sábado, 2 de maio de 2015

Portugal. ESTA GENTE DESPREZA OS NOSSOS JOVENS



Baptista Bastos – Jornal de Negócios, opinião

O empobrecimento provocado do País, sob a alegada e despudorada justificação de que gastávamos demais, configura a miséria moral mais sórdida, registada depois do 25 de Abril.

Se ainda houver em Portugal quem acredite neles, que os compre. E, diariamente, surgem notícias cada vez mais desanimadoras. As televisões falam no português comum, que já não ri como ria. É um trabalho científico sobre a melancolia que nos assola e cada vez mais se acentua. A doutrina do empobrecimento, apregoada e posta em prática por Pedro Passos Coelho e os seus, transformou-nos num povo apático, à espera de algo que modifique a nossa triste vida. Aborrece-me ter de bater quase sempre na mesma tecla, mas a culpa não é minha.

Na terça-feira, o Correio da Manhã fez manchete com o título: "Jovens qualificados com salários de 505 euros". O texto, claro e elucidativo, de Raquel Oliveira, é doloroso pela extrema crueldade com que relata este aspecto do nosso viver. O Governo decreta e o patronato, contentíssimo, segue à risca as normas. Vale a pena gastar dinheiro com a educação dos filhos, quando a postulação neoliberal afasta qualquer hipótese de ajuda estatal? Perguntam os pais. Sei muito bem do que falo e dos sacrifícios que a minha mulher e eu fizemos, ainda fazemos, para os nossos três filhos conseguirem obter cursos superiores. A linguagem deve ser esta, para que todos percebam. Claro que as dificuldades não são apenas de hoje. Mas, agora, acentuaram-se até ao desespero. O texto de Raquel Oliveira, na sua necessária síntese, é suficientemente nítido para que a indignação se junte a todas as nossas outras múltiplas indignações.

O empobrecimento provocado do País, sob a alegada e despudorada justificação de que gastávamos demais, configura a miséria moral mais sórdida, registada depois do 25 de Abril. O pior é que não há entre os comentadores habituais, um sequer, que escalpelize o crime de lesa-pátria.

O próprio Marcelo Rebelo de Sousa admitiu, na última semana, que os desmandos do capitalismo estavam a conduzir as pessoas para uma situação de revolta sem saída. A simples declaração do Marcelo, pela importância da personagem e pela natureza, embora cautelosa, da declaração, mereciam uma atenção necessária e imperiosa da comunicação social. Nada disso. O balanço feito, nas últimas semanas, sobre a actuação da imprensa e das televisões, é de molde a deixar-nos prostrados. A crítica ausentou-se, foi ausentada, da sua missão fundamental, noticiar e esclarecer, e não passa de uma massa amorfa, sem grandeza nem decência, enquanto o País se afunda. Factótuns estão a substituir pessoas íntegras e profissionalmente competentes, numa dimensão até agora insuspeitada. Podem ter a certeza de que sei do que falo.

Este assunto dos jovens qualificados com salários de 505 euros merecia, sem dúvida, um tratamento televisivo mais amplo: por exemplo, nos "Prós e Contras", da Fátima Campos Ferreira, cuja audiência e procura da imparcialidade temática são de assinalar. Não se pode prolongar este silêncio cúmplice sobre os grandes problemas nacionais, nem ocultar o nome e a acção dos seus mentores.

Uma reflexão sobre Portugal

"Passos Perdidos", de Ernesto Rodrigues, é um texto vital, pelo que propõe de reflexão sobre o País, e pela excepcional qualidade da prosa, do melhor que tem saído dos nossos prelos. Ernesto Rodrigues, professor da Faculdade de Letras de Lisboa, é um raro historiador da nossa vida, pela variedade de temas com que procura "ler" Portugal. Ele faz levantamentos sobre grandes autores esquecidos, folheia e atenta em jornais e em jornalistas que marcaram época e hoje estão tumularmente dispersos e ignorados, e é um grande romancista, que este "Passos Perdidos" vem realçar, na continuação de "Torre da Dona Chama", um dos grandes textos da literatura portuguesa contemporânea. Basta ler a delineação que Ernesto Rodrigues faz dos próprios Passos Perdidos, para se avaliar o cuidado do observador e a natureza do seu projecto. A edição é da Âncora, dirigida por Baptista Lopes. A não perder. 

Portugal – Presidenciais. HÁ MENOS UM CANDIDATO A LUTAR POR BELÉM




O ex-líder da GCTP anunciou ontem que não se vai candidatar à Presidência da República.

Após semanas de dúvida, Carvalho da Silva coloca os pontos nos is. O ex-líder da GCTP anunciou esta sexta-feira, em declarações à SIC Notícias, que não se vai candidatar à Presidência da República, sendo, agora, uma carta fora do baralho na corrida a Belém.

“Não existe a minha candidatura, porque simplesmente não sou candidato. Essa questão não se coloca”, disse ontem à antena do canal informativo.

Embora não seja candidato, Carvalho da Silva espera que “no somatório [de candidaturas] haja capacidade de uma mobilização”.

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Portugal ainda tem 250 mil jovens que não trabalham nem estudam - Eurostat




São intitulados como ‘nem-nem’ e expressam uma tendência cada vez mais frequente em Portugal: sem trabalho e sem escola.

Os mais recentes dados do Eurostat revelam que Portugal tem 248 mil jovens que não estudam, nem trabalham. Enquadram-se na geração nem-nem e espelham uma das mais recentes tendências europeias.

Embora o número de ‘nem-nem’ esteja a recuar em Portugal (que se encontra a meio da tabela europeia), é de salientar que quanto mais velhos forem os jovens, mais grave a situação se torna.

De acordo com o Jornal de Notícias (JN), em 2014, eram 137 mil os jovens entre os 15 e os 24 anos que não frequentavam a escola e também não trabalhavam. Contudo, se a estes valores forem incluídos os ‘jovens adultos’ até aos 34 anos, contabilizam-se 363 mil.

A região Centro é a que menos regista casos de jovens sem emprego e escola (8,5%), ao contrário do Alentejo (13,6%) e do Norte (13,3%).

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África: O AGRONEGÓCIO É A NOVA VERSÃO DO COLONIALISMO




Os países do G-8 querem assumir a terra do continente africano, exportando suas tecnologias e ignorando qualquer conhecimento agroecológico.

