domingo, 5 de julho de 2015

O ALARIDO SOBRE SUPOSTO RACISMO NA SELEÇÃO INGLESA DE SUB-20



Alberto Castro*

Na passada semana foi notícia na imprensa britânica e internacional a existência de suposta prática de racismo em uma concentração do selecionado sub-20 da Inglaterra. Na base do sensacionalismo com que a mesma foi noticiada por vários mídias, particularmente internacionais, esteve uma matéria publicada no Daily Mail e assinada por Ben Douglas. Nela foram mostradas, propositadamente, fotos de nítida separação entre atletas brancos e negros nos momentos de refeição, de treinamento na piscina e em exercícios de yoga e rotação.  

Todavia, qualquer jornalista que dispensa o sensacionalismo e com suficientes conhecimentos da língua inglesa que tivesse lido atentamente a peça logo concluiria, a partir do lead, que o objetivo da mesma era o de provocar mais um debate sobre o multiculturalismo e o racismo, temas bem presentes na agenda política e mediática em terras de Sua Majestade. Em momento algum o autor afirmou a existência da prática de racismo ou de exclusão na jovem esquadra inglesa de futebol.

Pelo contrário, segundo Douglas,''não existe claramente racismo em jogo aqui em qualquer das direções mas as imagens destacam um elemento da sociedade britânica que eu, como negro britânico, sei que é muitas vezes ignorado porque nessa era do politicamente correto é considerado tabu.'' O elemento tabu trata-se obviamente da separação dos jovens com base em alinhamento racial.  ''De fato, outras imagens tiradas durante a visita mostram o time treinando, rindo e brincando juntos sem qualquer divisão, confortáveis e felizes em companhia uns dos outros'', esclareceu.

Por um lado, o que na verdade ele pretendeu demonstrar e trazer ao debate foi o óbvio de um fenômeno que não é apenas britânico: várias situações mostram que as pessoas tendem, mesmo que subconscientemente, a dividir-se em grupos por questões de afinidades, experiências e hábitos partilhados e não propriamente movidas por conscientes ou inconscientes motivações racistas. Um exemplo é o da antiga estrela do Manchester United, Ryan Giggs cuja etnicidade, segundo o DM, nunca esteve em causa no clube porque, apesar de pele clara e aparentemente branco, ele é filho de pai negro e sempre se juntava aos colegas negros.

Por outro lado, Douglas,  que também é apresentador de TV e celebridade britânica negra, quis igualmente questionar se no processo multiculturalista de respeitar as diferenças não estarão os britânicos a reforçar, de forma inadvertida e silenciosa, barreiras culturais que separam as suas etnias, relançando assim para o debate a velha discussão em torno de multiculturalismo versus interculturalismo.

Da polêmica se pode concluir que, apesar de inquestionáveis avanços no combate ao racismo e na promoção do multiculturalismo, a Grã-Bretanha tem ainda um  longo caminho a percorrer, passando provavelmente também por mais interculturalismo, para que haja maior interação de diferentes grupos étnicos entre si. Neste sentido, Gareth Southgate, técnico responsável por seleções mais jovens da Inglaterra, que contestou duramente a matéria publicada no DM, sintetizou de forma curta e crítica as limitações do multiculturalismo e das relações raciais na sociedade britânica: ''vejo a sala de imprensa e não a vejo muito multicultural''.

O assunto foi igualmente importante no alertar de responsáveis e agentes, particularmente das áreas sociais, educativas e esportivas, para uma melhor observação e resposta pedagógica à comportamentos que, mesmo não sendo intencionais, possam fomentar, principalmente entre os jovens, atitudes de segregação étnica numa sociedade que se pretende saudavelmente multiculturalista e que enfrenta, nos anos mais recentes, crescentes vagas de ventos populistas carregados de racismos e xenofobias que sopram um pouco por toda a velha Europa.

*Alberto Castro (na foto) é correspondente de Afropress em Londres
 


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