Ana
Sá Lopes – jornal i, opinião
Só
com Francisco a Igreja recuperou das cinzas o combate ao capitalismo
A
Igreja portuguesa não se mete a sério na "política" pelo menos desde
1975, quando se aliou ao PS, por um lado, e à extrema-direita, por outro, para
combater o avanço dos "comunistas". Com maior ou menor discrição, a
Igreja nunca mais travou nenhum combate com a mesma energia: não o fez sequer
quando foi aprovado o casamento entre pessoas do mesmo sexo, ao contrário do
que aconteceu em
Espanha. Também não tinha vindo para a rua, enquanto
instituição, protestar contra a lei do aborto. Com uma ou outra excepção, a
Igreja cumpriu o lema de deixar aos homens o que é dos homens e a Deus o que é
de Deus. Provavelmente, também por isso, enquanto corpo institucional, a Igreja
tem atravessado esta crise com alguma parcimónia - e todos os discursos dos
seus responsáveis maiores costumam estar a anos-luz da violência crítica que o
Papa Francisco tem lançado contra o sistema capitalista.
Mas
alguma coisa mudou radicalmente para o bispo de Leiria-Fátima ter vindo ontem
criticar "a ditadura do capitalismo financeiro e especulativo",
citando Bento XVI, e a "tirania económico-financeira, especulativa,
virtual, desligada da economia real", citando o Papa Francisco. O bispo
António Marto avisou que o caso BES pode levar "à catástrofe e à ruína de
um país" e "as primeiras vítimas são sempre os mais pequenos e os
mais pobres".
A
aliança tácita da Igreja com o capitalismo é uma velha história que a ascensão
do comunismo ateu no século xx só serviu para reforçar. Era preciso
escolher um dos lados e, com a excepção dos padres adeptos da teologia da
libertação, a Igreja escolheu o seu. A crise financeira apanhou a Igreja aos
papéis, repetindo naturalmente o essencial da doutrina, mas incapaz de qualquer
ruptura com o sistema.
E
então veio o Papa Francisco, o maior fenómeno mediático que a Igreja conseguiu,
depois do fracasso neste domínio do intelectual Bento XVI. António Marto cita
Bento XVI a criticar "a ditadura do capitalismo financeiro e especulativo",
mas ninguém associou Bento XVI ao combate ao capitalismo. Foi preciso vir
Francisco para a Igreja recuperar das cinzas o combate consistente "à
tirania económico-financeira", num momento em que Cristo morreu, Marx
também, e os socialistas não se andam a sentir lá muito bem. Ver este discurso
chegar à Igreja portuguesa é um fenómeno extraordinário. Vamos ver se dura e se
tem algum apoio entre os militantes católicos portugueses.
Em
Fátima
Na
apresentação da peregrinação anual do migrante e refugiado ao Santuário de
Fátima, o bispo de Leiria-Fátima D. António Marto afirmou que “a falta de
ética na finança” pode “levar à catástrofe e à ruína de um país”.
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