Najar Tubino – Carta Maior

Os 53 países da África tem uma população de 1,111 bilhão de habitantes, sendo que 863 milhões moram na África Subsaariana – 34 países -, e 539 milhões continuam vivendo no campo. Mais de 90% são agricultores familiares, que as instituições internacionais insistem em qualificar de pequenos agricultores sem recursos. Além disso, 75% dos que trabalham e vivem da agricultura são mulheres, outro dado negligenciado pelas agências internacionais, como a USAID dos EUA, que está envolvida na maioria dos projetos de cooperação no continente africano. O próprio G-8 definiu há dois anos uma estratégia até 2022, para retirar 50 milhões de pessoas da situação de fome. Uma hipocrisia que de tempos em tempos os governantes ricos do planeta transformam em anúncios pomposos e planos detalhados. Este ano, por exemplo, era para ser a data em que a fome no mundo seria reduzida a metade. Isso foi anunciado no início do novo milênio.

Na verdade, o que os países do G-8 e suas agências, além é claro, das suas corporações, querem mesmo é assumir a terra do continente africano, que é habitada há milênios por comunidades de povos tradicionais e de indígenas. Parte dessa estratégia é traçar novas regulamentações nas próprias terras, iniciando o processo de regulamentação e da emissão de títulos individuais para os povos tradicionais, que obviamente, não tem documentos sobre suas terras. A USAID tem investido milhões de dólares em projetos neste sentido. Mas outra entidade chamada Millennium Challenge Corporation (MCC), criada pelo Congresso dos EUA em 2004 com o objetivo de promover o mercado livre em países pobres já investiu US$260 milhões para regulamentar as terras africanas. A rede de ONGs GRAIN, do Canadá, especialista na questão fundiária denunciou que os países africanos já promoveram 243 mudanças em suas legislações fundiárias e outras 43 na alteração do mercado de sementes.

Agroecologia é totalmente boicotada

A outra ponta da estratégia dos países ricos é implantar o agronegócio nas terras das comunidades tradicionais, para fazer o que já fazem em outras regiões, inclusive no Brasil: plantar soja, milho e algodão, cana e em alguns casos, como na África, culturas como caju, amendoim e tabaco. O pacote envolve sementes certificadas e patenteadas, fertilizantes químicos e agrotóxicos, o trio universal que tomou conta do planeta. A organização WWI (World Watch Institute), de Washington, criada pelo agrônomo Lester Brown, fez um trabalho de pesquisa de campo em 25 países africanos nos anos de 2009-2010, para o relatório lançado em 2011 – “Estado do Mundo: Inovações que nutrem”.

Os pesquisadores do WWI relataram dezenas de experiências em agroecologia na África – onde quase um milhão de agricultores trabalham com agroecologia e produção orgânica- em regiões difíceis como o Níger, a Etiópia, Mali e Malawi, que não são difundidas. Aliás, as agências internacionais não fazem a menor questão de divulgar este tipo de trabalho. Muito menos as fundações Gates, Soros, Rockefeller que definiram que a estratégia é implantar as sementes transgênicas no território africano, gastando mais de 200 milhões de dólares, se contabilizarmos os projetos de apenas duas delas – Gates e Rockefeller.

Milhões serão exilados pela mudança climática

Isso inclui criar semente transgênica de batata doce e de mandioca, duas culturas básicas na dieta dos africanos do campo. É preciso acrescentar nestas estatísticas futuras, que nos próximos cinco anos, entre 75 e 250 milhões de pessoas se tornarão exilados, em consequência das mudanças climáticas na África. As secas atingem as colheitas em dois de um período de três anos. A cada década uma seca grave. Então o problema básico dos povos tradicionais da África é a falta de umidade no solo, a falta de armazenamento da água da chuva e a inexistência de fertilidade do solo, ou seja, matéria orgânica, que em algumas regiões desapareceu. Não há pacote agroquímico no mundo capaz de resolver o problema.

Uma das fantasias criada pela Monsanto no Quênia é a promoção de uma semente transgênica lançada nos EUA em 2013, que é “resistente à seca”, e na verdade é tolerante a uma seca moderada. Coisa que qualquer semente crioula adaptada ao seu local de origem exerce em seu ciclo produtivo. Este é outro ponto que a estratégia dos países ricos pretende implantar na África. Em todos os países estão sendo introduzidas mudanças para regulamentar o mercado de sementes. Num continente onde mais de 90% da produção agrícola é familiar e tradicional, ou seja, faz parte dos costumes a troca e a partilha do conhecimento, portanto, das sementes crioulas, os agentes das corporações querem segurança para as patentes de suas marcas transgênicas.

Prosavana denunciado pelos camponeses de Moçambique

É lamentável que entre esses programas da USAID, das fundações filantrópicas norte-americanas estão iniciativas do governo Brasileiro, em projetos de cooperação técnica com vários países, especialmente Moçambique. A Embrapa desenvolve um programa de inovação agrícola em parceria com USAID em Moçambique. Existem dois projetos envolvendo a implantação do Programa de Aquisição de Alimentos e do Mais Alimentos. Até recentemente os programas filantrópicos dos EUA e da União Europeia compravam grãos dos seus agricultores para levar como ajuda humanitária à África, através do Programa Mundial de Alimentos. Agora mudaram a estratégia em parte, comprando de agricultores africanos.

Entretanto, o Prosavana é o mais conhecido dos programas a ser realizado no Corredor de Nacala, onde o ponto final é o porto, e onde uma ferrovia atravessa o norte do país. O discurso é o mesmo: ajudar a agricultura dos 4,5 milhões de pequenos produtores, melhorar a eficiência, combater a fome, mas depois de tudo isso, organizá-los em cooperativas para que se enquadrem no agronegócio e mergulhem no mercado de commodities mundial. Trabalhar para regulamentar a terra e nos projetos de reassentamentos. A Vale que explora carvão em Moatize tem uma área de 23 mil hectares e reassentou mais de mil famílias. A União Nacional dos Camponeses de Moçambique tem denunciado o Prosavana justamente por não contemplar as comunidades locais, de usurparem das suas terras e de implantar um programa sem consulta pública. Sem contar que a Fundação Getúlio Vargas estava fazendo a estruturação do Fundo Nacala, com sede em Luxemburgo e que pretendia captar dois bilhões de dólares de investidores e que receberiam seus lucros em 10 anos. Não vingou.

Algumas empresas portuguesas, da Suécia, da Finlândia, dos EUA, do Brasil já estão implantando projetos no Corredor de Nacala. Em Niassa, uma das províncias da região, o governo de Moçambique pretende incentivar o plantio de três milhões de hectares de eucalipto. Por ironia trágica, as empresas Hoyo Hoyo e Grupo Américo Amorin, além da Portucel, de Portugal, atuavam em Moçambique durante a colonização. Do Brasil o grupo Agromoz, dos Estados Unidos a Africa Century Agriculture Rei do Agro. É muito educativa a declaração da CEO do African Agricultural Land Fund, Susan Payne:

“- As terras e a mão de obra são tão baratas na África que vale a pena correr os riscos para investir”.

