segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Portugal. MENTIROSOS



Rui Sá* – Jornal de Notícias, opinião

Todos recordamos que nos meses que precederam as eleições de 4 de outubro, o Governo, o PSD e o CDS gritavam aos quatro ventos que a crise estava ultrapassada, apresentando diversos indicadores que "demonstravam" esse "facto".

O desemprego estava em queda. O défice iria ser de 2,7%. O aumento da receita fiscal ia permitir a devolução de grande parte da sobretaxa sobre o IRS. O Serviço Nacional de Saúde estava cada vez mais eficiente. O Banif não ia ser um problema.

Nem três meses passados das eleições (dois dos quais com governos PSD/CDS), a verdade aí está, nua e crua. O desemprego aumentou, sendo evidente que muitos despedimentos coletivos de grandes dimensões foram adiados pelas entidades patronais para depois das eleições - contributo do patronato para a grande farsa da "recuperação económica".

A meta dos 2,7% do défice não será cumprida, sendo que a sua diminuição se deve ao "colossal" aumento de impostos e menos à despesa. E, como pudemos ver pelo caso da trágica morte de um jovem no Hospital de S. José porque não havia neurocirurgiões ao fim de semana, os cortes na despesa (e não apenas no SNS) foram mais na farinha do que no farelo (como referi numa avaliação que no JN fazia aos governantes, Nuno Crato, na destruição da escola pública, comportava-se como um elefante em loja de porcelanas, enquanto Paulo Macedo, na destruição do SNS, trabalhava com pezinhos de lã - mas os resultados eram os mesmos e estão à vista!...).

A prometida grande devolução da sobretaxa do IRS passou para 0% com a mesma rapidez com que o dia 4 de outubro ia ficando para trás.

O Banif passou a representar um custo para os contribuintes de 3 mil milhões de euros. Numa solução em que, mais uma vez, os lucros ficam com os acionistas e os prejuízos com o Estado! (Perante este descalabro do setor bancário, não é, no mínimo, razoável que se discuta o controlo público da Banca?). Ou seja, aqueles que ainda se referem como "legítimos" herdeiros do direito de governar e que se sentem usurpados nesse direito não conseguem enxergar quão ilegítimas foram as mentiras com que tentaram enganar as pessoas.

Mas a farsa continua e, agora, é Marcelo Rebelo de Sousa, que tão bem defendeu o Governo da coligação PSD/CDS durante os últimos quatro anos, que, com ar compungido (mas espírito de abutre), vai ao Hospital de S. José dizer que não é "bom princípio" fazer cortes no SNS...

Por isso desejo que, em 2016, se continue a castigar os mentirosos.

*Engenheiro

Deputada do Podemos torna-se a primeira mulher negra a ser eleita para o parlamento espanhol



Em Portugal já há um deputado negro desde 2002. E as legislativas de outubro trouxeram representantes de outras minorias para o Parlamento. Em Espanha, só agora esse caminho começa a ser feito.

“Já estava na altura, não!?” Rita Bosaho nasceu dez anos antes da morte de Franco, na Guiné Equatorial. Quarenta anos depois da morte do ditador, conseguiu um feito até agora inédito na história política de Espanha: tornou-se a primeira mulher negra a ser eleita para o Congresso dos Deputados. “Já estava na altura, não?”, riu-se durante a campanha, numa entrevista ao El País. Já depois das eleições, nas múltiplas entrevistas que tem dado, sublinhou sempre uma mesma ideia: isto “não devia ser notícia” e é uma coisa que “chega demasiado tarde”. Em Portugal, há um deputado negro desde 2002 (Hélder Amaral, do CDS) e, este ano, chegaram ao Parlamento um deputado em cadeira de rodas e uma invisual.

