quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Portugal. AMANHÃ HÁ CIRCO. HOJE NÃO, O PALHAÇO VEM DE ITÁLIA



No Expresso nada de novo. Só porque é quase “tradição” aqui no PG fornecemos mais um Expresso Curto. Pedro Candeias serve. Quem não serve é o PR que está pela Itália e lá devia ficar a fazer companhia à Madona, de Botticelli. A galeria onde mora Madona é de raízes democráticas, sabemos que Cavaco tem aversão a isso, mas se ficar quietinho e caladinho, lá na galeria, até pode ser que consintam a sua presença esfingica. Depois, sempre que quiséssemos ver um mamarracho antidemocrático e uma coisa bela só tínhamos de ir a Florença, à Galleria degli Uffizi. Claro que o belo está em Madona.

Bom dia e bom resto de semana. Só por ver a cerimónia bacoca com Cavaco a dar posse ao seu governo, com Passos e Portas, juntamente com os seus ministros amestrados, vai ser um grande e hilariante espetáculo. Uma grande palhaçada. Melhor que ir ao circo, onde o palhaço-mor é um ser entediante, seráfico, que tudo faz para que Portugal regresse ao passado salazarista com picos de modernidade para papalvos enganar. Um circo privado, de muitas décadas atrás, onde os ministros e restantes do governo são os palhaços trapalhões, desengraçados e (alguns) até desonestos. Quer dizer: amanhã há circo, hoje não.

Siga para bingo, aliás, para o Expresso Curto, com temas variados. Alguns com interesse.

Redação PG

Bom dia, este é o seu Expresso Curto 

Pedro Candeias – Expresso

Parlamento: Fechados para obras, pedimos desculpa pelo incómodo

A política é um ponto de vista e quem disser o contrário está a ver mal. É um bocadinho como no futebol, sobretudo, o nossso futebol. Pegue em dois lances iguais e ponha-se dos dois lados da barricada: quando é favor do nosso clube, é claro que é penálti, que só pode ser penálti, de certezinha absoluta que é penálti, e que quem não a vê é porque é cego ou não quer ver. E, quando a falta é contra, está mais do que visto que não é penálti, que nunca na vida pode ser penálti, de certezinha absoluta que não é penálti, e que quem a vê é porque anda a ver coisas a mais.

Ora, vem isto a propósito da palavra 'tradição', que tem sido jogada de um lado para o outro desde 4 de outubro, conforme o efeito que se espera obter dela quando usada num argumento. Lembra-se do que disse a direita sobre a possibilidade do PS/BE/PCP poderem formar Governo? Era coisa pouco tradicional. Lembra-se do que disse a direita sobre a eleição do Presidente da AR? Coisa pouco tradicional. E sabem o que fez agora o PS? Apelou à "tradição parlamentar" para recusar plenários antes da discussão do programa de Governo. A tradição já não é o que era; a tradição é o que se quer que ela seja.

Mas, adiante, há que olhar para a frente. O Filipe Santos Costa, no Expresso Diário, pegou no calendário e concluiu que à conta disto os deputados estão praticamente de férias até Dezembro. Vamos por partes, plagiando o roteiro do Filipe: o Governo da coligação toma posse nesta sexta-feira e no dia 10 apresenta um programa que será chumbado pela maioria parlamentar do PS, BE e PCP que, por sua vez, divulgará, nesse dia, os termos do acordo desta... troika.

Isto obriga a um reset e que o Presidente de República refaça o caminho das pedras: ouvir partidos, indigitar um PM, dar posse a um novo Governo que apresentará um programa no Parlamento. Como isto demora tempo, é fazer as contas, dizia o outro, e concluir que só lá para finais do próximo mês é que os 230 homens e mulheres eleitos voltarão ao hemiciclo. Se correr bem, claro.

O que fazer até lá? Fotografar cadeiras vazias, como Duarte Marques, ou aproveitar o livre trânsito, a prioridade na reserva de passagens aéreas e o passaporte diplomático, à boleia do Observador que recuperou aqui algumas das regalias dos deputados.

OUTRAS NOTÍCIAS

Luaty Beirão já não está em greve de fome, mas continuará detido e agora sabemos porquê: porque ele estaria em conluio com os outros 14 ativistas angolanos presos para planear um golpe de estado através queimadas de pneus e outros "atos de arruaças por protestos e manifestações planeadas". Estas e outras informações estão no Despacho de Acusação do Tribunal Provincial de Luanda a que o Expresso teve acesso e nele cabem pormenores curiosos. Como estes: Luaty Beirão seria o Procurador Geral da República neste governo de "Salvação Nacional"; a Rafael Marques, jornalista e ativista contra o regime de José Eduardo dos Santos, caberia a pasta do Ministério Público. A este respeito, Marques escreveu um texto de opinião no nosso jornal, no qual denuncia práticas de tortura e repressão - leia-o, aqui.

