Reginaldo
Silva – Rede Angola, opinião
De
todos os protagonistas quantos passaram pelo mês de Agosto, que acaba de nos
deixar, nascendo nele ou morrendo com ele, o Presidente da República, José
Eduardo dos Santos (JES), é, obviamente, a maior referência política, por tudo
quanto já é consabido e por tudo mais quanto ainda não sabemos muito bem como é
que se vai passar em relação ao seu futuro.
O
que sabemos é que o futuro deste país continua a passar pela sua incontornável
figura, numa altura em que todos aguardam que ele diga mais alguma coisa.
Também
sabemos que ainda ninguém sabe como é que ele quer fazer a transição, depois de
pela primeira vez, neste ano do seu 73º aniversário natalício, ter admitido
esta possibilidade com alguma objectividade, bem diferente do laconismo e do
tom ambíguo a que já nos habituou, sempre que o assunto vem a baila.
Antes
desta ocasião, a primeira vez que JES falou do “tabú” foi no ano de 2000 e em
Cabo-Verde, se a memória não nos falha, quando ele próprio afirmou que o
próximo candidato do MPLA às eleições presidenciais não se chamaria mais José
Eduardo dos Santos.
Na
época Jonas Savimbi, o outro protagonista do mês de Agosto, ainda estava vivo,
mas pelos vistos sua carreira já estava em contagem decrescente, o que se veio
a confirmar de forma trágica dois anos mais tarde.
Salvaguardando
as devidas distâncias, importâncias e especificidades e contextos, quando
olhamos para a trajectória de José Eduardo dos Santos, há uma referência
literária que faz questão de nos assaltar na hora da reflexão sobre a sua
figura, que é “O General no seu Labirinto”, título de um dos livros mais
conhecidos do mundialmente famoso colombiano, que atende pelo nome de Gabriel
García Marquez.
O
“General no seu Labirinto” narra os últimos dias do herói latino-americano
Simon Bolívar (1783-1830) depois de todas glórias militares e sucessos
políticos.
É
um final pouco feliz que acontece num contexto de muitas dificuldades políticas
e debilidades físicas, devido a doença que consumia o General e que ele se
recusava tratar com o recurso à medicina convencional.
Bolívar
preferiu colocar-se nas mãos de outras sabedorias mais ancestrais, mas pelos
vistos muito pouco eficazes para o libertarem da maleita pulmonar, que acabou
por matá-lo de tuberculose aos 47 anos de idade.
Nesta
tentativa, algo temerária, de aproximarmos duas figuras tão distanciadas pela
história e pela geografia, a imagem do labirinto é aquela que mais nos convoca
e que, pelos vistos, mais parece dizer respeito aos dois Generais, embora por
razões diametralmente opostas.
JES
na condição de Comandante em Chefe, ontem das FAPLA e hoje das FAA, também
ostenta esta patente, como manda a praxe militar.
O
Presidente angolano chega aos 73 anos de idade, após 34 anos de poder, com
todas as medalhas ao peito que havia para ganhar em todas as frentes onde
confrontou os seus inimigos figadais de ontem e adversários de hoje.
Foram
combates travados quer com as armas na mão, quer com recurso às urnas
eleitorais, embora em relação a estas últimas, ainda não tenha conseguido
convencer em definitivo o país que não vota nele ou que se abstém, sobre a sua
inquestionável superioridade democrática.
As
dúvidas adensaram-se particularmente depois dele ter “evitado” as eleições
presidências que deviam ter acontecido em 2009, conforme rezava o calendário
oficial, que acabou por ser atirado para as urtigas do esquecimento, para dar
lugar a um polémico modelo atípico que é contestado até hoje.
Como
sabemos, não é tão pouca gente que pensa assim ou está convencida que em
matéria de resultados eleitorais, ainda há muito por esclarecer, mesmo
ficando-nos apenas pelos dados oficiais, isto é da população registada.
Ao
fim de todos estes anos e para além de outros desafios conjunturais, o
principal labirinto em que se encontra JES é o da sua própria sucessão.
Não
pensar nisto nesta altura do campeonato só mesmo porque quem duvida desta
impossibilidade não pode prová-lo.
É
evidente a sua dificuldade em encontrar alguém que o vá substituir, após a sua
possível reforma, mas inevitável desaparecimento físico que irá ocorrer mais
tarde ou mais cedo.
Alguém
que possa dar-lhe as garantias necessárias de que não iremos ver em Angola
repetirem-se algumas cenas africanas que podem estar a tirar-lhe o sono e com
alguma razão, por mais que queiramos acreditar que o nosso país é diferente ou
é um caso único em matéria de estabilidade.
A
este respeito já o escrevemos numa outra ocasião, JES após ter ganho todas as
batalhas em que se envolveu, arrisca-se efectivamente a perder a última, que é
a de encontrar um sucessor ideal, no contexto concreto de Angola.
Foi
Barack Obama quem o disse que quando um líder acha que não tem um sucessor à
altura é porque foi ele que falhou.
Nesta
altura, e depois de alguma relutância, já não são poucas as vozes que começam a
admitir, ainda que timidamente, a possibilidade de estar na forja uma “sucessão
consanguínea”, que pode ser aquela que mais se aproxima da ideal, por razões
óbvias.
JES
pode estar a fazer já as suas contas de tempo de vida política útil tendo agora
como paradigma o seu homólogo zimbabwano, muito mais velho que ele, embora
nesta altura do campeonato as diferenças quanto aos riscos de vida já não sejam
tão significativas assim para nos tranquilizar.
Contrariamente
ao que aconteceu com Simon Bolívar, José Eduardo dos Santos está no labirinto
mas tem a situação política interna completamente controlada e a seu favor,
embora por vezes se percebam alguns sinais algo contraditórios com todo este
domínio, que para já não nos merece alguma dúvida mais objectiva.
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