Programa para transformar em revendedor de agroquímicos

Na maioria dos países o governo concede licenças – no caso de Moçambique de 50 anos – para exploração por preços irrisórios, afinal, as empresas, fundos, corporações querem ajudar a combater a fome, melhorar a renda dos pequenos agricultores de parcos recursos e que necessitam da modernização da agricultura, das suas sementes transgênicas, dos seus fertilizantes químicos e de seus venenos. Um dos programas da USAID, patrocinado pelas corporações químicas é o PROFIT. Trata-se de um caso realmente engenhosos: formar agentes locais para revenda de produtos e também divulgadores das tecnologias do agronegócio. Eles treinaram milhares de agricultores na Zâmbia, que na zona rural de Mkushi, transformaram a paisagem num campo igual aos de Iowa, maior produtor de milho transgênico dos EUA. Em meio às choupanas de palha, como o relato de Andrew Rice no relatório do WWI.         

Enquanto isso, no Níger, país com 14 milhões de habitantes que enfrenta fome crônica e uma seca que devastou as criações de animais, situado na região do Sahel, os povos tradicionais fizeram uma recuperação da mata nativa, de espécies lenhosas, que em muitos casos são leguminosas, que naturalmente fixam nitrogênio na terra e conseguiram mudar o panorama numa área de cinco milhões de hectares. Isso ocorre nas regiões de Maradi e Zinder. Mesmo tipo de iniciativa o povo Dogon, no Mali, realizou. Fazendo cobertura vegetal, implantando sistemas agroflorestais e cultivando plantas nativas como painço e a espécie crioula do feijão-fradinho, além de rotação com noz de bambara, fanio e amendoim.

Sobrevivem com dignidade há milênios

Na Etiópia os povos das aldeias Wukro e Wenchi produzem mel de excelente qualidade – o país produz mais de 24 mil toneladas por ano, é o maior produtor da África -, que entrou no circuito internacional através de uma iniciativa do Slow Food International, que também já implantou mais de mil hortas comunitárias com espécies crioulas. As mulheres Massai, do distrito de Kajiado, no Quênia, construíram cisternas de ferrocimento para armazenar água, um projeto do Programa de Meio Ambiente da ONU. Em cada cisterna plantam 100 árvores.

Nos planaltos da Etiópia um grupo de agricultores descobriu e formulou um novo tipo de fertilizante usando uma planta nativa. Na mesma região onde até hoje produzem café selvagem, o mesmo que deu origem as plantações do Brasil, Colômbia e outros países.

Esta é uma realidade que não tem apoio dos governos locais todos interessados nas verbas das agências internacionais e das corporações, incluindo a elite local, que como sempre faz o seu papel de introdutor do pacote neoliberal agrovenenoso. Também não tem divulgação a não ser nos veículos alternativos ou de entidades. O pacote inclui a informação manipulada de uma realidade que só pode mudar se os povos tradicionais abrirem mão das suas terras, da sua história, enfim, da vida que levam a milhares de anos. E que agora os países do G-8, as fundações Rockefeller, Gates, Soros, Buffet, e as corporações Monsanto, Syngenta, Dupont e Bayer querem transformar, liquidando com a única coisa que eles mantiveram depois da escravidão, da colonização – a dignidade de viver de acordo com seus costumes e tradições, mesmo passando fome em muitos momentos.  

Créditos da foto: Africa Renewal / Flickr

Moçambique. "Frelimo terá de recuar". Dhlakama reage ao chumbo de autarquias provinciais




O líder do partido Renamo, Afonso Dhlakama, apelou ao partido Frelimo para reflectir e viabilizar o projecto de autarquias provinciais, chumbado na quinta-feira no parlamento, assegurando que não pretende usar a força e que "nada está perdido".

"Não quero que nos sintamos obrigados a governar à força, quero governar e nomear pessoas constitucionalmente", afirmou em Quelimane, província da Zambézia, o presidente do maior partido de oposição, na primeira reação ao chumbo do projeto apresentado pelo seu partido, que pretendia, com a proposta, ultrapassar a crise política com o Governo desde as eleições gerais de 15 de Outubro.

"A Frelimo terá de recuar, porque a Frelimo não ganhou as eleições, tem de reflectir porque está a perder uma oportunidade", disse Dhlakama, considerando que o voto contra da bancada da maioria "foi um jogo sujo", após ter alcançado um alegado "acordo verbal" com o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi.

Dhlakama afirmou que o partido Frelimo "quis brincar" e desconhece o que vai acontecer a seguir, avisando apenas que "a Renamo e o povo não vão recuar".

A Assembleia da República de Moçambique chumbou na quinta-feira o projecto de criação de autarquias provinciais, submetido pelo partido Renamo. Dos 236 deputados presentes na sessão plenária, a bancada maioritária da Frelimo chumbou a proposta, com 138 votos contra, enquanto 82 eleitos da Renamo e 16 do MDM (Movimento Democrático de Moçambique) votaram a favor.

O Projecto do Quadro Institucional das Autarquias Provinciais previa que o partido Renamo governasse em seis províncias do centro e norte do país (Sofala, Manica, Tete, Zambézia, Nampula e Niassa), onde o maior partido de oposição reclama vitória nas eleições gerais de 15 de Outubro, num modelo de municípios alargados à escala provincial.

No projecto, o partido Renamo defendia a nomeação por Afonso Dhlakama de presidentes de conselhos provinciais com funções executivas em seis províncias do país, a canalização de 50% das receitas geradas pela extracção mineira e dos valores gerados pelo sector petrolífero, 1% de alguns impostos cobrados pelo Estado nas autarquias locais, impostos de natureza provincial, bem como impostos autárquicos.

O partido Renamo não reconhece os resultados das últimas eleições e pretendia com este projeto ultrapassar a crise política instalada desde a votação e evitar instabilidade social e desobediência civil generalizada.

Lusa, em Verdade (mz)

INCERTEZA EM MOÇAMBIQUE DEPOIS DA REPROVAÇÃO DO PROJETO DA RENAMO




Ivone Soares diz que "futuro de Moçambique é incerto"

Ramos Miguel – Voz da América

Moçambique vive um período de incerteza resultante da reprovação ontem, 30, pelo Parlamento do projecto de governação autónoma de seis províncias onde a Renamo diz ter obtido o maior número de votos nas eleições de 2014. É que não se sabe qual vai ser a reacção do líder do partido Afonso Dhlakama.

A chefe da bancada parlamentar da Renamo Ivone Soares, falando após o chumbo do projecto, disse que "o futuro de Moçambique é incerto" e sublinhou que a crise vai continuar.

