Alfredo Manjate - Verdade
(mz), em Tema
de Fundo
As
delegações do Governo de Moçambique e do maior partido da oposição, a Renamo,
chegaram ao acordo final que visa por termo aos confrontos armados, garantindo
amnistia as parte envolvidas na guerra. Falta, agora, a marcação de uma data
para a assinatura dos documentos.
O
consenso final foi anunciado no fim da tarde desta terça-feira, 05 de Agosto,
durante a sessão que teve a particularidade de acontecer na Assembleia da
República (AR) e não no Centro de Conferência Joaquim Chissano, ponto habitual
de encontro. No fim dessa ronda, que durou cerca de três horas, as partes
anunciaram ter harmonizado três principais documentos, num dos quais consta o
acordo de amnistia que, ainda nesta legislatura, deverá ser convertido em lei
de modo que, o mais rápido possível, possa entrar em vigor.
"Nesta
ronda foi possível harmonizarmos os três documentos principais, nomeadamente o
memorando de entendimento, os mecanismos das garantias e os termos de
referência visando a presença de observadores internacionais no país",
anunciou o chefe da delegação da Renamo, Saimone Macuiane, no fim da 69ª sessão
de diálogo.
O
acordo de amnistia, segundo ficou-se a saber, visa ilibar as pessoas que
durante o período dos confrontos armados possam ter cometido actos que à luz
das leis moçambicanas se consubstanciem crimes. No entanto, para a validação
deste documento, será submetida ao Parlamento, nos próximos dias, uma proposta
de "Lei de Amnistia" que "cubra acções criminosas" para o
respectivo debate e aprovação. Os princípios gerais que vão nortear a referida
proposta já foram acordados entre as duas partes.
Recorde-se
que para além de António
Muchanga, quadro da Renamo, que se encontra detido, 21
membros deste partido indiciados de promoverem desmandos na localidade
de Napome, distrito de Nampula-Rapale estão enclausurados desde Outubro
passado.
As
chefias das delegações não deixaram claro quem vai submeter ao Parlamento a
proposta de Lei de Amnistia, mas a equipa da Renamo deu a entender que deverá
ser o Governo a faze-lo, tendo em conta a urgência que se tem nesse processo,
uma vez que às eleições se aproximam e a Assembleia da República irá também
encerrar as suas actividades.
“(…)
foi decisão comum que talvez usando o processo simplificado seria a melhor
forma, então esperamos que o Governo no seu mais alto critério possa usar esse
processo, sem, no entanto, o embargo que as bancadas parlamentares da Renamo e
da Frelimo possam dar as suas contribuições de modo que esta lei reflicta os
pontos discutidos ao nível do diálogo”, disse Macuiane.
Por
sua vez, o sub-chefe da delegação do Governo não assumiu que será o Executivo a
submeter o projecto de lei, afirmando somente que cabia aos juristas determinar
o melhor mecanismo para o efeito. “Não sendo jurista não conheço os
procedimentos que levam a aprovação de uma lei de amnistia”, disse Muthisse.
O
ponto claro de convergência é de é urgente que se produza e se remeta esse
projecto de lei ao órgão competente. A presente sessão do parlamento termina em
meados deste mês.
Implementação
do acordo inicia antes das eleições
Gabriel
Muthisse voltou a sublinhar que a implementação do acordo deverá começar dentro
de 90 dias e antes da data das eleições gerais marcada para 15 de Outubro.
“A
vinda de observadores internacionais, a calendarização das acções acordadas e a
sua implementação terá que ocorrer antes da eleições, pelo menos uma grande
parte”, esclareceu o ministro e Transportes e Comunicações e sub-chefe da
delegação governamental.
Enquanto
a delegação da Renamo considera que, uma vez, alcançado o acordo fica o desafio
de se garantir a sua implementação, um processo que deverá criar mais confiança
entre ambas, a do Governo sublinha há condições, tal “como sempre houve” para
que o presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, possa retornar à vida política
active.
“O
acordo alcançado entre as partes somente poderá dar mais confiança para que ele
saia definitivamente das matas onde se encontra”, afirmou Muthisse.
Encontro
Guebuza vs Dhlakama
Como
um dos passos a serem seguidos depois deste consenso, o chefe-adjunto da
delegação do Governo apontou a preparação do encontro entre o Presidente da
República, Armando Guebuza, e o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, no qual, se
supõe, deverá ser assinado com o punho destes o acordo definitivo para o fim
das hostilidades.
“Isso
implica pensar na logística e nos passos necessários para que o presidente da
Renamo saía donde está para que eventualmente se possam assinar os documentos
que acabamos de harmonizar”.
Após
essa fase deverá o Executivo encetar diligências para a vinda dos observadores
militares internacionais ao país para fiscalizarem no terreno o processo de
cessação dos ataques, a reintegração nas Forças Armadas de Defesa de Moçambique
e na Polícia de uma parte dos homens da Renamo e reinserção social e económica
da outra.
Muthisse,
questionado pelos jornalistas, escusou-se a elaborar de forma clara sobre como
será feita a reinserção económica argumentando que tal cabe aos especialista do
sector.
O
acordo já era previsível
O
espírito de consenso vinha a evidenciar-se de forma mais clara desde 28 de
Julho último quando as partes anunciaram a conclusão do “documento base” sobre
as matérias em
discussão. Depois desse encontros esperava-se que a qualquer
momento o acordo final pudesse ter lugar, pois, tal como diziam, faltavam
apenas aspectos complementares.
