei de Acesso a Informações Públicas,
acabando com o sigilo eterno de documentos.
Segundo dados
oficiais, 480 pessoas foram assassinadas por motivos políticos durante a
ditadura no Brasil. Mais de 100 mil foram presas, e o número das vítimas de
tortura é calculado em 50 mil, no mínimo. O destino de 160 desaparecidos segue
não esclarecido.
Para muitas das
vítimas, a elaboração do período militar precisa ir mais longe. Elas exigem a
revogação da Lei de Anistia de 1979, que garante impunidade aos que atuaram
como torturadores entre 1964 e 1985.
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