Ao abrigo do projecto, a Renamo previa governar nas províncias moçambicanas de Sofala, Tete, Manica e Zambézia ( centro), e Nampula e Niassa (norte), onde o partido reclama vitória nas eleições do ano passado, num modelo de municípios alargados á escala provincial.

A Renamo pretendia com esta proposta ultrapassar a crise política que se vive no país, resultante do facto de o partido não reconhecer os resultados das eleições gerais de 2014.
A chefe da bancada parlamentar da Renamo Ivone Soares afirmou que "a reprovação do projecto de Autarquias Provinciais não acaba com o problema da fraude eleitoral".

Analistas dizem que o projecto tinha muitos aspectos controversos, entre os quais o facto de a Renamo exigir a nomeação, por Afonso Dhlakama, de presidentes de Conselhos Provinciais com funções executivas em seis províncias, a canalização de 50 por cento das receitas geradas pela extracção mineira e dos valores gerados pelo sector petrolífero, 1% de alguns impostos cobrados pelo Estado nas autarquias locais, impostos de natureza provincial, bem como impostos autárquicos.

Moçambique. MILITARES EM NAMPULA ACUSADOS DE AGRESSÕES E VIOLAÇÕES




Comandante da brigada das Fademo nega as acusações

Militares do quartel de Carrupeia, na província moçambicana de Nampula, estão a ser acusados por locais de agressões e violações.

Voz da América

Segundo os residentes daquela zona, que falaram à VOA na língua local Emacua, desde a chegada dos militares em Outubro do ano passado àquela zona, os residentes não têm sossego e são frequentes os tiroteios,agressões, vandalização das culturas agrícolas e residências.

Nos últimos 10 dias a situação atingiu momentos de muita tensão. Muitas pessoas foram agredidas fisicamente pelas tropas, das quais sete ficaram feridas.

Os populares dizem não se sentirem protegidas, nem a região, e temem que, a continuar esta postura das Fademo, aconteça o pior, como mortes de populares.

O comandante do quartel de destacamento de Carrupeia, Constantino Omar, nega as acusações da população e diz que são as tropas que têm sofrido agressões de alguns cidadãos por estarem contra a presença deles.

O comandante revelou que a criminalidade diminuiu na zona depois da chegada dos militares.

Importa referir que na sequência desses confrontos dois militares estão a ser tratados no hospital central de Nampula.

Segundo dados do posto policial local, foram registadas três queixas contra os militares, o que contraria a versão do comandante.

Entretanto, a VOA sabe que houve um encontro entre os militares, populares e o comando provincial da policia para tentar encontrar uma saída à situação existente.

África. BOKO HARAM ESTÁ MESMO PERTO DO FIM?




Anúncio da libertação de centenas de reféns na Nigéria é bem-vindo. Mas é também suspeita a coincidência entre supostas vitórias militares do governo e eventos políticos, opina Thomas Mösch, chefe da redação hauçá da DW.

No momento, tudo indica que um dos mais sanguinários grupos terroristas do mundo esteja à beira da derrota militar, simplesmente travando as últimas batalhas de retirada com os países atingidos, a Nigéria e seus vizinhos Chade, Camarões e Níger. Na verdade, é algo quase inacreditável, depois de seis anos de manobras basicamente fracassadas das Forças Armadas nigerianas.

Entretanto é preciso encarar com ceticismo as notícias de sucesso por parte dos militares nigerianos. Por demasiadas vezes, porta-vozes já anunciaram a vitória sobre o Boko Haram ou a libertação de reféns, sem que nada acontecesse de concreto.

Os acontecimentos das últimas semanas reforçam a suspeita de que o Boko Haram seja, acima de tudo, um fenômeno local inflacionado por interesses políticos. Duas dinâmicas explicam o sucesso dos terroristas nos últimos anos.

Em primeiro lugar, durante anos tanto o Exército da Nigéria e sua liderança quanto o governo em Abuja não levaram a sério o perigo da matança no empobrecido nordeste. Por isso, desviaram para outros canais as verbas bilionárias destinadas às forças de combate – à custa dos soldados rasos e de centenas de milhares de cidadãos que perderam a vida, a saúde ou o local de morada.

A elite política e militar só passou a agir quando reconheceu que um fracasso diante do Boko Haram colocaria em perigo sua reeleição e, assim, o acesso às riquezas do país. A rigor, já passava da hora para tal iniciativa, e por isso o pleito teve que ser adiado.

Em apenas seis semanas, as Forças Armadas dos países atingidos forçaram os terroristas a recuarem, ao ponto de não conseguirem perturbar seriamente as eleições nem mesmo em sua região de origem. Tarde demais, pois mesmo assim os eleitores optaram pela oposição.

Em segundo lugar, a súbita vulnerabilidade do grupo terrorista – tão temido até há pouco – indica que seus recursos estão se esgotando. O Boko Haram não foi capaz de financiar seus ultramodernos armamentos apenas com o saque de filiais bancárias nos territórios ocupados ou com das quantias de resgate de ocasionais sequestros.

Até o momento, não há provas conclusivas de contribuições financeiras partindo de redes internacionais. A maior parte do apoio ao Boko Haram deve ter vindo da própria Nigéria. No passado, por diversas vezes as elites nigerianas instrumentalizaram e armaram grupos militantes a fim de impor os próprios interesses hegemônicos – tanto no Delta do Níger como em outras áreas do norte do país.

Não foi mero acaso a coincidência cronológica entre a ascensão do Boko Haram a exército terrorista capaz de abalar todo o país, e a posse de Goodluck Jonathan como chefe de Estado, em 2010. Logo após a morte do presidente muçulmano Umaru Musa Yar'Adua, partes da elite norte-nigeriana já haviam ameaçado tornar o país ingovernável, caso o partido governista PDP apresentasse Jonathan como candidato na campanha eleitoral de 2011.

O passado já mostrou repetidamente que os estrategistas políticos da Nigéria não hesitam em passar por cima milhares de cadáveres quando se trata de defender os próprios interesses. Agora Jonathan perdeu a presidência e quase não se ouve mais falar do Boko Haram. Acaso?

Até agora não há indícios de que o presidente eleito Muhammadu Buhari esteja em conluio com os financiadores do Boko Haram. Ele sempre manteve distância dos corruptos por trás da política norte-nigeriana. Mesmo assim, é possível que esses manipuladores acalentem a esperança de voltar a ter mais influência agora, sob o novo presidente muçulmano, do que sob Jonathan.