Já
na ronda havida a 30 de Julho, quando se esperava que as delegações selassem,
de uma vez por todas, o acordo na mesa das negociações a Renamo introduziu o
ponto sobre “qualificação do que pode constituir os mecanismos de garantias”,
visando clarificar de que forma estará acautelada a “amnistia” após o fim do
processo.
Ultrapassado
este ponto na ronda seguinte, 4 de Agosto, foi a vez de Governo pedir o reexame
do ponto sobre o comando central e os subcomandos da missão de observação
internacional, constante dos termos de referências, o que mais uma vez adiou o
acordo final para esta terça-feira.
Meses
de guerra, medo e incertezas
O
acordo ora alcançado entre o Governo e a Renamo visa por termo à tensão
política que se vivia no país e que começou a evidenciar-se com o regresso de
Afonso Dhlakama à base militar da Renamo, em Santundjira, provincial de Sofala,
em finais de 2012. Na altura, momentos de incertezas seguiram-se no seio dos
moçambicanos, motivados pelas notícias dando conta de que naquele local
começavam a ser treinados os ex-guerrilheiros desta força política e antigo
movimento rebelde.
Meses
mais tarde, Abril de em 2013, homens da Renamo e a polícia confrontam-se no
posto administrativo de Muxúnguè. No mês seguinte, em Maio de 2013, o Governo e
a Renamo reiniciam, a pedido deste, um diálogo politico que haviam interrompido
no ano anterior e quarto pontos são apresentados como agenda das negociações,
nomeadamente Pacote Eleitoral, Forças de Defesa e Segurança, questões
económicas e despartidarização do Aparelho de Estado.
No
entanto, enquanto por um lado se mantinha o diálogo no Centro de Conferências
Joaquim Chissano, por outro, mais concretamente no centro do país o clima de
terror ganhava cada vez mais espaço. Os encontros entre as duas delegações iam
sucedendo-se sem que o consenso sobre o primeiro ponto da agenda, o Pacote
Eleitoral fosse alcançado. A Renamo exigia paridade na composição dos órgãos
eleitorais, mas o Governo recusava com a justificação de que, de acordo com o
princípio de separação de poderes, não cabia a si decidir sobre essa matéria.
O
diálogo alastrou-se com episódios de avanços e recuos. A 21 de Outubro de 2013,
as Forças
de Defesa e Segurança invadem e atacam a base da Renamo, em Santundjira,
supostamente, com o objectivo assassinar Dhlakama, mas este escapa com o
secretário-geral da Renamo e deputado da Assembleia da República, Manuel
Bissopo. Nesse ataque morre o também deputado da “Perdiz” pelo circulo
eleitoral de Cabo Delgado, Armindo Milaco.
Em
resposta a Renamo declara o fim de acordo de Paz assinado em 1992 e anuncia que
vai alargar a segurança até rio Save, ao longo da Estrada Nacional Número 1
(EN1) como forma de evitar o avanço das tropas governamentais para perto do seu
líder. E assim se reabria a ferida da guerra dos 16 anos entre os mesmo
beligerantes. Uma onda de ataques armados contras viaturas que se faziam à EN1
sucederam-se e as escoltas
militares à colunas de viaturas não conseguiam evitar os ataques.
No
entanto, o diálogo continua em
Maputo. Já a 13 de Fevereiro do ano em curso, depois de 25
rondas de diálogo o Governo e a Renamo fecham o Pacote Eleitoral com o acordo
de inclusão de membros de partidos com assento no parlamento nos órgão de
gestão eleitoral a todos os níveis. E posteriormente iniciou o debate do
segundo ponto que decorria em paralelos com o ataques armados contra colunas de
viaturas. Muita gente foi morta e ferida.
A
7 de Maio, a Renamo chegou a decretar o cessar-fogo de forma unilateral, tendo
o suspendido em Junho por entender que o Governo não estava a cooperar.
Aproveitava a situação para enviar tropas para o centro do país. Após essa
medida os ataques intensificaram no EN1 e só voltaram a abrandar em Julho
quando as partes pareciam já estarem a se entender a avaliar também pelo
discurso apaziguador adoptado pelo líder da Renamo nos últimos dias.
Diálogo
continua
Com
a conclusão do segundo, dos quarto pontos que compõem a agenda de diálogo
politico restam dois por debater: a despartidarização do Aparelho do Estado e
as questões económicas. Ainda não está publicamente definido qual será o
próximo a entrar para o debate, mas o Governo já anunciou a sua disponibilidade
para continuar na mesa de diálogo.
Os
pontos que ainda restam, segundo Muthisse podem ser debatidos no actual modelo
de diálogo, mas também pode ser noutros modelos se a Renamo assim o desejar.
“O
que é um compromisso firme do Governo é que nós continuamos na disponibilidade
de debater, dialogar e avaliar formas que possam garantir o aperfeiçoamento dos
mecanismos que o Estado possui”.
Sem
saber ainda o que a Renamo pretende com o ponto sobre questões económicas, o
Governo especula que se queira exigir que haja critérios claros sobre as oportunidade
económicas. A ser isso, o Executivo avança que ter oportunidades económicas tem
várias nuances. “Ter acesso a terra para a prática da agricultura é uma
oportunidade económica grande. Ter acesso a licença ou alvará para exercer
actividade de consultor ou empreeteiro é uma forma de ter acesso a a
actividades económicas”, apontou Gabriel Muthisse e forma de exemplo.
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