segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

A EUROPA E O MEDO (de si própria e dos outros)



Rui Peralta, Luanda

A Europa de hoje sofre uma velha ameaça: o fascismo, com novas caras mas de tradicionais famílias. Hitler e Mussolini e os actores secundários da tragedia fascista europeia (Salazar, Franco, os coronéis gregos e outros actores secundários) parecem ter espalhado o seu ADN decrépito e degenerado. A democratização do projecto europeu atravessa maus lençóis e os descendentes do fascismo assumem posições de ataque, prontos para a maratona.

2015 fica marcado na Europa e na construção da Europa Democrática, como um ano de grandes clivagens, marcado pelo terrorismo (o de Estado e o do fascismo islâmico) e pela vaga de migrantes (também uma consequência do fascismo islâmico e do terrorismo de Estado). O medo é sentimento dominante. A Europa teme a China, teme a Rússia, teme as comunidades imigrantes, teme os refugiados (que acreditam nos valores democráticos que a Europa espalhou pelo mundo) teme o Islão, teme os pobres, teme a 3ª e a 4ª idade, teme a criatividade e a inovação, teme o a democratização da vida social e económica, teme o mercado aberto, é incapaz de discernir a diferença entre Estado e sector público, teme…o Estado Democrático de Direito, uma vez que na Europa iniciou-se o processo de reconversão deste em Estado Oligárquico de Direito.

É um medo com causas reais? Tanto como virtuais! Os desafios da economia-mundo são sempre vastos, amplos e acumulados e apenas podem ser resolvidos através de uma óptica cidadã, nunca sob a luneta míope do Estado ou nas neuroses do mercado adulterado submetido às lógicas perversas da burocracia e das velhas elites oligárquicas (as politicas e as económicas). Vivem os europeus numa Europa em pânico, que continua a não conseguir gerar uma identidade europeia e que continua submetida aos ditames das nações europeias, do bolor do lixo identitário.

Os exemplos de ataques reais á democracia na Europa são vários e de diversa índole. Observe-se o que se passou nas ultimas eleições na Polónia, com a vitória do pterossauro Duda, com a FN em França, onde pode-se acrescentar o estado de emergência e a tentação de cortar o Wi-Fi público, as experiências com contas bancárias do Barclays no Chipre, os conluios entre os oligopólios e os Estados para limitar liberdades públicas e privadas, sendo que tudo isto é consentido pelos cidadãos, submetidos á insegurança e ao receio. É a neurose do medo incutida nos amplos sectores da sociedade.

Feitas as contas, o que resta do projecto europeu? Pouco e cada vez menos. Muito foi afogado pelo medo: a união politica, a união fiscal, a gestão da eurolândia, a Europa Social…O que surge, firme que nem um rochedo incrustado na vergonha de cada europeu, é a Europa-Fortaleza, cada vez mais militarista, fascizante e concentracionária. O mal está feito. Em todas as frentes europeias as portas e janelas estão fechadas, os protagonistas são de péssima qualidade, os argumentistas enredam-se nas virgulas e, pelos caminhos que os actuais carroceiros percorrem, não haverá soluções ou talvez só uma: a Final.

É evidente que por outros caminhos haverá outras alternativas. E, sendo a Europa uma realidade pluridimensional (para fúria dos seu unidimensionais adversários), plural, democrática e participativa outros trilhos serão percorridos e outros rumos serão traçados. O projecto europeu poderá ser reformulado e os seus princípios retomados. A Europa-Fortaleza deverá ser destruída e das suas ruinas deverão ser preservadas as pedras que constituem a memória da vergonha.

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