É de se duvidar que Buhari tenha poder de desativar as redes que controlam o terror, ou mesmo de expô-las. No melhor dos casos, agora elas se acalmarão, retirando seu apoio dos terroristas. E se algo restar do Boko Haram, serão no máximo pequenas gangues de salteadores arruaceiros, como as que também existem em outras partes da Nigéria.

Thomas Mösch – Deutsche Welle, opinião

EUA. BALTIMORE. PROMOTORA INDICIA SEIS POLÍCIAS PELA MORTE DE FREEDIE GRAY




Marilyn Mosby afirma em Baltimore que morte de Freddie Gray foi homicídio. Seis agentes envolvidos na prisão do jovem negro vão responder por crimes que acarretam penas entre três anos e 30 anos de prisão.

A promotora Marilyn Mosby afirmou nesta sexta-feira (01/05), em Baltimore, que a morte do afro-americano Freddie Gray foi homicídio. A promotoria decidiu indiciar seis policiais pelo assassinato do jovem: Brian Rice, Alicia White, William Porter, Garrett Miller, Edward Nero e Caesar Goodson. O pedido de prisão para os policiais foi emitido.

Os seis policiais envolvidos na detenção de Gray serão indiciados por crimes que vão desde agressão, má conduta, negligência, prisão ilegal e até homicídio, com penas previstas entre três anos de detenção, podendo chegar até 30 anos de prisão.

No entanto, apenas o motorista da viatura, Goodson, será indiciado por homicídio de segundo grau – quando há intenção de matar, mas sem planejamento prévio. Rice, Porter e White são acusados de homicídio culposo, entre outros crimes.

Mosby disse que o médico legista confirmou que a morte de Gray foi um homicídio e que as lesões em sua coluna cervical ocorreram por ele ter sido colocado na viatura sem cinto de segurança ou outra proteção. A autópsia comprovou que a lesão fatal foi causada por uma pancada dentro do carro.

A promotora afirmou, ainda, que houve paradas não relatadas em diferentes locais, além de outra detenção efetuada e alegações que não correspondiam aos depoimentos prestados pelos seis policiais. Segundo Mosby, a viatura parou seis vezes.

"Para a população de Baltimore e os manifestantes em todos os EUA, eu vou a sua chamada para 'enquanto não houver justiça, não há paz'. A paz é necessária enquanto eu trabalho para fazer justiça em nome desse jovem", afirmou Mosby durante a entrevista coletiva, um dia após a polícia ter concluído a investigação.

A decisão de indiciar os seis policiais e a velocidade com a qual Mosby fez o anúncio foram recebidas com grande comemoração nas ruas de Baltimore, onde manifestantes, na última terça-feira, saquearam, queimaram carros e entraram em confronto com a polícia.

Mais manifestações foram planejadas em diversas cidades neste final de semana, embora o anúncio desta sexta-feira possa mudar o tom dos próximos protestos. Gray morreu no último dia 19 de abril após sofrer graves lesões na coluna.

Deutsche Welle - FC/rtr/afp/ap/efe

MANIFESTAÇÃO DO 1º DE MAIO NA TURQUIA ACABA EM CONFRONTO




Polícia turca impede a chegada de 20 mil manifestantes à Praça Taksim, em Istambul, e protesto termina em violência. Dia do Trabalho tem marchas em vários países como Alemanha, Grécia, Portugal e Espanha.

A polícia turca usou gás lacrimogêneo e jatos de água para impedir que cerca de 10 mil manifestantes nesta sexta-feira (01/05) chegassem à Praça Taksim, em Istambul, nos protestos pelo Dia do Trabalho. A ação das forças de segurança no distrito de Besiktas provocou o recuo dos manifestantes, que jogaram garrafas, pedras e coquetéis molotov nos policiais.

O governo proibiu as manifestações de 1º de maio na Praça Taksim e, por ordem do presidente Recep Tayyip Erdogan, 20 mil policiais bloquearam os acessos ao local para evitar distúrbios antes das eleições legislativas na Turquia previstas para 07 de junho.

A manifestação foi convocada por sindicatos e partidos de oposição contra a diminuição dos direitos trabalhistas e medidas de austeridade econômica aplicadas pelo governo. Pelo menos 136 pessoas foram detidas, inclusive 30 membros do Partido Comunista.

As ruas do centro de Istambul foram bloqueadas e as estações de metrô próximas à praça foram fechadas. As autoridades determinaram oito regiões onde protestos estavam autorizados e afirmou que proibiria a entrada de qualquer manifestante na praça, o que causou críticas da oposição e do Tribunal Europeu de Direitos Humanos.

O governo também suspendeu o serviço de balsas entre os lados europeu e asiático do país, e helicópteros privados foram proibidos de voar para facilitar o deslocamento das aeronaves da polícia. Este é o primeiro Dia do Trabalho no país desde que o Parlamento aprovou uma polêmica legislação que dá à polícia mais poderes para reprimir protestos.

A Praça Taksim foi o palco central de protestos em 2013 contra o governo do então primeiro-ministro Erdogan, após a polícia turca avançar de forma violenta contra ativistas ambientais que pretendiam evitar a ocupação de uma área verde no centro da cidade.

Na época, irritados com os procedimentos da polícia, dezenas de milhares de pessoas adentraram o Parque Gezi e ocuparam a vizinha Taksim por duas semanas, até serem evacuados pelas autoridades. Os tumultos provocaram a morte de pelo menos sete pessoas.

Protestos pelo mundo

Na Alemanha, extremistas de direita atacaram uma manifestação pelo Dia do Trabalho na cidade de Weimar. Quatro pessoas ficaram feridas, quando cerca de 50 neonazistas destruíram um palco onde políticos, como o prefeito de Weimar, Stefan Wolf, iriam discursar. A polícia prendeu 29 pessoas.

Na Grécia, milhares de pessoas foram ao centro da capital, Atenas, para protestar contra as medidas de austeridade impostas pela União Europeia. Na Espanha, sindicatos convocaram manifestações em várias cidades para protestar contra medidas de austeridade, desemprego elevado e redução de salários.

Na Rússia, mais de 150 mil pessoas compareceram à Praça Vermelha, no centro da capital, Moscou. No Irã, milhares de trabalhadores saíram às ruas da capital, Teerã, para exigir melhores condições de trabalho e prioridade de contratação de empresas nacionais.
Na Coreia do Sul, dezenas de milhares participaram das manifestações contra o plano de reforma do mercado de trabalho.

Deutsche Welle - FC/rtr/dpa/ap/afp/efe

PRIMÁRIAS E PARTIDO ÚNICO



José Goulão – Jornal de Angola, opinião

Senhoras e senhores vai começar o grande leilão, o negócio da compra, venda e troca dos votos dos cidadãos capaz de garantir que o imenso mercado universal continue a engordar, o alibi quadrienal que encobre os maiores crimes e atrocidades globais em nome daquilo que o sistema geral de propaganda pretende impor como democracia.


