Mário
Soares – Diário de Notícias, opinião
Demorou
muito tempo a pronunciar-se. É verdade. Sofreu muitas pressões dos portugueses
ligados ao atual Governo, mesmo estando em funções no estrangeiro e não devendo
falar, como foi o caso de Durão Barroso e de outros súbditos dos mercados e
indiferentes às pessoas.
Seguramente,
o Tribunal Constitucional não quis falar antes das eleições, como se
compreende, dadas as pressões que sobre ele foram descaradamente feitas por
portugueses e alguns estrangeiros.
Contudo,
pela terceira vez, voltou a chumbar um Governo que não tem senso nem emenda.
O
senhor Presidente da República, que sempre tem protegido o atual Governo, não
pode agora continuar a falar da legitimidade de um Governo de coligação que não
se entende entre si, não tem senso e é incapaz de acertar com um único
Orçamento, que há três anos têm sido sempre chumbados. Seria ignorar o Tribunal
Constitucional e expor-se ao ridículo perante o País inteiro, ignorando a
Constituição da República, que jurou cumprir, e deixando de ter qualquer
respeito pelas pessoas, sobretudo as mais conscientes.
Além
disso, está muito próximo de ser um Presidente que tendo ainda dois anos de
mandato deixa de ter em breve qualquer poder. Vide a Constituição da República.
Espero,
por isso, que o senhor Presidente da República tenha a consciência da situação
e não volte a falar da legitimidade de um Governo incapaz, incompetente e
desvairado, que chegou ao fim, não se entende na própria coligação, não sabe o
que quer nem que futuro o espera. Certo é que não pode deixar de sair sujo,
muito sujo, da triste posição em que se encontra.
Se
o Presidente da República continuar a desculpar um tal Governo, acabará muito
mal.
Se
o senhor Presidente da República não falar e à última hora voltar a considerar
que o Governo é legítimo - e não ter a coragem de o demitir -, continuará a ser
cúmplice desta desastrada coligação, como tem sido até agora, e corre o risco
de não poder sair à rua sem ser vaiado pelo povo português, como tem sido
inúmeras vezes.
O
povo português é um grande povo e não se engana. Viu-se nas últimas eleições,
em que a esmagadora maioria não votou apesar do seu apelo nem perdoou ao PS,
cujo líder é António José Seguro, ter estado ou à direita ou crítico da
direita, conforme as situações. Mas nunca claramente à esquerda, como foi
sempre a posição do PS desde que se tornou um partido em 1973, data da sua
constituição. E, por isso, perante a crise atual nunca passou dos 30 e poucos
por cento. Resultado inaceitável para um partido como o PS, se estivesse
realmente à esquerda.
Voltando
ao senhor Presidente da República, permito-me insistir: não volte a proteger o
Governo. Demita-o! Se o não fizer, não tem desculpa nem perdão. O povo, que é
muito consciente e quem mais ordena, nunca lhe perdoará.