segunda-feira, 24 de março de 2014

Portugal: INDEMNIZAÇÕES ILÍCITAS



MARGARIDA JANEIRO - Esquerda

Dinamizar a economia e desincentivar o recurso aos tribunais são os argumentos apresentados pelo Governo para justificar a diminuição das indemnizações dos despedimentos ilícitos, mas há nestas medidas propostas uma nuance que passa despercebida.

Quando alguém é despedido sem justa causa (e em breve será ainda mais fácil fazê-lo) os valores das indemnizações a pagar variam entre 30 dias por cada ano, ou 18 dias por cada ano ou, ainda, 12 dias por cada ano, diminuições estas devidas às alterações à lei imposta pelo Governo PSD/CDS, e que variam consoante a data de celebração do contrato de trabalho.

Porém, se um trabalhador é alvo de um processo disciplinar, pode recorrer aos tribunais para tentar provar que o seu despedimento é ilícito.

Agora o Governo quer “desincentivar essa prática” e diminuir os valores a pagar nas indemnizações aos trabalhadores vítimas de despedimento ilegal.

Recorrer ao tribunal pode garantir ao trabalhador, caso seja provada a veracidade da sua contestação, que receberá em indemnizações o valor equivalente a 45 dias de trabalho por cada ano de serviço.

E são precisamente esses 45 dias que o Governo PSD/CDS quer ver reduzidos para 30, banalizando, assim, a injustiça!

Despedir arbitrariamente deve corresponder a uma penalização para o empregador que prevarica. É, aliás, daí que surgem os 45 dias, uma penalização que visa dissuadir más práticas. Mas, ao aproximar e nivelar pela mesma bitola aquele que foi vítima do patrão e aquele que foi vítima das circunstâncias, o Governo, a mando da Troika, pretende furtar-se a um dever cívico e à responsabilidade cidadã, conferindo ao patronato poderes eticamente reprováveis e socialmente desonestos.

Se foi cometida uma injustiça, ela deve ser reparada, daí que o valor a atribuir pela indemnização seja, até agora, mais elevado. A lei em vigor visa proteger o trabalhador de um dano que lhe foi causado.

“Desincentiva-se o recurso aos tribunais”, alegam os promotores da medida anunciada, e “dinamiza-se o mercado de trabalho”, acrescentam.

Esvazia-se a prática da democracia, desencorajam-se as vitórias, desvaloriza-se a defesa dos direitos chamando-lhes privilégios, apela-se ao comodismo, incita-se ao “encolher de ombros”, retiram-se as forças à luta por relações laborais dignas, diria eu.

Mas não só!

Há nesta proposta uma nuance perversa.

É que, se um de nós for alvo de um processo disciplinar, sendo despedido com alegada justa causa, e se não contestar a medida nos tribunais provando a sua defesa, perde o direito ao subsídio de desemprego.

E esta proposta esconde isso: a eventual poupança que se prevê venha a ser feita também em apoios sociais. Não se trata apenas do valor a pagar em termos de indemnização, onde a entidade patronal paga menos, logo perde menos ou, visto sobre outro ângulo, ganha mais.

Trata-se de desencorajar também o recurso à luta pelos apoios sociais, à luta pela proteção social.

* Jornalista, desempregada, dirigente do Bloco de Esquerda.

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