Rita Bosaho foi a cabeça de lista de uma coligação liderada pelo Podemos em Alicante, na região de Valência. Ela e mais duas pessoas dessa candidatura vão sentar-se no parlamento espanhol a partir de janeiro, altura em que começam os trabalhos. Para Rita, apesar do simbolismo do momento, vai ser tão normal como para qualquer outro deputado. Enfermeira, atualmente com 50 anos, chegou a Espanha na década de 1970 e vive há 20 anos em Alicante, onde trabalhou em organizações que desenvolvem “projetos de integração para mulheres imigrantes e ciganas”. É e sente-se tão espanhola como os espanhóis que nasceram na Península Ibérica.

Muitas coisas têm de mudar se ainda chama a atenção que uma pessoa de raça negra, hispanoguineense, porque culturalmente sou espanhola, seja deputada. É um exemplo de que é preciso que a sociedade avance”, disse ao El Diario.

Em Espanha, 15% da população tem origem imigrante e dois milhões de pessoas nascidas no estrangeiro têm cidadania e direito a votar. Isso não se traduz no parlamento, onde apenas 1% dos deputados representam as populações imigrantes. Que o primeiro eleito negro seja, ao mesmo tempo, uma mulher, é algo que Rita Bosaho não considera irrelevante. “Há que promover políticas de igualdade, tanto para as minorias como para as mulheres”, disse ao site 20 minutos. A cultura patriarcal, em que o homem assume um papel mais relevante na sociedade, “origina preconceitos, racismo e paternalismo”, acrescentou.

Na Guiné Equatorial onde nasceu Rita, então uma colónia espanhola (só deixaria de o ser três anos depois), o tio foi presidente da assembleia e usou a política para lutar pelos direitos do povo. Apoiante declarado de Franco, Enrique Gori Molubela acabou por ser determinante na independência da Guiné Equatorial, mas não pôde gozar o feito durante muito tempo. Acusado juntamente com outras individualidades de tentar matar o primeiro ditador daquele país, Francisco Macías Nguema, foi brutalmente assassinado na prisão. O segundo ditador, que ainda está no cargo, Teodoro Obiang, obrigou Rita e a família a fugir.

Gostava que, de uma vez por todas, o governo espanhol tivesse umas conversas com o governo da Guiné Equatorial sobre direitos humanos e liberdade, porque neste momento [as pessoas] não têm nenhum dos dois naquele país. Desde que a Guiné se tornou independente de Espanha, não houve um só dia de liberdade. Tem de se pensar que relações se estabelecem com governos ditatoriais”, disse Rita também ao El Diario.

Agora, no parlamento espanhol, a primeira deputada negra promete usar o mandato que os eleitores de Alicante lhe deram para defender os imigrantes, lutar contra a xenofobia e as desigualdades, sejam quais forem. “Tenho uma grande preocupação pelos direitos humanos”, afirmou, acrescentando que uma das prioridades do seu trabalho passa por fazer da violência de género “uma questão de Estado”. Por outro lado, Rita Bosaho quer trabalhar pela “blindagem” dos direitos sociais. Ou seja, que estes nunca sejam postos em causa.

João Pedro Pincha - Observador

OS ESTRANGEIRISMOS NA LÍNGUA PORTUGUESA




Acabei de ouvir numa televisão portuguesa um ministro português dizer algo como “(…) têm de “setocar” (…)”. Como reconheço, sempre que isso o exija, a minha ignorância e o meu desconhecimento de muitas palavras e expressões portuguesas tentei procurar nuns dicionários (por acaso dois e bem reconhecidos) o que quereria dizer aquela palavra sublinhada. Nada! Népia! Nothing (como está na moda…)!

Bom, se os dicionários não me ajudam, bota lá uma ida ao “sabe tudo”: o Google. Surpresa, também não conhecia esta palavra.

Bolas se um ministro, um membro responsável governativo e representante nacional (de qualquer que seja o país) perante os jornalistas e em representação do seu país (ou de outro qualquer, neste caso, era português) envia para o éter esta palavra é porque existe; não será?

