sexta-feira, 12 de junho de 2015

Angola. MORATÓRIA PARA PAGAR DÍVIDA À CHINA



Kumuênho da Rosa, em Pequim – Jornal de Angola

Angola solicitou em Pequim uma moratória de pelo menos dois anos para o pagamento da dívida à China.

A situação financeira resultante da queda significativa do preço do petróleo no mercado internacional e a consequente quebra nas receitas do Estado foram os principais motivos evocados pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, durante as conversações com o seu homólogo chinês, Xi Jinping. 

Não se conhece a resposta formal da parte chinesa a essa solicitação da parte angolana, mas ficou implícita com a assinatura de novos acordos que alargam o espectro da cooperação económica e o anúncio pelo próprio Presidente Xi Jinping da “total disponibilidade” da China para ajudar Angola a “superar as dificuldades financeiras provisórias”. 

O Presidente angolano, que cumpre na China uma visita de Estado a convite do seu homólogo chinês, disse que Angola enfrenta um “problema sério”, que resulta do facto de a economia estar dependente quase exclusivamente do petróleo bruto, produto que representa cerca de 90 por cento do total das exportações. 

José Eduardo dos Santos disse esperar a ajuda chinesa, no quadro da parceria estratégica entre os dois países, e que sejam criados acordos que ajudem a acelerar a aplicação do programa de diversificação da economia. “Estamos confiantes em que daí surgem novas formas de reforçar e consolidar a nossa cooperação, com vantagens recíprocas”. 

A diferença de níveis de desenvolvimento, referiu José Eduardo dos Santos, permite aos dois países saberem o que cada um necessita e pode beneficiar do que o outro país tem para oferecer. 

O Chefe de Estado angolano manifestou desejo de continuar a estreitar os laços de amizade e solidariedade entre os dois países, e destacou a “confiança e o respeito mútuo” como pilares da parceria estratégica. “Os nossos países têm imensas potencialidades para valorizar e podem ir mais longe, estabelecendo programas bilaterais de cooperação e definindo correctamente quais as prioridades”, defendeu. 

José Eduardo dos Santos reafirmou o desejo de contar com a China na realização de objectivos em vários domínios e considerou indispensável para a obtenção de bons resultados na economia e na cooperação bilateral a aplicação de uma política macroeconómica que garanta estabilidade e crescimento económico. 

No plano internacional, o Chefe de Estado destacou o entendimento político entre Angola e a China, que tem conduzido à adopção de posições coincidentes em relação aos grandes temas da actualidade mundial, como a crise económico-financeira, o terrorismo transnacional, os vários conflitos existentes, a imigração ilegal e as grandes endemias. 

“Espero que essa concertação se mantenha porque é urgente que todos nos esforcemos por criar um mundo de paz, em que todos os países se sintam seguros e livres de adoptarem as opções políticas, económicas e culturais do interesse dos seus povos”, defendeu o Presidente angolano. José Eduardo dos Santos também agradeceu o apoio que a China tem dado a Angola na Comissão para os Direitos Humanos das Nações Unidas e manifestou o desejo de prosseguir com a concertação de acções no quadro do Conselho de Segurança. 

O Presidente angolano, que é o líder em exercício da Conferência Internacional da Região dos Grandes Lagos, elogiou o papel desempenhado pela China no continente africano, apoiando processos de paz, integrando forças de manutenção de paz das Nações Unidas e promovendo uma cooperação económica sem condicionalismos políticos unilaterais.

Momento decisivo

Num encontro com o primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, o Presidente José Eduardo dos Santos voltou a falar de quão importante foi a China depois de terminada a guerra em Angola e da desilusão que foi a não realização, na época, de uma conferência internacional de doadores. 

“Depois de conquistada a paz em 2002 e falhada a prometida conferência de doadores a favor da reconstrução de Angola, a parceria com a China permitiu-nos recuperar infra-estruturas básicas, como estradas, reabrindo as vias para a circulação de pessoas e bens”, recordou. 

O Chefe de Estado admitiu, no entanto, que ainda não foi possível superar a dependência do petróleo, que serviu como moeda de troca para o financiamento da reconstrução e a criação de condições para a diversificação da economia.

Experiências de Tianjin

O Presidente da República, José Eduardo dos Santos, considerou a cidade de Tianjin, um bom caso de estudo em matéria de planeamento urbano, formação e qualificação de recursos humanos e gestão administrativa. 

Num encontro, ontem, com o governador de Tianjin, Huang Xinguo, no Palácio Municipal da cidade, o Chefe de Estado angolano não escondeu um interesse particular no modelo de gestão administrativa, que tem tido um contributo valioso para a estabilidade do país e a robustez do crescimento da economia chinesa.

“Constitui para nós uma experiência a ter em conta o vosso modelo que permite aplicar a maior parte das receitas municipais na investigação, na inovação tecnológica, na educação, na saúde, na cultura, nos transportes e nas telecomunicações”, assinalou. 