As primárias para as eleições presidenciais norte-americanas ainda não estão no terreno mas há muito que se jogam nos bastidores sujos e viciados do sistema de poder dos Estados Unidos. Primárias que servem de inspiração e exemplo para as tendências da moda da política do pacovismo europeu, sempre pronto e disponível para aceitar o que os ventos sopram do outro lado do Atlântico como normas – ordens é o termo mais provável –adequadas à estabilização dos mercados, afinal o fim supremo da democracia, ao que consta.

Nos Estados Unidos as eleições primárias destinam-se a escolher o agente político que num dado momento e determinadas circunstâncias melhor serve os interesses do complexo militar, financeiro e industrial que governa o país. Será também o candidato a quem esses interesses pagarem mais, o que conseguir a melhor frase de propaganda, o que distribuir mais chapelinhos e pins, o que acenar com mais elegância e treinar a voz mais modulada, o que sorrir mais branco no retrato da família feliz, o que lançar mais confetti. Presume-se que os dois sujeitos ou sujeitas que cheguem à final sejam antagonistas quando, em boa verdade, não passam de dois bicos de um mesmo cacete que é o partido único.

E na Europa? Na Europa as primárias correspondem ao significado da própria palavra, se entendida como o primeiro passo para a subversão do sistema de partidos como base da democracia. Fazer primárias é como beber do fino, é fazer parte do arco da governação, ou arco da austeridade, ou arco da exploração mesmo para aqueles que dizem estar fora dele mas gostam de esbracejar na sua espuma, numa triste e desoladora babugem, convencendo-se que enganam outros uma vez que deixaram de enganar a si mesmos.

As primárias são uma finta soez à democracia, porque é praticada em falta. Onde se diz acrescentar transparência contaminam-se vontades, onde se promete alargar pluralismo afunilam-se escolhas, onde se garante esclarecimento cultiva-se propaganda. Isto são as primárias à europeia, parentes pobres e ambíguos das congéneres americanas, onde tudo se faz em grande até à burla final, na qual os cidadãos escolhem sem ter escolha nenhuma. É, no fundo, isto que se pretende com as primárias na Europa.

Parece exagero? Não se iludam. Os partidos, por definição, representam partes de uma sociedade com interesses diferentes, quantas vezes antagónicos. Ora nas primárias os partidos abrem-se às escolhas dos alegados simpatizantes, conceito suficientemente vago para nele caberem eleitores de outros partidos ou de partido nenhum numa mistela entre os cadernos eleitorais nacionais e os do partido. Não é abertura que se pratica, é contaminação, os partidos perdem identidade, abdicam dela. Não é por acaso que os partidos praticantes das primárias deixaram de ter personalidade, fundidos no venenoso caldeirão neoliberal, irmanados no arco da exploração.
Acresce que tais partidos não se contentam em apagar quaisquer vestígios das suas origens e história em nome da modernidade supostamente trazida pelas primárias. Querem impô-las como lei aos outros partidos, os que não se deixam levar pelo discurso mistificador. Não conseguem, de facto, disfarçar o seu encanto pela política única, não disfarçam o quanto foram acometidos pela mentalidade de partido único.

A CEGUEIRA DA UNIÃO EUROPEIA FACE À ESTRATÉGIA MILITAR DOS EUA



Thierry Meyssan*

Os responsáveis da União Europeia enganam-se completamente acerca dos atentados islamistas na Europa e as migrações para a União de gente fugindo das guerras. Thierry Meyssan mostra aqui que tudo isto não é a consequência acidental dos conflitos no Médio-Oriente alargado e em África, mas sim um objectivo estratégico dos Estados Unidos.

Os dirigentes da União Europeia encontram-se subitamente confrontados com situações inesperadas. Por um lado, atentados ou tentativas de atentados perpetrados, ou preparados, por indivíduos que não pertencem a grupos políticos identificados; por outro lado um afluxo de migrantes, via mar Mediterrâneo, dos quais vários milhares morrem às suas portas.

Na ausência de análise estratégica, estes dois acontecimentos são considerados a priori como não tendo relação entre si e são tratados por administrações diferentes. Os primeiros recaem sobre os serviços de Inteligência e da polícia, os segundos sobre os serviços de alfandega e da Defesa. Ora, eles têm no entanto uma origem comum: a instabilidade política no Levante e em África.

A União Europeia privou-se dos meios para compreender

Se as academias militares da União Europeia tivessem feito o seu trabalho de casa, elas teriam estudado nos últimos quinze anos, a doutrina do «big brother» norte-americano. Com efeito, desde há longuíssimos anos, o Pentágono publica todo o tipo de documentos sobre a «teoria do caos» copiada do filósofo Leo Strauss. Há ainda alguns meses, um funcionário que já deveria ter sido aposentado há mais de 25 anos, Andrew Marshall, dispunha de um orçamento de 10 milhões de dólares anuais para realizar pesquisas sobre este assunto [1]. Mas nenhuma academia militar da União estudou seriamente esta doutrina e as suas consequências. Tanto porque é uma forma de guerra bárbara e também porque ela foi concebida por um mestre pensador das elites judias norte-americanas. Ora, está-se a ver, os Estados Unidos-que-nos-salvaram-do-nazismo não podem preconizar tal tipo de atrocidades [2].

Se os políticos da União Europeia tivessem viajado um pouquinho, não apenas no Iraque, na Síria, na Líbia, no Corno de África, na Nigéria e no Mali, mas também na Ucrânia, eles teriam visto com os seus próprios olhos a aplicação desta doutrina estratégica. Mas, eles contentaram-se em vir falar num prédio da Zona Verde em Bagdade, num palanque em Tripoli ou na praça Maidan de Kiev. Eles ignoram aquilo que as populações vivem e, a requisição do seu «Grande Irmão-big brother» fecharam muitas vezes as suas embaixadas de tal modo que se privaram de ter olhos e ouvidos no local. Melhor, eles subscreveram, sempre a requisição do seu «Grande Irmão», embargos, de modo que nenhum homem de negócios pudesse ir, nunca mais, até aos locais testemunhar o que acontecia por lá.

