Carvalho
da Silva – Jornal de Notícias, opinião
Diz
o primeiro-ministro grego: "Se houver eleições e o [Sirysa] as ganhar não
restará um euro nos bancos no dia seguinte". Ao longo dos últimos anos,
têm proliferado declarações de políticos europeus que apresentam as suas
receitas como "única saída". Ultimamente, também em torno dos anseios
de autonomia e independência, que se afirmam com intensidade em vários espaços
europeus, em resultado de constrangimentos e tolhimentos do futuro em que são
colocados os povos, foi usado um amplo arsenal de argumentos intimidatórios que
condicionam as livres escolhas.
É
certo que as questões das autonomias e independências são delicadas e reclamam
muita ponderação, o que não abunda quando o que interessa para os
primeiros-ministros de Inglaterra e de Espanha, o secretário-geral da NATO ou o
presidente dos EUA é instabilizar ou estilhaçar um qualquer país.
Conclusão:
para estes senhores ou nós aceitamos o estado das coisas tal eles as entendem,
ou teremos o dilúvio. Para eles, os nossos interesses e anseios como cidadãos
plenos e povos, o nosso direito à soberania e à democracia, estão acima das
nossas possibilidades. Só vale a sua "ordem". É uma atitude
sobranceira, mas também um sinal de fraqueza das atuais elites europeias.
Em
Portugal, caso uma verdadeira alternativa - não viável sem a presença, o
protagonismo e o empenho das forças de Esquerda - vier a configurar-se como
ganhadora, não faltará também uma Direita que, tal como na Grécia e noutros
países, conjure todas as pragas e demónios contra o perigo da mudança.
Por
isso mesmo todos os cidadãos e atores políticos não dispostos a acomodar-se aos
supostos imperativos da "competitividade", não dispostos a aceitar a
desvalorização e precarização do trabalho e a alienação de bens e serviços
públicos a interesses privados, terão de se preparar para enfrentar o discurso
terrorista do "ou nós ou o dilúvio".
Para
vencer o terrorismo verbal da Direita, a Esquerda e todos os democratas terão
de continuar a mostrar que, sob a ilusão da ordem estabelecida, vivemos um
processo revolucionário "de pernas para o ar", conduzido por uma
ínfima minoria contra quase todos. Essa "revolução", em vez da
suposta ordem e estabilidade, está a levar o Estado social de direito
democrático à rutura, a transformar a vida de quem trabalha num inferno feito
de coação e incerteza, e a comprometer o futuro dos nossos filhos e netos, a
quem oferece um país mais pobre e despovoado e com mais dívidas. O caos, na
realidade, é causado por essa minoria obcecada e gananciosa, que não olha a
meios para garantir a acumulação de dinheiro e privilégios.
Os
protagonistas de uma verdadeira alternativa têm de ser persistentes nas
denúncias e assertivos nas propostas; de fazer um trabalho de diálogo frontal e
aberto com os cidadãos para obterem a sua compreensão e consentimento, e assim
enfrentarem os riscos inerentes a uma governação democrática num quadro europeu
adverso. É preciso construir um mandato para essa governação. Os atores
políticos e sociais de um governo representativo e democrático precisam de
estar autorizados pela maioria do povo e serem por ele apoiados em medidas que
restabeleçam o valor do trabalho e a sua dignidade, que assegurem o controlo
público da finança, que garantam a provisão pública de saúde, segurança social
e educação, a proteção contra o desemprego, a garantia de rendimentos na
velhice para todos. O apoio ativo para a renegociação da dívida é um elemento
indispensável. Um poder realmente democrático não pode ficar paralisado pelo
pavor de uma hipotética exclusão da Zona Euro. Nada disto é fácil, mas é o que
terá de ser feito, com prudência e determinação, se quisermos saídas para a
crise em que estamos aprisionados. É preciso testar limites no que está
instituído a nível europeu e nacional. Só com essa atitude se clarificarão as
soluções possíveis.
O
trabalho para a Esquerda e para todos os setores democráticos é árduo mas
possível. Não pode é correr-se o risco de nas próximas eleições - em que tudo
deve ser feito para derrotar a maioria de Direita corporizada por PSD e CDS -
vingarem programas políticos que em pouco tempo se tornem numa deceção que
fortaleça alternativas de extrema-direita.
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