Fernando Dacosta –
Jornal i, opinião
Os portugueses
sabem hoje que os contratos feitos ontem não são garantia de nada, que a
corrupção, o surripianço, a vigarice, a impunidade se tornaram morais, que
viver dentro das suas possibilidades significa a miséria na comida, na saúde,
no agasalho, na assistência, na educação, na cultura, no conforto, significa
não ter aquecimento no Inverno, recorrer às meias-solas nos sapatos, aos fatos
virados, à carne duas vezes por ano, à autocensura; significa descrer dos que
combateram pela democracia, pela liberdade, pela justiça, pelo desenvolvimento.
Como mobilizar as pessoas se elas apenas vêem ser premiados os carreiristas,
promovidos os subservientes, festejados os oportunistas, retribuídos os
videirinhos, protegidos os corruptos?
A distância entre nós e a Europa (somos o país dela onde menos se ganha e mais
se retribui) aumentou, afinal, com a integração comunitária, com a moeda única,
com a (ludibriante) ajuda dos seus fundos. Não passamos afinal de servos
entrados nas cozinhas dos senhores, pensando que éramos da sua família.
Tijolo a tijolo o edifício da dignidade vai ruindo. Tudo aquilo que conseguimos
juntar, casa, carro, poupanças, conforto, está a ser penalizado, esbulhado.
O número dos destruídos pelo ultraliberalismo suplanta já o dos destruídos pelo
fascismo. O fosso entre os integrados no regime e os excluídos dele não pára de
crescer. O país fractura-se. Uma “guerra civil” lavra subterraneamente – com
outro nome, outras armas, outros afrontamentos, outras retóricas. O prometido
na revolução não passava afinal de miragem. Os que escolhemos, pagamos para nos
defender, paralisaram e traíram-nos – vivendo (já) bem no mal e mal no bem.
Escreve à quinta-feira
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