O caos não é um acaso, é o objectivo

Contrariamente ao que disse o presidente François Hollande, a migração de Líbios não é a consequência de uma «falta de acompanhamento» da operação «Protector unificado», mas o resultado pretendido por esta operação na qual o seu país desempenhou um papel de líder. O caos não se instalou porque os «revolucionários líbios» não se puseram de acordo entre si após a «queda» de Muammar el-Kadafi, ele era o objectivo estratégico dos Estados Unidos. E estes conseguiram atingi-lo. Não houve uma «revolução democrática» na Líbia, jamais, mas sim uma secessão da Cirenaica. Jamais houve uma aplicação do mandato da Onu visando «proteger a população», mas o massacre de 160.000 Líbios, três quartos dos quais civis, sob os bombardeamentos da Aliança (dados da Cruz-Vermelha Internacional).

Eu lembro-me, antes de me juntar ao governo da Jamahiriya árabe Líbia, ter sido solicitado para servir de testemunha aquando de uma reunião em Tripoli entre uma delegação dos EUA e representantes líbios. Durante esta longa reunião, o chefe da delegação dos EU explicou aos seus interlocutores que o Pentágono estava pronto a salvá-los de uma morte certa, mas exigia que o Guia lhe fosse entregue. Ele acrescentou que, quando el-Kaddafi estivesse morto, a sociedade tribal não conseguiria aceitar uma nova liderança antes de, pelo menos, uma geração, o país seria então mergulhado num caos que jamais havia experimentado. Eu relatei esta conversação em numerosas ocasiões e não parei, desde o linchamento do Guia, em outubro de 2011, de predizer aquilo que acontece hoje em dia.

A «teoria do caos»

Quando, em 2003, a imprensa norte-americana começou a referir a «teoria do caos», a Casa Branca ripostou evocando um «caos construtivo», insinuando que se iriam destruir estruturas de opressão para que a vida pudesse fluir em liberdade. Mas jamais Leo Strauss, nem o Pentágono até então, haviam usado esta imagem. Pelo contrário, segundo eles, o caos seria tal ordem que nada aí se pudesse estruturar, para além da vontade do Criador da Ordem nova, os Estados Unidos [3].

O princípio desta doutrina estratégica pode ser resumido assim : o modo mais simples para pilhar os recursos naturais de um país, durante um longo período, não é de o ocupar, mas o de destruir o Estado. Sem Estado, nada de exército. Sem exército inimigo, não há nenhum risco de derrota. Portanto, o objectivo estratégico dos militares dos E.U. e da aliança que ele dirige, a Otan, é exclusivamente o de destruir os Estados. O que acontece às populações atingidas não diz nada a Washington.

Este projeto é inconcebível para os europeus que, desde a Guerra Civil Inglesa, ficaram convencidos pelo Leviathan(Leviatã-ndT) de Thomas Hobbes, que é talvez preferível renunciar a algumas liberdades, ou até mesmo aceitar um Estado de tirania, do que ficar mergulhado no caos.

A União Europeia nega a sua cumplicidade nos crimes E.U.

As guerras no Afeganistão e no Iraque custaram já a vida a 4 milhões de pessoas [4]. Elas foram apresentadas perante o Conselho de Segurança como respostas necessárias «em legítima defesa», mas sabe-se agora que haviam sido planificadas bem antes do 11-de-Setembro num contexto muito mais amplo de «remodelagem do Médio-Oriente Alargado», e que as razões evocadas para as desencadear não foram senão fabricações propagandísticas.

É costume reconhecer os genocídios cometidos pelo colonialismo europeu, mas poucos são aqueles que actualmente admitem estes 4 milhões de mortos, apesar dos estudos científicos que o atestam. É que os nossos pais eram «maus», mas nós somos «bons» e não podemos ser cúmplices destes horrores.

É comum fazer troça deste pobre povo alemão que manteve até ao fim a sua confiança nos seus dirigentes nazistas e não tomou consciência, senão após a sua derrota, dos crimes cometidos em seu nome. Mas nós agimos exactamente da mesma forma. Conservamos a nossa confiança no nosso «Grande Irmão» e não queremos ver os crimes em que ele nos envolve. Seguramente, os nossos filhos se rirão de nós...

Os erros de interpretação da União Europeia

- Nenhum dirigente europeu-ocidental, absolutamente nenhum, ousou publicamente considerar que os refugiados do Iraque, da Síria, da Líbia, do Corno de África, da Nigéria e do Mali estejam fugindo de ditaduras, ao invés do Caos em que nós voluntariamente, mas inconscientemente, mergulhamos os seus países.

- Nenhum líder da europeu-ocidental, absolutamente nenhum, ousou publicamente considerar que os atentados «islamitas» que atingem a Europa são a extensão das guerras do «Médio-Oriente Alargado», mas que são comanditados por aqueles que, igualmente, comanditaram o caos nesta região. Nós preferimos continuar a pensar que os «islamitas» querem atacar os judeus e os cristãos, quando a imensa maioria das suas vítimas não são nem judias nem cristãs, mas muçulmanas. Com sobranceria, nós os acusamos de promover a «guerra de civilizações», quando o conceito foi forjado no seio do Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos e é estranho à sua cultura [5].

- Nenhum dirigente europeu-ocidental, absolutamente nenhum, ousou publicamente considerar que a próxima etapa será a «islamização» das redes de distribuição de drogas como no modelo dos Contras da Nicarágua vendendo as drogas na comunidade negra da Califórnia com a ajuda e sob as ordens da CIA [6]. Nós decidimos ignorar que a família Karzai retirou a distribuição da heroína afegã à máfia Kosovar e a encaminhou para o Daesh(Exército Islâmico- ndT) [7].

Os Estados-Unidos jamais quiseram que a Ucrânia se junte à União

As academias militares da União Europeia não estudaram a «teoria do caos», porque elas a isso foram interditas. Os poucos professores e pesquisadores que se aventuraram neste campo foram severamente sancionados, enquanto a imprensa qualificava de «conspiracionistas» os autores civis que a tal se interessavam.

Os políticos da União Europeia pensavam que os acontecimentos da praça Maidan eram espontâneos e que os manifestantes queriam deixar a órbita autoritária da Rússia e entrar no paraíso da União. Ficaram estupefactos aquando da publicação da conversa da sub-secretária de Estado, Victoria Nuland, evocando o seu controlo secreto dos acontecimentos e afirmando que seu objectivo era o de «f...a União» (sic) [8]. A partir daquele momento, eles não compreenderam mais nada do que se estava a passar.

Se eles tivessem permitido a livre pesquisa em seus países, eles teriam percebido que, ao intervir na Ucrânia e aí ter organizado a «mudança de regime», os Estados Unidos asseguravam-se que a União Europeia permaneceria ao seu serviço. A grande angústia de Washington, após o discurso de Vladimir Putin na Conferência sobre a Segurança em Munique de 2007, é que a Alemanha perceba onde está o seu interesse : não com Washington, mas sim com Moscovo [9]. Ao destruir progressivamente o Estado ucraniano, os Estados Unidos cortam a principal via de comunicação entre a União Europeia e a Rússia. Vós podeis virar e revirar, em todas as direções, a sucessão dos eventos, e não conseguireis achar-lhe um sentido diferente. Washington não deseja que a Ucrânia se junte à União, como o atestam as declarações da Srª. Nuland. O seu único objectivo é transformar este território numa zona de circulação perigosa.