Mas como o Google quando não reconhece alguma palavra dá-nos sempre uma pista, fiquei a aguardar; poderia ser um brasileirismo. Como se sabe os brasileiros, nós agora também usamos muito deste exagero, usam muitos estrangeirismos, principalmente anglicismos, para mostrar, penso eu – talvez esteja errado –, alguma sabedoria intelectual utilizando-as como expressões de português, de uso corrente. Isto quando não usam mesmo palavras estrangeiras nos seus vocábulos.

Ora o Google também me esclareceu… NADA! Ainda avançou se eu não quereria dizer… «Stock»? Coitados dos ianques, tipo “português”, ficaram bué malucos!

Pois, é que uma coisa será adoptar como nossas, palavras que não existiriam no léxico português; outra é havê-las e usar com denodo um estrangeirismo. Nos primeiros casos, estava a recordar de “abat-jour” “anorak”, “atelier”, “ayatollah” “badminton”, “ballet”, “barman”, “blog”, “cartoon”, “donut”, “doping”, “dossier”, “dumping”, “eau-de-toilette”, “fair-play”, “gulag”, “self-service”, “sexy”, “soutien” e muitas e muitas dezenas de palavras nas mesmas condições. A maioria manteve a palavra de origem, outras foram aportuguesadas.

Para o segundo caso, estava a recordar de uma, actualmente muito em voga nas cidades e na comunicação social brasileiras, o “impeachment”! Palavra que, por acaso, tem dupla tradução em português. Uma de raiz brasileira (cassação) e duas de raiz continental (destituição ou impugnação). Mas é mais intelectual dizer um estrangeirismo!

Os portugueses têm uma dupla expressão para estes pseudo-intelectuais: parolice!

E nós gostando muito de mostrarmos essa vertente pseudo-intectual brasileira – adoptada em muitas telenovelas que se veem no burgo – estamos a copiar desenfreadamente os estrangeirismos. É bué curtido!

Ora aqui (ou será aki? – com sms ou restrições métricas por causa do Twitter, por vezes já nem sei como se escreve português) está uma palavra nossa adoptada pelos brasileiros exportada para Portugal, v ia telenovelas brasileiras e considerada como brasileira, e recuperada por nós pela mesma via! Bué!!!

Temos um riquíssimo léxico nas nossas línguas nacionais para usarmos sem parcimónia em frases de vocabulário português. Se de facto o temos, e nas nossas mais variadas línguas nacionais, porquê usarmos anglicismos, galicismos ou, mesmo, castelhismos (ou espanholismos – falam castelhano e não, como erradamente se costuma dizer, espanhol)?

Está tudo “Malaique” ou como dizem os nossos Kotas sobre estes pseudo-intelectuais: Ãhi! Anjalumba! (do umbundo: Irra! Vaidade!)

E porque estamos na época tenham todos Bué Festas Felizes e um Nice Merry Xtmas. Upps. Desculpem estava a escrever e ver um site (upsss… portal) brasileiro e fui numa wave bué flat (uppsss… desculpem, numa calma onda)!

Na realidade o que queria dizer e escrever era que desejo a todos os funcionários, colaboradores e leitores do Novo Jornal, um Feliz Natal e um Ano Novo 2016, se não melhor – o que se espera e deseja sempre –, pelo menos que não seja pior.
A todos, Bué Festas Felizes!

*Investigador e Pós-doutorando

Publicado no semanário Novo Jornal, edição 412, de 23 de Dezembro de 2015, página 19 (1º caderno)
 

**Eugénio Costa Almeida – Pululu - Página de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em Relações Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo Relações Internacionais -; nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos de opinião, relacionados com a actividade académica, social e associativa.

A EUROPA E O MEDO (de si própria e dos outros)



Rui Peralta, Luanda

A Europa de hoje sofre uma velha ameaça: o fascismo, com novas caras mas de tradicionais famílias. Hitler e Mussolini e os actores secundários da tragedia fascista europeia (Salazar, Franco, os coronéis gregos e outros actores secundários) parecem ter espalhado o seu ADN decrépito e degenerado. A democratização do projecto europeu atravessa maus lençóis e os descendentes do fascismo assumem posições de ataque, prontos para a maratona.

