Malu
Ribeiro* - Envolverde
É
fato que o Brasil tem a maior reserva de água doce do mundo. Cerca de 12% da
água doce superficial do planeta corre em nossos rios e bacias. Temos ainda
grandes reservas de águas subterrâneas e chuvas abundantes em 90% do nosso
território. Entretanto, em meio a maior crise hídrica da história do país, fica
a pergunta: por que falta água no sudeste do Brasil?
O
primeiro ponto é entendermos como esse cenário de abundância serviu para a
construção do mito de que a água seria um recurso inesgotável. Ao longo da
história do país, que é ligada a exploração dos recursos naturais, fomos
aprendendo com os erros e com alguns esforços voltados a recuperar o que
perdemos. O mais conhecido deles fica no Rio de Janeiro e data de 1861, quando
o Imperador D. Pedro II ordenou um plano de reflorestamento da Floresta da
Tijuca como solução ao enfrentamento de uma grave seca.
As
florestas são grandes produtoras de água e protetoras de todo o ciclo
hidrológico, por isso, fundamentais para a garantia de água, em quantidade e
qualidade. A vegetação, sobretudo as matas ciliares, aquelas que protegem as
margens de rios e mananciais, evita a perda de umidade do solo, a erosão e o
assoreamento, abastece as nascentes e ainda mantém a umidade do ar, lançando
vapor na atmosfera e favorecendo o retorno da água em forma de chuva.
Para
avaliar a situação da vegetação nas principais bacias hidrográficas da região
Sudeste, como a do Rio Guandu, a SOS Mata Atlântica realizou um estudo que
apontou a relação direta entre o desmatamento, a oferta de água e a presença de
remanescentes florestais nas áreas de drenagem dos sistemas de abastecimento.
Das
bacias analisadas, a do Rio Guandu, principal fonte de água para o Estado do
Rio de Janeiro, é a que se encontra em melhor situação, apesar de ainda estar
longe do ideal. Dos 4.723 km2 que a compõe, 62,2% (2.939 km2) contém cobertura
florestal natural acima de 1 hectare. Os bons índices devem-se às áreas
protegidas e unidades de conservação públicas e privadas existentes nessa
região, já que quase 70% do que está preservado está nessas áreas.
Tão
importante quanto conservar e recuperar esses recursos naturais é evitar a pior
forma de desperdício de água, a poluição. O potencial de contribuição dos
nossos rios ao abastecimento público, incluindo aqueles que cortam as cidades,
é tamanho que podemos afirmar que não haveria crise se houvesse mais cuidado
com essas águas e boa gestão. No entanto, continuamos a tratar nossos rios como
esgotos a céu aberto, a exemplo do que acontece com importantes rios do Rio de
Janeiro, como o Carioca, um dos mais poluídos, mas que já foi fonte de água
potável para a cidade.
Cito
aqui outro estudo da SOS Mata Atlântica, divulgado há poucos dias, e que
registrou, no intervalo de apenas um ano, um aumento da poluição e uma piora na
qualidade da água dos rios pesquisados no Rio de Janeiro. Dos 15 pontos em que
a coleta foi realizada, somente 5 apresentaram qualidade regular e os outros 10
pontos registraram qualidade ruim. Em 2014, 9 pontos tinham qualidade regular e
6 ruim. Nenhum dos pontos analisados apresentou qualidade boa ou ótima. Esses
indicadores revelam a precária condição ambiental dos rios urbanos monitorados
e reforçam a necessidade de investimentos em saneamento básico.
Para
enfrentar a crise da água e melhorar a qualidade de vida é essencial recuperar
nossas florestas e rios com investimentos e avanços nos índices de tratamento
de esgoto, gestão dos resíduos sólidos, fiscalização e recuperação das áreas de
preservação permanente urbanas e rurais. O desafio é urgente e de todos. (SOS
Mata Atlântica/ #Envolverde)
Na
foto: Rio Piracicaba Abaixo do Nível. Foto: Paulo Pinto/ Fotos Públicas
(12/02/2014)
* Malu
Ribeiro é coordenadora da Rede das Águas da Fundação SOS Mata Atlântica.
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Publicado originalmente em O
Globo e retirado do site SOS
Mata Atlântica.
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