Domingos
de Andrade – Jornal de Notícias, opinião
Vai
ser campanha lá e campanha cá. Mas o que cá se passa não conta para nada lá. E
o que lá se passa conta cá. Mal. A coligação PSD/CDS terá sempre a vontade de
trazer o embrulho grego como exemplo do voto irresponsável. E já começou.
Forçar António Costa a discutir a simpatia do PS pelo Syriza. Obrigar António
Costa a corrigir uma e outra vez o tiro de declarações passadas.
Mal.
Para ambas as forças políticas. Porque há na demissão do primeiro-ministro
grego e no pedido de eleições antecipadas aprendizagens a reter.
Alexis
Tsipras disse e fez, em sete meses de poder, tudo e o seu contrário. Venceu,
primeiro, eleições contra a austeridade e uma certa Europa em galopante arrepio
das suas periferias. Bateu o pé. Pediu referendos. Negociou medidas para um terceiro
resgate ainda mais duras do que aquelas que tinha renegado na campanha
eleitoral. Contra o voto dos eleitores gregos. Duas vezes. Perdeu. Mas ganhou.
O
Syriza é hoje um partido a desfazer-se. Sai a ala mais radical. Fica a dos
consensos. E o líder a ganhar poder. Soube, comprova-se nos estudos de opinião,
colocar os interesses do país acima das convicções. A Grécia continua no euro.
Cresceu 0,8% no segundo trimestre, com uma banca sem liquidez e um povo
desesperado. E o garrote das medidas impopulares que garantiram o terceiro
resgate só começará a sentir-se depois do ato eleitoral. Sobra a Oposição.
Esfrangalhada após a surpresa da derrota de janeiro e sem tempo para se
organizar.
Tsipras
vai a eleições para obter um mandato claro. Chama-se a isto sobrevivência. Há
séries políticas bem menos arrojadas a correr nas televisões portuguesas.
Trazer
a Grécia para a campanha arrasta inúmeras tentações. Todas do lado da
coligação. E todas a jogar contra o Partido Socialista. A segurança versus a
mudança. O aluno bem comportado contra os aventureiros. A estabilidade de uma
maioria, como apelou o presidente da República, sobre os desnortes de um
Governo sem apoio parlamentar.
É,
aparentemente, fácil. Para ganhar eleições. Mas apenas uma ilusão. Estaremos em
outubro com um Parlamento desarticulado. Com um país em dificuldades. Sem
oposição, sem Governo e sem líderes. Iguais aos gregos, portanto. Mas, ao
contrário deles, sem um líder com inesperados golpes de asa capazes de recolocarem
o país no caminho da esperança.
*Diretor-executivo
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