2015 fica marcado na Europa e na construção da Europa Democrática, como um ano de grandes clivagens, marcado pelo terrorismo (o de Estado e o do fascismo islâmico) e pela vaga de migrantes (também uma consequência do fascismo islâmico e do terrorismo de Estado). O medo é sentimento dominante. A Europa teme a China, teme a Rússia, teme as comunidades imigrantes, teme os refugiados (que acreditam nos valores democráticos que a Europa espalhou pelo mundo) teme o Islão, teme os pobres, teme a 3ª e a 4ª idade, teme a criatividade e a inovação, teme o a democratização da vida social e económica, teme o mercado aberto, é incapaz de discernir a diferença entre Estado e sector público, teme…o Estado Democrático de Direito, uma vez que na Europa iniciou-se o processo de reconversão deste em Estado Oligárquico de Direito.

É um medo com causas reais? Tanto como virtuais! Os desafios da economia-mundo são sempre vastos, amplos e acumulados e apenas podem ser resolvidos através de uma óptica cidadã, nunca sob a luneta míope do Estado ou nas neuroses do mercado adulterado submetido às lógicas perversas da burocracia e das velhas elites oligárquicas (as politicas e as económicas). Vivem os europeus numa Europa em pânico, que continua a não conseguir gerar uma identidade europeia e que continua submetida aos ditames das nações europeias, do bolor do lixo identitário.

Os exemplos de ataques reais á democracia na Europa são vários e de diversa índole. Observe-se o que se passou nas ultimas eleições na Polónia, com a vitória do pterossauro Duda, com a FN em França, onde pode-se acrescentar o estado de emergência e a tentação de cortar o Wi-Fi público, as experiências com contas bancárias do Barclays no Chipre, os conluios entre os oligopólios e os Estados para limitar liberdades públicas e privadas, sendo que tudo isto é consentido pelos cidadãos, submetidos á insegurança e ao receio. É a neurose do medo incutida nos amplos sectores da sociedade.

Feitas as contas, o que resta do projecto europeu? Pouco e cada vez menos. Muito foi afogado pelo medo: a união politica, a união fiscal, a gestão da eurolândia, a Europa Social…O que surge, firme que nem um rochedo incrustado na vergonha de cada europeu, é a Europa-Fortaleza, cada vez mais militarista, fascizante e concentracionária. O mal está feito. Em todas as frentes europeias as portas e janelas estão fechadas, os protagonistas são de péssima qualidade, os argumentistas enredam-se nas virgulas e, pelos caminhos que os actuais carroceiros percorrem, não haverá soluções ou talvez só uma: a Final.

É evidente que por outros caminhos haverá outras alternativas. E, sendo a Europa uma realidade pluridimensional (para fúria dos seu unidimensionais adversários), plural, democrática e participativa outros trilhos serão percorridos e outros rumos serão traçados. O projecto europeu poderá ser reformulado e os seus princípios retomados. A Europa-Fortaleza deverá ser destruída e das suas ruinas deverão ser preservadas as pedras que constituem a memória da vergonha.

Portugal. TODOS ESSES GAJOS QUE NOS TÊM ROUBADO E ANDAM À SOLTA



É Nicolau Santos num Expresso Curto. Passou o natal e é isto: temos no sapatinho todos esses gajos que nos roubam mas continuam à solta. À solta e continuando a roubar-nos. Lembro agora uma que o Menino Jesus me soprou ao ouvido. Porque é que houve interferência sinuosa de Cavaco Silva no processo de Dias Loureiro? Porque não incomodaram mais o protegido do PR? “Parem as investigações”. E pararam. Pois.

Quem não deve não teme. Bla, bla, bla. Sou muito honesto. Bla, bla, bla… Pois.

