segunda-feira, 19 de maio de 2014

Angola: O Menino Jesus e o Censo Geral




Jornal de Angola, opinião – em A Palavra do Diretor

Angola somos todos nós, mas para apurar quantos somos, onde vivemos e o que fazemos, está em marcha o Censo Geral da População e Habitação.

Os recenseadores vão bater-nos à porta para fazerem um inquérito de 40 perguntas. É rápido, fácil e muito simples. Ninguém vai fazer perguntas que tenham a ver com a reserva da intimidade privada. Os nossos segredos, os “jardins secretos” de cada um, não são chamados para o censo. Depois de respondermos ao inquérito vamos continuar exactamente na mesma, porque apenas revelamos aquilo que é de interesse para as estatísticas.

O recenseamento da população (e no nosso caso, também da habitação) é uma prática muito antiga. O imperador romano César Augusto quis saber quantos habitantes tinha a Judeia, na época colónia de Roma. Maria e José saíram da sua aldeia em direcção a Belém, para se recensearem. O Menino Jesus nasceu nessa viagem para ser rei. 

Há memória escrita de recenseamentos da população e das terras cultiváveis na Idade Média, desde os reinos africanos à Europa, passando pelo Oriente, na época muito mais avançado que o resto do mundo e com cidades organizadas à custa do recenseamento dos habitantes, da oferta de habitação e dos recursos. 

Na época colonial existiram em Angola vários recenseamentos da população. O último foi em 1970 e ficou marcado o próximo para 1980. Em 1983 foi feito um recenseamento parcial, porque a guerra de agressão estrangeira  impediu uma operação estatística que respeitasse os princípios básicos do censo. 

De resto, os técnicos de estatística recomendam um Censo da População de dez em dez anos, para acompanhar com fiabilidade a evolução das gerações, mas nada pode ser feito na confusão generalizada.

O Executivo precisa de saber quantas crianças existem em Angola até aos seis anos, para poder responder eficazmente aos cuidados de saúde maternos e infantis. É necessário saber quantas crianças vão em cada ano frequentar o ensino pré-escolar e quantas vão para as escolas. Com o recenseamento é possível também prever quantas novas crianças vão entrar, todos os anos, no sistema de saúde ou na rede pública de ensino. 

Quem governa precisa de saber como estão alojadas as famílias angolanas. O Plano Nacional de Habitação só pode responder positivamente às necessidades reais do país se for apurado quantos somos, onde e como vivemos. Sem os dados do Censo Geral da População e Habitação há o risco de construir centralidades onde basta um bairro ou o contrário. Quando forem revelados os dados finais dos inquéritos, quem mais fica a ganhar são os angolanos que hoje vivem os efeitos da interioridade. 

Uma vez tirado o retrato da grande família angolana, é possível responder com eficácia às necessidades exactas de água, luz, comunicações, rede viária, escolas, postos, centros de saúde e hospitais, espaços verdes, equipamentos de lazer, aterros sanitários, saneamento básico e estações de tratamento de águas residuais. O Censo Geral permite dar um forte empurrão à qualidade de vida e fornece dados estatísticos para uma melhor organização e gestão do território.

A constituição das autarquias locais, que alguns políticos querem que seja feita à pressa e sem o conhecimento real da situação de cada município e comuna, tem no Censo da População e Habitação o seu mais precioso aliado. Os municípios e comunas não são todos iguais. Em qualquer parte do mundo o Poder Local é constituído por um número de autarcas que é determinado pela grandeza de eleitores inscritos. Uma comuna com mil habitantes elege menos autarcas do que uma com 100.000. Os recursos financeiros para gerir uma autarquia com 10.000 eleitores não são os mesmos do que os necessários para 80.000. Só depois do Censo Geral é possível desenhar o novo mapa autárquico nacional. Onde há actividades económicas pujantes, as autarquias têm financiamentos garantidos. Onde nada existe, a não ser um comércio rural incipiente ou agricultura familiar de subsistência, o Orçamento Geral do Estado tem que reforçar as finanças locais.

Hoje temos municípios que cresceram de tal forma que justifica o seu desdobramento em dois ou três. E no interior do país, onde a guerra de agressão estrangeira destruiu tudo, há municípios em morte social. Face aos níveis de destruição dos equipamentos básicos e do desmantelamento dos circuitos de produção e distribuição, deu-se um êxodo de milhões de pessoas. É preciso ter em conta estas realidades na reconstrução da nova divisão política e administrativa do país. E só o Censo da População pode dar os números fiáveis para que este importante passo seja dado.

O Censo Geral é o melhor amigo das futuras eleições autárquicas. A pressa só pode dar confusão, oportunismo e corrupção. No actual quadro, com os números que hoje temos, em vez de um poder local democrático, as eleições só podem dar satisfação àqueles que aprenderam a trabalhar com base em clientelas políticas sedentas de poder político e financeiro. 

O Censo Geral é amigo da boa governação e do futuro dos meninos e meninas de Angola. O Censo  fornece os dados que dão sustentabilidade a uma melhor gestão da Saúde, da Educação a todos os níveis, do Desporto, dos Transportes Públicos, da Banca, dos Seguros, da Indústria, do Comércio, dos Serviços, das Novas Tecnologias.  Por isso, devemos encarar os inquiridores do Censo como gente da casa e recebê-los de braços abertos. Quanto melhor for o seu trabalho, melhor Angola vamos ter. Até ao fim deste mês vamos todos vestir a camisola do Censo. Com os seus resultados, Angola fica mais forte.

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