Indignação
e revolta. Pode-se resumir assim a reacção das empresas que ficaram de fora das
obras de remodelação do aeroporto da Praia. Tudo porque as firmas que venceram
os concursos internacionais apresentaram orçamentos muito superiores. E mesmo
assim ficaram com a adjudicação dos trabalhos. E Cabo Verde vai pagar mais
426.467.536$00.
“Esta
obra é vida ou morte de uma empresa”, disse ao Expresso das Ilhas um
administrador da empresa cabo-verdiana SGL. A SGL concorreu, em consórcio, com
a empresa portuguesa MONTE ADRIANO, para as obras de requalificação do
aeroporto internacional Nelson Mandela. Ficou em primeiro lugar no concurso
público internacional, mas acabou por perder os trabalhos de renovação do
terminal de passageiros para a construtora italiana COSTRUZIONI GIUSEPPE
MALTAURO, assim como perdeu as obras de ampliação da placa de estacionamento
para o empreiteiro português ARMANDO CUNHA. A justificação do Banco Africano de
Desenvolvimento (BAD) para estas exclusões foi: “não conformidade comercial”.
“Não
sabemos o que isso significa, não nos deram qualquer justificação”, conta ao
Expresso das Ilhas a mesma fonte. Esta eliminação tem, para já, duas
consequências: a entrada de uma providência cautelar no Tribunal da Praia e o
despedimento, a breve prazo, de trabalhadores por parte da SGL.
“É
um processo que deixa muitas dúvidas”, refere o mesmo administrador da SGL, “o
governo, se defendesse verdadeiramente o Estado de Cabo Verde, lançaria um novo
concurso e não adjudicaria com um prejuízo de 400 mil contos”.
Em
Março de 2014 foi anunciado o concurso internacional para a construção do
Projecto de Extensão e Modernização do Aeroporto Internacional da Praia,
financiado pelo BAD.
Em
Julho do mesmo ano realizou-se o acto público de abertura das propostas, tendo
sido admitidos no concurso, por preencherem todos requisitos técnicos, onze
concorrentes. O concurso não tinha preferências nacionais nem regionais.
Seis
meses depois, as empresas concorrentes foram informadas de que o Lote 1
(terminal de passageiros e área de processamento de cargas) tinha sido
adjudicado à empresa COSTRUZIONI GIUSEPPE MALTAURO e o Lote 2 (placa de
estacionamento dos aviões) à empresa ARMANDO CUNHA. Esta decisão foi contestada
por vários concorrentes, uma vez que estas empresas julgadas agora vencedoras
tinham apresentado as propostas financeiras mais elevadas e o critério de
adjudicação expressamente consagrado nos termos de referência do concurso era,
dizem os empresários, o do preço mais baixo.
A
empresa COSTRUZIONI GIUSEPPE MALTAURO, à qual foi adjudicado o Lote 1, ficou em
sétimo lugar na classificação das propostas financeiras com um preço muito
superior (+354.190.072 CVE) ao do consórcio formado pelas empresas
MONTEADRIANO/EDIFER/SGL que apresentou o melhor preço e por conseguinte ficou
em primeiro lugar no concurso.
O
preço apresentado pela empresa vencedora foi 1. 974. 852. 182,00 CVE, mais 21
por cento do que o apresentado pelo consórcio que avançou o melhor preço e
ganhou o concurso, com o valor de 1. 620. 662. 120, 17 CVE. Os outros dois
concorrentes que apresentaram propostas na casa do milhão e seiscentos mil
contos foram o consórcio luso-cabo-verdiano SOMAGUE/CVC/TECNOVIA (1. 666. 285.
824,41 CVE) e a empresa portuguesa ALEXANDRE BARBOSA BORGES (1. 688. 224.
617,00 CVE). As empresas CONSTRUTORA SAN JOSE, CONDURIL ENGENHARIA e o
CONSÓRCIO ACCIONA INFRASTRUCTURAS/ARMANDO CUNHA CV também apresentaram
propostas mais baixas do que a da MALTAURO.
Por
outro lado, o Lote 2 foi adjudicado à empresa ARMANDO CUNHA (190. 500. 000,00
CVE), que ficou em terceiro lugar no concurso referente ao Lote 2, com mais
72.277.464CVE, cerca de mais 60 por cento, do que o concorrente
SOMAGUE/CVC/TECNOVIA, que apresentou o melhor preço (118. 864. 771,23 CVE),
tendo assim ficado em primeiro lugar no concurso.
Segundo
apurou o Expresso das Ilhas, e com excepção da primeira sessão de abertura dos
processos, todo o resto do sistema de selecção foi mantido no maior secretismo,
não tendo, até à presente data, os concorrentes tido acesso aos fundamentos
usados pelo júri do concurso para adjudicar as obras às empresas que
apresentaram preços mais elevados.
“Todas
as regras nacionais sobre a transparência dos concursos públicos foram omitidas
neste concurso, com a agravante da Comissão de Resolução de Conflitos da ARAP,
entidade criada precisamente para fiscalizar e garantir o cumprimento das
regras constitucionais e legais que devem reger as aquisições públicas, ter
rejeitado liminarmente os recursos apresentados pelas empresas concorrentes
invocando que as regras do BAD prevalecem sobre a lei e Constituição de Cabo
Verde”, explica o administrador da SGL.
Estas
obras vão ser financiadas pelo BAD (e não doadas), o que significa que é o
Estado de Cabo Verde quem pagará este empréstimo feito ao Banco Africano de
Desenvolvimento. “Será pois o dinheiro dos contribuintes cabo-verdianos a pagar
estas obras a serem realizadas em
Cabo Verde , pelo que não se compreende como possam não estar
sujeitas à Constituição e às leis de Cabo Verde. Esta situação representa mais
uma mancha grave na gestão dos dinheiros públicos”, sublinha a mesma fonte.
A
empresa MALTAURO esteve também envolvida na construção do anel rodoviário do
Fogo, obra onde acabou por pedir uma indemnização ao governo cabo-verdiano por
causa dos constrangimentos que encontrou e dos trabalhos adicionais que teve de
fazer. Na altura, em 2012, fixou o montante desse ressarcimento em
1.668.282.483,59 CVE. Em 2013, no Boletim Oficial de 20 de Março, o Estado
aprovou o pagamento de uma compensação no valor de um milhão e dez mil contos.
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