A cruzada de José Sócrates contra o Correio da Manhã está a ser feita ao caracter, letrinha a letrinha. Escreve o Público que os advogados do ex-Primeiro Ministro queriam obrigar o jornal a pagar €350 mil por cada notícia publicada sobre o processo que está em segredo de justiça. A juíza aceitou a providência cautelar da Defesa de Sócrates e o CM já fez saber que acata a decisão judicial, à qual apelida de mordaça fora da lei; o Sindicato dos Jornalistas diz que se abriu um grave precedente.

No Jornal I, calcula-se que cerca de um milhão de portugueses tenham saído do país em dez anos. Na mesma linha, o Diário de Notícias socorre-se do Relatório da Emigração para sublinhar que, só em 2014, 110 mil homens e mulheres deixaram Portugal, um país que é hoje o que era nos anos 60 e 70 - uma nação de emigrantes. Porquê? O DN oferece uma das explicações na primeira página de hoje: o sobre-endividamento existe, não porque andemos a viver acima das nossas possibilidades mas porque os salários são baixos e não chegam para pagar contas. Da água. Da luz. E do gás.

O Jornal de Notícias traz na manchete uma fraude que envolve o NetEmprego, o portal do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), 777 mil pessoas, e um grupo de mafiosos. O esquema é este: os alegados criminosos simulam ofertas de trabalho em troca de comissões a quem aceite que se use a sua conta bancária para transferências ilegais. Tudo resumido num título: "Desempregados usados para lavar dinheiro"

Hoje, o Diário Económico faz 26 anos e na manchete estão 64 (!) rostos que nos contam o que andavam eles a fazer quando tinham 26 anos - Maria de Belém, Marisa Matias, Sampaio da Nóvoa, Marcelo Rebelo de Sousa, Paulo Rangel, Rui Rio, António Vitorino, Marques Mendes, Eduardo Catroga, Alberto João Jardim, por aí fora.

E, de fora, chega-nos um documento duro e cru de uma realidade que julgávamos já não existir. A União Africana publicou um relatório sobre o que aconteceu nos 22 meses de guerra civil no Sudão do Sul e são 315 páginas com histórias e pormenores perturbantes e desconcertantes, baseados em testemunhos na primeira pessoa e testemunhas oculares. A palavra "violar" é mencionada 128 vezes, uma delas na mesma frase em que se conta um ato de canibalismo forçado.

FRASES

"Seria um desastre ter um governo de gestão" Fernando Medina, presidente da CML , à TVI

"Portugal e Cuba? Em comum só têm as praias ótimas" Fernando 'aguenta-aguenta' Ulrich, presidente do BPI, na apresentação dos resultados trimestrais do banco

"Aquilo que havia a dizer sobre esse assunto já disse na intervenção que eu produzi que foi muito clara e não estou arrependido nem de uma única linha de tudo aquilo que eu disse" Cavaco Silva, num momento "nunca me engano e raramente tenho dúvidas", sobre odiscurso da nomeação do governo

"Se encontrarem um democrata dispoto a cortar no orçamento, digam-me, que eu dou-lhe um beijo quente" Jeb 'pinga-amor' Bush, no debate de republicanos que foi um fartote: falou-se de tequilha e ofereceu-se erva e questionou-se se Donald Trump não seria um vilão da BD, Veja aqui o best of dos disparates

O QUE ANDO A LER

O primeiro parágrafo tem 67 linhas e nenhum ponto final. Acontece que o primeiro parágrafo é também o único parágrafo do primeiro capítulo. E este não é um defeito mas um estilo que se repete nos outros capítulos, para serem lidos de uma vez só, de um trago, sem pausas porque a escrita não permite que descansemos. A "Lavoura arcaica", do brasileiro Raduan Nassar, é um pequeno livro com uma história de família e dos seus equilíbrios frágeis que se desfazem quando um dos seus elementos decide fugir do lugar onde vive para outro lugar, que não fica assim tão longe , apenas longe o suficiente para escapar à rigidez moral do modelo patriarcal.

É num quarto bafiento e sujo que André descansa quando o seu irmão, Pedro, o encontra para o convencer a regressar a casa, onde tudo ficou pior no momento em que ele abandonou a família. E é nesse ponto que o leitor entra numa viagem de remniscências e analepses constantes, num vai e num vem de memórias e sentimentos do narrador (André). Raduan Nassar, que escreveu apenas três livros (e este foi o primeiro) e se tornou instantaneamente num mito da literatura brasileira, embala-nos numa prosa poética, como se esta obra fosse um grande poema palavroso - e adjetivado, como o texto que lhe estou a dedicar agora.

Prometo voltar a Nassar tal como prometo voltar outro dia, um pouco antes das nove da manhã, com mais um Expresso Curto para lhe entregar na sua caixa de correio. Amanhã, é dia de Martim Silva, que conta consigo para se manter na liderança dos 'autores' mais lidos da nossa newsletter.

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