Carvalho
da Silva – Jornal de Notícias, opinião
A
força e a amplitude com que se apresentam as dinâmicas sociais e políticas
resultantes da convergência de interesses entre o grande capital financeiro e
uma ideologia neoliberal, colonialista e com expressões fascistas varrem a
Europa e outras regiões do Mundo neste verão de 2015, com expressões
assustadoras.
As
Sociedades de Risco estão a transformar-se em Sociedades do Medo. Em nome do
combate ao terrorismo foram gerados monstros; em nome dos combates aos
"constrangimentos" provocados pelas leis e pelos compromissos
coletivos universais fundadores dos estados democráticos, desenvolvem-se
monstruosidades, nomeadamente ao nível das desigualdades.
As
guerras generalizadas eclodem quando se generaliza a degradação das relações
sociais e do funcionamento das sociedades, quando as injustiças são gritantes:
a faísca que incendeia pode surgir de qualquer pormenor sem o mínimo de
previsibilidade. Alguns velhos medos históricos estão aí: há que tomarmos em
mãos os ensinamentos da vida em democracia e os valores do progresso social e
humano, entretanto conseguidos, para travar o desastre.
Inquietemo-nos
perante o domínio avassalador do grande capital financeiro que aprisiona e
chantageia o exercício da política, que cilindra as condições para os povos e
os países se desenvolverem. Revoltemo-nos com as injustiças e desigualdades,
com as atrocidades e a falta de solidariedade a que são sujeitos muitos milhões
de seres humanos que fogem das guerras ou da miséria absoluta. Tenhamos medo
desta realidade que nos rodeia e, por isso, mobilizemo-nos contra as políticas
que estão na sua origem.
Nós,
portugueses, fazemos parte de um projeto político - a União Europeia -
apresentado como espaço privilegiado da democracia, do desenvolvimento
sustentado na prioridade ao social, ao cultural e às relações solidárias entre
os povos. Os estados e as instâncias de poder europeu supostamente regulavam os
mercados para que o capital não abusasse do seu poder. Entretanto, há muito que
o rumo seguido começou a merecer fortes reparos e denúncias. Com o eclodir da
"crise", e depois com as brutais políticas de austeridade impostas a
alguns países, como à Grécia e a Portugal, as contradições começaram a vir ao
de cima em força. Mas ,
foi nos últimos meses que desabou sobre nós uma avalancha de problemas, de
negações daquele projeto que agora nos amedronta.
Está
à vista de todos que a crise grega ou a portuguesa são apenas expressões limite
da crise de uma União Europeia que nega a democracia. A determinação do povo
grego e a ação do seu governo - apesar das contradições em que se move -
puseram a nu, em poucos meses, toda a miséria política e a falta de princípios
democráticos daqueles que nos estão desgovernando.
Como
se poderão reconstruir bases de confiança e compromisso entre os povos, quando
foi inculcado, nos do Norte, a ideia mentirosa de que são eles que estão a
pagar os vícios dos do Sul, e nos do Sul se gerou uma certa
"aceitação" de condições de colonizados?
Como
podem os povos assumir as suas responsabilidades se não lhes permitem escolhas
democráticas e se lhes impõem "programas de ajuda" que se
consubstanciam em mais dívidas, em menos emprego, mais pobreza e desproteção
social?
Assusta
vermos que os processos de privatizações na Grécia como em Portugal são meros
saques que os "credores" nos fazem depois de nos submeterem.
Como
o processo grego comprova, os "devedores" estão muito condicionados
pelo medo resultante de uma imensidão de chantagens a que ficaram sujeitos mas,
talvez pela primeira vez, também foram visíveis os medos dos "credores".
Esta União Europeia desagregar-se-á, com prejuízo para todos, se teimar nos
objetivos e práticas que vêm prosseguindo com os espartilhos da "moeda
única" e outros instituídos sem regras democráticas.
O
cenário em que nos encontramos é de certa forma assustador, também porque vamos
começar a viver as tensões resultantes de novos rumos em gestação.
O
país precisa de um Governo sério, credível, mobilizador, a favor do povo e
ofensivo no quadro da União Europeia.
O
"arco da governação" é mais que nunca sinónimo de arco da subjugação.
Libertemo-nos!
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