quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Portugal. AZEDUMES DE VERÃO



Inês Cardoso – Jornal de Notícias, opinião

Afinal, parece que é tudo uma questão de azedume, como classifica o vice-presidente e porta-voz do PSD. Marco António Costa queixa-se que a Oposição fica particularmente ácida quando confrontada com as boas notícias na diminuição do desemprego. E o azedume, concorde-se, é um sentimento lixado que tolda o espírito na altura de fazer qualquer análise.

Recorrendo à linguagem de mercearia que tomou conta do tema, confesso que apesar da total inabilidade para a estatística consigo distinguir batatas de laranjas. Não é difícil perceber, pelas várias análises que se foram lendo nos últimos dias, que os números podem ser interpretados de muita maneira, mas nem com o mais dourado otimismo, temperado pelo sol de agosto, se pode ignorar que o emprego continua efetivamente a ser um problema. E não, não foi um lapso e não vou falar de desemprego. O problema está mesmo no emprego. É exatamente porque um condiciona o outro que se pode, na hora de fazer as contas, ser obrigado a pesar laranjas para decidir se a saca de batatas encolheu ou ficou mais cheia.

Há, a nível nacional, mais de 250 mil cidadãos em situação de subemprego - ou seja, que têm um part-time indesejado e não conseguem aceder a um horário completo. Quase idêntico número está em formação profissional ou em estágio. Perto de 500 mil pessoas emigraram durante esta legislatura e estão a trabalhar, mas no estrangeiro. E há ainda que ter em conta o emprego sazonal, precário, que tende a subir em ciclos de crescimento do turismo, como é este ano o caso.

Não é preciso ser brilhante a matemática para perceber que os motivos para celebrar as estatísticas do desemprego são curtos. E que é preciso fazer muito mais pela economia para que a criação de emprego seja real, sustentada e assente em relações contratuais estáveis. E, já agora, confirmada pela evolução dos salários médios praticados.

É certo que a silly season convida a sentimentos descontraídos, sol e mar com fartura, sugestões leves de verão e primeiras páginas embelezadas por biquínis. Discussões e temas sérios são para a rentrée, que ainda por cima este ano nos trará política até mais não. Mas já que há tantos cidadãos desempregados ou em part-times de verão, angustiados pela incerteza do amanhã, que nem sabem se hão de rir ou chorar com este descascar de cebolas, permitam-me o azedume. Em nome deles.

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