Pedro
Marques Lopes – Diário de Notícias, opinião
É
provável que a vacuidade de Vítor Bento na análise política e económica seja
parecida com a sua qualidade como gestor, mas nada indica que esteja louco ou
que seja desprovido do mais básico bom senso. Assim sendo, não é de crer que
ele e a sua equipa se tenham demitido por birra ou capricho, colocando em risco
o Novo Banco e a já fragilíssima estabilidade do sistema financeiro.
A
Bento foi-lhe solicitada uma missão, proposta uma estratégia e depois alguém no
Governo ou no Banco de Portugal teve outra ideia e mudou tudo. Qualquer
semelhança com a atuação típica do Executivo não é mera coincidência.
É
por demais evidente que neste processo do BES/Novo Banco está escarrapachada a
incompetência/inconsciência/irresponsabilidade que tem sido a assinatura deste
Governo.
Em
primeiro lugar, a espécie de delegação, no Banco de Portugal e em Carlos Costa , de
poderes para conduzir a questão BES, pós-intervenção. A questão é de interesse
público e quem está mandatado pelo povo para tratar assuntos desta gravidade é
o Governo, diretamente, sem delegados. Um governo que aparece de toalha, para
ir secando as mãos, e finge que é espectador num processo em que está em jogo
20% da riqueza nacional e que pode fazer implodir o sistema financeiro
português, é um Governo suicida e irresponsável.
E
onde estão as atribuições do Banco de Portugal para administrar bancos
comerciais ou desenhar ou, mesmo, executar estratégias de gestão? E, claro
está, temos a tarefa que deve estar a espantar o mundo dos bancos centrais: o
Banco de Portugal como mediador de negócios de compra e venda.
Enquanto
a antiga administração estava em funções, tínhamos ministros a definir a
estratégia do banco na praça pública. De manhã era preciso consolidar, à tarde
era preciso vender o mais depressa possível. Num dia, a ministra das Finanças
punha em causa a supervisão, no outro enaltecia a tarefa do Banco de Portugal.
Tivemos
uma estratégia e em meia dúzia de semanas arranjou--se outra: há que vender
rapidamente o banco. Qualquer vendedor de carros usados sabe que anunciar
pressa na venda faz diminuir o valor de um bem. Como no Governo faltam
estadistas mas sobram vendedores de banha da cobra, o mais certo é alguém
pensar que mesmo perdendo dinheiro dos contribuintes, mesmo pondo em causa o
futuro da instituição, o importante é atirar o problema para um lado qualquer
antes das eleições para parecer que o assunto está resolvido.
Mas
eis que surge outra confusão. O novo presidente do banco, Stock da Cunha, na
carta que dirigiu aos colaboradores do banco, disse que "temos de voltar a
crescer em volume de negócios e créditos... e acabar com a discussão permanente
sobre o modelo ou a data de venda". Das duas, uma: ou o Governo está a
mentir, e afinal não tem pressa em vender, ou Stock da Cunha ainda estará menos
tempo no banco do que Vítor Bento.
Estamos
perante uma gigantesca trapalhada, em que o Governo se porta como uma barata
tonta e se tenta esconder por detrás do Banco de Portugal. No entretanto,
brinca com milhares de depositantes e põe em seriíssimo risco os outros bancos.
Os
disparates são tantos e tão graves que há alturas em que é legítimo pensar que
o Governo quer fazer implodir o Novo Banco e o sistema financeiro português.
Talvez na sequência do que está a fazer à Justiça.
Não
bastava termos um governo que não estava preparado para enfrentar a crise,
temos também governantes que tratam o maior problema do nosso sistema
financeiro das últimas décadas duma forma absolutamente errante e
irresponsável. É azar a mais.
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