João
Galamba – Expresso, opinião
As
promessas da coligação PSD-CDS na área social são simples: combater a realidade
que eles próprios criaram através da privatização generalizada de serviços
públicos, começando pela Segurança Social. Depois do radicalismo ideológico da
presente legislatura, a coligação promete - e garante – voltar a radicalizar.
Depois
de 4 anos a degradar a saúde, a educação e a segurança social públicas, PSD e
CDS usam essa mesma degradação como pretexto para desinvestir (ainda mais) no
público e investir (ainda mais) no privado. Em maior e menor grau, e apesar de
todos os eufemismos (liberdade de escolha, plafonamento, programa de
desenvolvimento social), o que a coligação considera “defender e revigorar o
Estado Social” não é mais do que o desvio de recursos públicos para a saúde
privada, para o ensino privado e cooperativo e, sobretudo, para fundos de
pensões privados.
Uma
maioria que destruiu centenas de milhares de empregos, que cortou salários e
que aumentou a precariedade, uma maioria que retirou o Rendimento Social de
Inserção e o Complemento Solidário para Idosos a quase 200 mil pessoas e que
cortou praticamente todas as prestações sociais de combate à pobreza e
desigualdade, vem agora dizer, sem se rir, que quer apostar no social.
Depois
de terem enchido o país de cantinas sociais, para alimentar as vítimas das suas
políticas, PSD e CDS querem aprofundar o desinvestimento nas prestações
públicas de combate à pobreza, com destaque para o Rendimento Social de
Inserção e o Complemento Solidário para Idosos, apostando tudo no reforço das
transferencias financeiras para as IPSS.
As
IPSS deixam de ser complementares à acção do Estado e parecem substituir, cada
vez mais, o próprio Estado, que se torna progressivamente num mero financiador
de um Estado (privado) paralelo. Esta agenda privatizadora, que, mais do que
reduzir, transforma o papel e a natureza do Estado, implica menor transparência
e escrutínio no uso dos dinheiros públicos e, historicamente, não se tem
traduzido nem em poupanças orçamentais nem em melhorias nos indicadores sociais
nem em maior liberdade ou autonomia para quem recebe apoio sociais.
Mas
onde existe mesmo uma ruptura privatizadora é nas pensões.
Os
partidos que, pela primeira vez, criaram um défice no sistema contributivo -
causado pela queda da receita (destruição de emprego, queda dos salários e o
aumento da precariedade) e pelo aumento da despesa com subsídio de desemprego -
e que degradaram todos os indicadores demográficos (natalidade, emigração), ou
seja, os partidos que objectivamente degradaram a sustentabilidade presente e
futura da Segurança Social, dizem que o sistema é insustentável.
Ao
contrário do PS, a coligação não propõe que se invista no emprego, na
valorização dos salários e no combate à precariedade. Também não procura novas
fontes de financiamento para o sistema. A coligação, pura e simplesmente, não
está interessada em investir nos factores que determinam a sustentabilidade do sistema
de pensões.
Depois
de 4 anos a tentar cortar pensões, sendo sucessivas vezes travado pelo Tribunal
Constitucional, depois de ter enviado um PEC para Bruxelas que inclui um corte
de 600 milhões de euros em pensões - porque, diziam-nos, havia um défice que
tinha de ser coberto, já em 2016 -, a maioria desiste (será?) de tudo isso, dá
um enorme salto em frente (ou para trás) e propõe a privatização parcial do
sistema público de pensões.
A
proposta da coligação é simples: pobres e classe média ficam no sistema público
actual, quem ganha acima de um determinado valor (normalmente um valor
acessível a uma percentagem muito reduzida de portugueses) pode optar por
descontar, acima desse valor, para fundos de pensões privados.
Não
sabemos qual o valor a partir do qual se deixa de descontar. Também não
conhecemos qualquer conta, número ou estudo que fundamente e quantifique a
opção da maioria. Mas sabemos que o resultado desta medida é que a contribuição
dos trabalhadores com salários mais elevados para o financiamento da segurança
social baixa durante quarenta anos, para que, depois desses quarenta anos, a
despesa com pensões também seja mais baixa. Ou seja, esta medida implica
aumentar o défice e a dívida durante quarenta anos, para, prometem-nos, baixar
o défice e a dívida nos anos posteriores. Não sabemos a dimensão exacta desses
défice e dessa dívida, sabemos apenas que eles vão necessariamente existir e
que terão de ser pagos por todos os portugueses.
Quando
a Comissão Europeia apresentou a sua proposta de "leitura
inteligente" das regras orçamentais, Passos Coelho veio logo dizer que
estas não se aplicavam a Portugal e que não havia flexibilidade nenhuma. A
proposta de privatização parcial da segurança social mostra que, afinal, não é
bem assim. Passos Coelho e Paulo Portas querem que os défices e a dívida
causados pela privatização parcial da Segurança Social (que perde receita
durante 40 anos) não sejam tidos em conta no cálculo das metas com que estamos
comprometidos. Passos Coelho e Paulo Portas não querem flexibilidade para criar
emprego, investir e modernizar o país, mas apenas para privatizar a Segurança
Social.
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