Tomás Vasques –
jornal i, opinião
Os portugueses, tal
como a generalidade dos povos europeus, cedo se aperceberam que a União
Europeia estava a ser "construída" no mais completo divórcio com a
sua vontade
1 - Em cumprimento
do calendário arrasta-se a mais desoladora campanha eleitoral de que tenho
memória, o que não pode deixar de entristecer quem acredita nas virtualidades
da democracia. A indigência e o vazio do discurso dos candidatos dos partidos
do governo cruza-se, nas ruas, com a gélida indiferença dos cidadãos, aqui e
ali disfarçada pela cobertura mediática de visitas a empresas ou jantaradas com
a nomenclatura partidária; também os partidos da oposição não conseguem
mobilizar o imenso caudal de descontentamento que por aí abunda. O que era de
esperar. Um povo enganado, maltratado e sem esperança em dias melhores, não
corre atrás de foguetes, nem comemora, como o governo, o empobrecimento, o
desemprego, a emigração forçada de centenas de milhares de jovens. Um povo
enganado, maltratado e sem esperança em dias melhores só pode desconfiar de
qualquer promessa eleitoral, tanto quanto começa a desconfiar de todos os
políticos, senão mesmo desta democracia agrilhoada, em que só em véspera de
eleições lhe dão palmadinhas nas costas e falas mansas. E depois, uma vez
recolhidos os votos, os eleitos engrossam a voz e brandem o chicote escondido
atrás das costas. Lincoln já tinha advertido: "não se pode enganar a todos
todo o tempo".
2 - O desinteresse
dos portugueses pelas eleições para o parlamento europeu já vem de trás. Desde
há vinte anos, a abstenção ultrapassa os 60%, apesar de, ainda em tempo de
ilusões, em 1987, logo após a integração europeia, mais de dois terços dos
eleitores terem votado, ficando a abstenção nos 27%. Isto significa que há uma
relação directa entre a abstenção e a percepção da utilidade do voto. Os
portugueses, tal como a generalidade dos povos europeus, cedo se aperceberam
que a União Europeia estava a ser "construída" no mais completo
divórcio com a sua vontade. Sem qualquer debate, e sobretudo sem qualquer
envolvência dos cidadãos. O seu voto era inútil, porque em nada alterava o rumo
do "monstro" burocrata e autoritário que crescia em Bruxelas. E o
desinteresse foi crescendo, de eleição para eleição. Mesmo o terço de eleitores
que se deslocaram às urnas de voto nas últimas eleições europeias não foram,
certamente, escolher as duas dezenas de deputados portugueses em Bruxelas, aos
quais, mal ou bem, não outorga qualquer utilidade, mas foram sobretudo
pronunciar--se sobre as políticas do governo português no momento. É o que vai
acontecer, também, no próximo domingo. Ao contrário das eleições autárquicas,
em que se misturam uma multiplicidade de protagonistas, de candidaturas
independentes e interesses locais, estas eleições europeias vão ser um
referendo, um plebiscito, uma gigantesca sondagem às políticas deste governo.
No fundo, o ensaio geral das legislativas do ano que vem. E, se assim for, os
resultados podem constituir uma desagradável notícia para o governo.
3 - Como se não
bastasse a dupla Paulo Rangel e Nuno Melo, os candidatos dos partidos do
governo, espreguiçarem-se no mais primário discurso político e na completa
indigência intelectual, tomando os portugueses por parvos, apareceu ao seu lado
Jean-Claude Juncker, no mesmo registo. O candidato à presidência da Comissão
Europeia pelos partidários de Ângela Merkel, veio a Lisboa passear a sua
ignorância sobre o fundador da primeira cidade de origem europeia na América, o
navegador genovês Cristóvão Colombo. Disse o luxemburguês: "Os socialistas
lembram-me um dos vossos compatriotas mais prestigiados: Cristóvão Colombo.
Quando partia nunca sabia para onde ia, quando chegava nunca sabia onde estava,
e era o contribuinte que pagava a viagem." Para além de Colombo não ser
nosso compatriota, apesar da ficção o querer fazer galego ou catalão, e mesmo
português, a patacoada é alarve, própria desta gente que gere a destruição da
União Europeia e que não sabe "que o sonho comanda a vida". Assim os socialistas,
portugueses e europeus, fossem capazes de, tal como Colombo, "dar novos
mundos ao mundo" e descobrir de novo outras Américas. De Colombo fala-se
500 anos depois; de Juncker, mesmo pago com dinheiro dos contribuintes, daqui a
uma década não passa da marca de um esquentador.
Jurista - Escreve à
segunda-feira
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