quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Alemanha. Colónia e Berlim desligam luzes para travar manifestações xenófobas



Joana Azevedo Viana – jornal i

Protestos "anti-islamização da Europa" reúnem cada vez mais adeptos contra avisos da chanceler mas luta pela tolerância está a ganhar forma

Todas as segundas-feiras desde Outubro, milhares de alemães saem às ruas de várias cidades do país para protestar contra os imigrantes, culpados de tudo ou quase tudo numa Europa cada vez mais xenófoba e onde os partidos de extrema--direita estão a ganhar terreno em plenas campanhas (veja-se o caso francês, com Marine Le Pen e a sua Frente Nacional a fecharem 2014 na liderança das sondagens para as presidenciais de 2016).

Dresden é a cidade onde o fenómeno ganha em número de adeptos, alumiado pelo PEGIDA (Europeus Patrióticos Contra a Islamização do Ocidente, na sigla em alemão), um grupo publicamente apoiado pelo jovem partido Alternativa para a Alemanha (AfD). Pelo que não será de estranhar que anteontem, na primeira segunda-feira de 2015, cerca de 18 mil pessoas tenham enchido o centro da cidade, contra os avisos de Angela Merkel e de outros políticos, para manifestarem o seu desagrado quanto aos migrantes.

A surpresa foram os, digamos, protestos anti-protestos que reuniram outros tantos milhares de alemães em cidades como Colónia, Estugarda e a capital, Berlim. À hora prevista das manifestações xenófobas na noite de segunda-feira, a catedral, a câmara municipal e outros edifícios históricos de Colónia apagaram as luzes “contra os racistas” e milhares de pessoas com cartazes a darem as boas-vindas aos refugiados e migrantes, fonte essencial da economia alemã, aplaudiram a desmobilização da marcha rival. “Não encaramos isto como um protesto mas queríamos que os apoiantes do PEGIDA pensassem sobre o que estão a fazer”, explicou o decano da catedral, Nobert Feldhoff, à BBC.

Colónia foi a vencedora da luta anti-racismo esta segunda-feira, dando força e voz a todos os alemães que recusam a xenofobia e a islamofobia de tantos outros no país. Com a cidade às escuras, a cidade enviou “um sinal democrático” e tornou possível que “muitas pessoas possam agora exprimir a sua opinião”, nas palavras do autarca Jurgen Roters. “Não queremos ter nada a ver com os extremistas de direita e com as pessoas xenófobas.”Os números não enganaram: contra milhares de apoiantes da integração e diversidade cultural na Alemanha, apenas 250 apoiantes do PEGIDA fincaram pé no centro de Colónia. O cenário em Berlim foi semelhante: as famosas portas de Brandenburgo, a escassos metros do parlamento, perderam a luz para iluminar a solidariedade entre todos e poucos foram os xenófobos que resistiram nas ruas às baixas temperaturas e aos apelos de bom senso e humanidade.

Nem só nas ruas se está a fazer a luta contra as movimentações do PEGIDA. Ontem, no rescaldo das manifestações e contra-manifestações, o jornal “Bild” divulgou uma petição pública que já conta com as assinaturas de 80 personalidades famosas do país, desde o antigo chanceler Helmut Schmidt ao futebolista na reforma Oliver Bierhoff, para dizer “Não ao PEGIDA!”.

Depois de vários apelos da chanceler Angela Merkel no último mês do ano, que foram largamente ignorados pelos apoiantes do grupo anti-islamismo, a actual chefe do executivo alemão abriu o ano com um discurso centrado não em pedidos mas em ataques. Os líderes do PEGIDA “têm preconceito, frieza e ódio dentro dos seus corações”, disse Merkel; o governo está a reprimir politicamente os cidadãos, respondeu Kathrin Oertel, uma das organizadoras das marchas de segunda-feira. “Como é que se deve reagir quando somos chamados racistas ou nazis por todo o espectro político e mediático?”, questionou citada pela BBC durante o último protesto em Dresden contra o que diz ser a perigosa islamização da Europa.

No último mês, o PEGIDA tem-se tentado distanciar da extrema-direita, dizendo no Facebook que é contra “os que pregam o ódio, independentemente da sua religião” e contra “o radicalismo, seja ou não política ou religiosamente motivado”. As publicações nas redes sociais e a proibição de símbolos e slogans neonazis nos protestos, contudo, não servem para apagar as marcas indeléveis de apoio de conhecidos grupos fascistas alemães e de frases xenófobas e anti-islâmicas em todas as manifestações que organiza semanalmente há três meses.

“Eu também sou contra qualquer forma de extremismo”, declarou ontem à N-TV Cem Ozdemir, vice-presidente do partido Os Verdes, que é filho de imigrantes turcos. “Mas a intolerância não pode ser combatida com intolerância. A linha não está entre cristãos e muçulmanos. Está entre os que são intolerantes e os outros, que são a maioria.”

Foto: Fabrizio Bensch - Reuters

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