Diário Angolano
Depois da primeira,
tinha que chegar a segunda. E pelo andar da carruagem, não espantará a ninguém
que sejamos confrontados com terceiro episódio.
E isso, claro está,
quando se tratam apenas de casos que conhecem a luz do dia. Esta semana, voltou
a circular nas redes socais um novo vídeo que mostra cenas de violência
policial contra reclusos em mais uma prisão da capital angolana, a Cadeia de
Viana. Num espaço de poucos meses, este é o segundo caso que vem revelar o
excesso de zelo e da falta de responsabilização aos prevaricadores. Não se
sabem, ao certo, quando foi gravado o mais recente vídeo, mas isso não é o que
está em conta nesta abordagem.
O que está em causa
é a acção em si e o alto nível de fel que calcorreia ao nível de epiderme
daqueles agentes policiais – com bombeiros incluídos – que, insensíveis,
arreavam o bastão e pontapeando de forma inclemente sobre indefesos reclusos.
Aquela impiedosa e quase selvática sessão de espancamento conforma, pois, uma
grave violação dos direitos humanos.
O que aconteceu
neste novo vídeo – novo porque só agora foi publicado – é sintomático de que
não estamos diante de um caso isolado. Antes pelo contrário: poderemos estar
diante de práticas comuns. O que pode acontecer é que muitos desses casos de
abuso contra a população prisional só não chegam a conhecer a luz do dia. Mesmo
com os esforços e programas tendentes a humanizar as prisões, que passa também
pela construção de novas cadeias, este tipo de agressões é reveladora de que
ainda estaremos à anos-luz de alcançar este desiderato. As cenas de tortura
revelam, acima de tudo, uma clara ausência de responsabilização para com os
autores deste tipo de atrocidades.
Demonstra
claramente que mesmo com a recorrente criação de várias comissões de inquérito,
os resultados revelam-se insuficientes para determinar o grau de atropelos no
interior das cadeias. Naquelas cenas de torturas, como se pode depreender, é
notória claramente a ausência de uma mão pesada para refrear o avanço galopante
deste tipo de práticas
Nem mesmo do actual
ministro, que entrou a matar com uma série de medidas e outras exonerações, se
faz sentir o barulho do murro dado em cima da mesa. Resultado: as práticas, que
não devem ser permitidas em nenhuma circunstância, continuam, porque sem uma
voz que se faça audível dentro das cadeias, os agentes se julgam com o “rei na
barriga”. Sentem impunes. Arreiam o cacetete, esbofeteiam, pontapeiam, soqueiam
e dão ainda ao desplante de passearem a assobiarem de lado.
Com o problema das
cadeias sobrelotadas parece haver entre os agentes carcerários uma ideia
distorcida que os leva a concluir que a população prisional serve apenas para
saco de pancada. Com o vídeo recente há a nítida sensação de que os presos
vivem mergulhados no medo. Parece existir uma forte tensão ante a presença dos
agentes prisionais. Fica-se com a nítida sensação que, à semelhança dos novos
vídeos, o pessoal preso doutros estabelecimentos poderão passar, também, pelas
mesmas sevícias. As investigações, senhor ministro, existem. As comissões de inquérito,
essas, também existem.
Mas os resultados,
esses, é que muitas vezes não chegam ao conhecimento do público, pelo simples
facto de que, às vezes, a monitorização sistemáticas dessas investigações e
dessas comissões de inquéritos não são independentes. Indefesos, os presos nem
sempre podem evitar que a violência seja praticada contra eles, mais a mais por
quem tem o dever e, aliás ganham com isso, para garantir os direitos dos
cidadãos. Porém, com mais rigor, muito pode ser feito, senhor ministro, para
evitar que este tipo de práticas aconteçam. O importante, senhor ministro, não
é construir novas prisões. Isto, por si só, não é o suficiente. Tudo passa,
senhor ministro, por treinar a Polícia e os funcionários prisionais.
Antigo ou não, o
importante não é a data que o vídeo foi produzido. O importante é que tais
denúncias ajudem, de facto, a acabar pôr um cobro contra os reclusos. O
importante é não cruzar os braços, nem ficar de boca calada. É responsabilizar
e punir os prevaricadores. Basta, senhor ministro, de mostrarmos complacência
contra quem insiste em encarar o próximo como saco de pancada. Cordeiros?
Podemos até ser.
Mas não devemos
nada falar ou fazer quando os direitos dos presos são escandalosamente desrespeitados.
Que as autoridades centrais, através do ministro do Interior, faça ouvir e
sentir o seu murro na mesa. E desta vez que seja para valer, porque pior do que
a carruagem anda também já não ficaremos... Diante disso, senhor ministro, o
que pensa fazer agora que a batata quente está nas suas mãos?
A Capital, 31 de
agosto de 2013
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