A planificação militar do E.U.

Eis-nos pois face a dois problemas que se desenvolvem muito rapidamente : os atentados «islamistas» apenas começaram. Os migrantes triplicaram no Mediterrâneo em apenas um único ano.

Se a minha análise fôr exacta, nós vamos assistir ao longo da próxima década aos atentados «islamitas» ligados ao Médio-Oriente Alargado e à África copiados como atentados «nazis» relacionadas com a Ucrânia. Descobriremos, então, que a Al-Qaida e os nazis ucranianos estão conectados desde o seu congresso conjunto, em 2007 em Ternopol (Ucrânia). Na realidade, os avós de uns e de outros conheciam-se desde a Segunda Guerra Mundial. Os nazis haviam, então, recrutado muçulmanos soviéticos recrutados para lutar contra Moscovo (foi o programa de Gerhard von Mende no Ostministerium). No fim da guerra, uns e outros foram recuperados pela CIA (o programa de Frank Wisner com a Amcomlib) para realizar operações de sabotagem na URSS.

As migrações no Mediterrâneo, que de momento são apenas uma questão humanitária (200 000 pessoas em 2014), vão continuar a crescer até se tornarem um sério problema económico. As recentes decisões da União de ir afundar os navios dos traficantes na Líbia não servirão para erradicar as migrações, mas para justificar novas operações militares para manter o caos na Líbia (e não para o resolver).

Tudo isso causará grandes problemas à União Europeia, que parece hoje em dia um refúgio de paz. Está fora de questão para Washington destruir este mercado que lhe continua a ser indispensável, mas interessa-lhe certificar-se que ele jamais se colocará em posição de poder competir face a si, e limitar assim o seu desenvolvimento.

Em 1991, o presidente Bush-pai encarregou um discípulo de Leo Strauss, Paul Wolfowitz (então desconhecido do grande público), de elaborar uma estratégia para a era pós-soviética. A «Doutrina Wolfowitz» explicava que a supremacia dos Estados Unidos sobre o resto do mundo exige, para ter êxito, de controlar à rédea curta a União Europeia [10]. Em 2008, aquando da crise financeira nos Estados Unidos, a presidente do Conselho Económico da Casa Branca a historiadora Christina Rohmer, explicou que a única maneira de salvar os bancos era fechar os paraísos fiscais de países terceiros, depois causar perturbações na Europa de modo a que os capitais fugissem para os Estados Unidos. Em última análise, Washington propõe-se hoje em dia a fundir o NAFTA e a União Europeia, o dólar e o euro, e a rebaixar os Estados-Membros da União ao nível do México [11].

Infelizmente para si próprios, nem os Povos da União Europeia, nem os seus dirigentes têm a consciência do que o presidente Barack Obama lhes prepara.

Thierry Meyssan* - Tradução AlvaRede Voltaire

*Intelectual francês, presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana e russa. Última obra em francês: L’Effroyable imposture: Tome 2, Manipulations et désinformations (ed. JP Bertrand, 2007). Última obra publicada em Castelhano (espanhol): La gran impostura II. Manipulación y desinformación en los medios de comunicación(Monte Ávila Editores, 2008).

Notas
[1] «Depois de 42 anos, Andy Marshall deixa o Pentágono», Rede Voltaire, 26 de janeiro de 2015.
[2] “Selective Intelligence” (“Inteligência Direcionada”-ndT), Seymour Hersch, The New Yorker, May 12, 2003.
[3] “Stumbling World Order and Its Impacts” (Ing-«Ordem Mundial Vacilante e as suas Repercussões» - ndT), by Imad Fawzi Shueibi, Voltaire Network, 5 April 2015.
[4] « 4 millions de morts en Afghanistan, au Pakistan et en Irak depuis 1990 » (Fr- «4 Milhões de mortos no Afeganistão, Paquistão e no Iraque desde 1990»- ndT), par Nafeez Mosaddeq Ahmed, Traduction Maxime Chaix, Middle East Eye (Royaume-Uni), Réseau Voltaire, 11 avril 2015.
[5] “O "choque de civilizações"”, Thierry Meyssan, Tradução Resistir.info,Rede Voltaire, 4 de Junho de 2004.
[6] Dark Alliance, The CIA, the Contras and the crack cocaine explosion ( Ing- «Aliança Maléfica, A Cia, os Contras e a explosão do tráfico de cocaina»- ndT), Gary Webb, foreword by Maxime Waters, Seven Stories Press, 1999.
[7] « La famille Karzaï confie le trafic d’héroïne à l’Émirat islamique » (Fr- A Família Karzai e o tráfico de heroína para o Emirado islâmico»-ndT),Réseau Voltaire, 29 novembre 2014.
[8] « Conversation entre l’assistante du secrétaire d’État et l’ambassadeur US en Ukraine » (Fr- «Conversa entre a assistente do secretário de Estado e o embaixador dos E.U. na Ucrânia»- ndT), par Andrey Fomin, Oriental Review (Russie), Réseau Voltaire, 7 février 2014.
[9] “O carácter indivisível e universal da segurança global”, Vladimir Putin, Tradução Resistir.info, Rede Voltaire, 11 de Fevereiro de 2007.
[10] O documento mantêm-se classificado, mas o seu conteúdo foi revelado em « US Strategy Plan Calls For Insuring No Rivals Develop» (Ing-«Plano Estratégico E.U. Exige a Certeza que Nenhum Rival se Desenvolva»-ndT), por Patrick E. Tyler, New York Times de 8 de março de 1992. O quotidiano publica igualmente extensos extractos na página 14 : «Excerpts from Pentagon’s Plan : "Prevent the Re-Emergence of a New Rival"» (Ing-«Excertos do Plano do Pentágono: “Previna-se a Reemergência de um Novo Rival”»- ndT). Informações suplementares são publicadas em «Keeping the US First, Pentagon Would preclude a Rival Superpower» (Ing- «Mantendo os E.U. na Dianteira, o Pentágono Impediria um Rival como Superpoder»- ndT) por Barton Gellman, The Washington Post de 11 de março de 1992.
[11] « Attaque contre l’euro et démantèlement de l’Union européenne » (Fr- « Ataque ao Euro e desmantelamento da União Europeia»- ndT), par Jean-Claude Paye, Réseau Voltaire, 6 juillet 2010.

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