Sobre a experiência de Tianjin em matéria de formação de quadros e o modelo seguido pelas autoridades locais para terem matéria humana bastante qualificada e satisfazer a procura, o Presidente José Eduardo dos Santos foi peremptório: “interessa a Angola e queremos aproveitar.” 

Em Tianjin, segundo o governador da cidade, a formação profissional está entre as melhores de toda a China. Huang Xinguo referiu que nos últimos cinco anos, fruto de um trabalho conjunto, do governo municipal com institutos e academias, foi desenvolvido um modelo de reforma da educação que tem resultado no fornecimento de quadros com qualificação acima da média ao mercado de trabalho. 

“O modelo é simples: os nossos professores têm duas qualidades, uma para leccionar as disciplinas básicas e outra para ensinar a técnica. Os nossos alunos têm duas licenciaturas. Uma de graduação e outra de técnica”, disse o governador de Tianjin, visivelmente orgulhoso com o prestígio nacional e internacional que a reforma tem dado à sua cidade.

O Presidente José Eduardo dos Santos referiu que interessa aprender com Tianjin, porque existe da parte de Angola “plena consciência de que todos os grandes empreendimentos em que estamos envolvidos necessitam de mão-de-obra qualificada para garantir de forma autónoma a sua continuidade e desenvolvimento sustentável depois de concluídos”. Ainda no que se refere à qualificação dos quadros angolanos, o Presidente José Eduardo dos Santos insistiu sobre a importância de consolidar a cooperação com a China, em áreas como a ciência, a tecnologia e a inovação, sectores em que o gigante asiático tem um papel relevante a nível internacional. 

O governador Huang Xinguo partilhou com o Chefe de Estado angolano um pouco da experiência de Tianjin em relação à forma como a cidade criou um modelo desenvolvido de industrialização e inovação tecnológica, fruto do qual é hoje uma das mais ricas da China. 

O modelo passa por criar de início as infra-estruturas na área de desenvolvimento, como rede de água, electricidade, gás e vias para circulação. Depois de garantir todos esses serviços, disse o governador, os passos seguintes são: aprimorar o sistema jurídico, garantir que se tenha uma administração eficaz e por fim promover a realização de estudos sobre formas cada vez mais atractivas de captar mais investimentos. 

“Em Tianjin desenvolvemos a política de duas isenções e três reduções, que quer dizer que quando uma empresa estrangeira entra no nosso mercado, nos primeiros dois anos goza de isenção de impostos e nos três anos seguintes paga apenas metade dos impostos”, informou. 

O Presidente da República referiu que iniciativas como a visita a Tianjin resultam do reconhecimento de que, numa altura em que Angola trilha os caminhos do progresso económico e social, é necessário conhecer melhor a experiência de reconstrução, desenvolvimento e modernização da China, tirando o máximo proveito da parceria estratégica que os dois países procuram consolidar.

Cidade da Ciência

Acompanhado da Primeira-Dama, de membros do Governo e de altos responsáveis do seu gabinete, o Presidente José Eduardo dos Santos viajou para Tianjin num comboio de alta velocidade. Da estação central ferroviária de Pequim à metrópole de Tianjin, com os seus mais de 15 milhões de habitantes, foram uns imperceptíveis 30 minutos.

À chegada em Tianjin, antes do encontro com o governador da cidade e membros da administração da cidade, a comitiva presidencial teve como primeira passagem o Museu de Exposições da Cidade, um edifício imponente onde é possível encontrar protótipos das maiores e mais belas obras de construção civil de Tianjin. Ali a comitiva presidencial pôde vislumbrar a gigantesca réplica da cidade, enquanto recebia explicações sobre o traçado, a evolução histórica, os equipamentos sociais, sistema de mobilidade e as soluções tecnológicas que garantem o relacionamento harmonioso da cidade com o Ambiente. 

Já na parte final da visita, a comitiva presidencial visitou o edifício da administração da Área de Alta Tecnologia, uma entre centenas de áreas económicas de desenvolvimento criadas em Tianjin, que tem como um dos seus pilares a alta tecnologia, com milhares de fábricas e mais de duas centenas de institutos de pesquisa e desenvolvimento. 

Tianjin é uma das quatro cidades-município da China e fica a 120 quilómetros do centro de Pequim. As duas cidades estão ligadas por estradas e linhas ferroviárias de alta velocidade. É também uma cidade portuária e, segundo estimativas, o volume de carga e descarga do Porto Comercial de Tianjin atinge este ano 570 milhões de toneladas, que representam a quarta maior demanda no mundo. 

A cidade dispõe de várias áreas de desenvolvimento industrial e novas zonas francas, recentemente aprovadas pelo Governo central. Nos últimos dez anos, Tianjin manteve uma taxa de crescimento de mais de dez por cento, o que tem valido à cidade um lugar cativo de topo no ranking dos maiores e mais decisivos contribuintes do PIB da China.

Foto: Francisco Bernardo, Pequim

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