Redação PG

Bom dia, este é o seu Expresso Curto 

Nicolau Santos - Expresso

Os Emídios Catuns que nos pregaram um calote de 6,3 mil milhões e andam à solta

Bom dia.

Desculpem, mas não há peru, rabanadas e lampreias de ovos que me façam passar o engulho da fatura que neste final do ano veio parar outra vez aos bolsos dos contribuintes por mais um banco que entrega a alma ao criador, no caso o Banif, no caso mais 3 mil milhões. É de mais, é inaceitável, é uma ignomínia para todos os que estão desempregados ou caíram no limiar da pobreza por causa desta crise e mais uma violência brutal para os que continuam a pagar impostos (e que são apenas cerca de 50% de todos os contribuintes).

Todos nos lembramos do cortejo dos cinco maiores banqueiros portugueses (Ricardo Salgado, Fernando Ulrich, Nuno Amado, Faria de Oliveira e Carlos Santos Ferreira) a irem ao Ministério das Finanças e depois à TVI exigir ao então ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, para pedir ajuda internacional. Todos nos lembramos como o santo e a senha da altura era o da insustentável dívida pública portuguesa por erros de gestão do Governo de José Sócrates. Todos nos lembramos das sucessivas reafirmações de que a banca estava sólida por parte do Banco de Portugal e do governador Carlos Costa. Todos nos lembramos dos testes de stress aos bancos conduzidos pela Autoridade Bancária Europeia – e como os bancos nacionais passaram sempre esses testes. E depois disso BPI, BCP, CGD e Banif tiveram de recorrer à linha de crédito de 12 mil milhões acordada com a troika. E depois disso o BES implodiu – e agora o Banif também. E depois disso só o BPI pagou até agora tudo o que lhe foi emprestado. E antes disso já o BPN e o BPP tinham implodido. E a Caixa vai ter de fazer um aumento de capital. E o Montepio é uma preocupação. É de mais! Chega! Basta!

No caso do Banif, é claro que o governador Carlos Costa tem enormes responsabilidades na forma como o problema acabou por ter de ser resolvido. No caso do BES foi ele também que seguiu a estratégia da resolução, da criação do Novo Banco e do falhanço total dessa estratégia – a venda rápida que não aconteceu, a venda sem despedimentos que também não vai acontecer, os 17 interessados que afinal eram só três, as propostas que não serviam, e o banco que era para ser vendido inteiro e agora vai ser vendido após uma severa cura de emagrecimento. É claro também que a ex-ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, tem responsabilidades diretas no caso, por inação ou omissão. E é claro que o ex-primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, geriu politicamente o dossiê.

Mas não confundamos os políticos e o polícia com os bandidos, com os que levaram a banca portuguesa ao tapete. E para isso nada melhor do que ler o excelente texto que o Pedro Santos Guerreiro e a Isabel Vicente escreveram na revista do Expresso da semana passada com um título no limite mas que é um grito de alma: «O diabo que nos impariu» - ou como os bancos nacionais destruíram 40 mil milhões desde 2008. Aí se prova que houve seguramente muitos problemas, mas que a origem de tudo está no verdadeiro conúbio lunar que se viveu entre a banca e algumas empresas e alguns empresários do setor da construção. Perguntam os meus colegas: «Sabe quem é Emídio Catum? É um desses empresários da construção, que estava na lista de créditos do BES com empresas que entretanto faliram. Curiosamente, Catum estava também na lista dos maiores devedores ao BPN, com empresas de construção e imobiliário que também faliram». E como atuava Catum? «O padrão é o mesmo: empresas pedem crédito, não o pagam, vão à falência, têm administradores judiciais, não pagam nem têm mais ativos para pagar, o prejuízo fica no banco, o banco é intervencionado, o prejuízo passa para o Estado». Simples, não é, caro leitor?

A pergunta que se segue é: e o tal de Catum está preso? Não, claro que não. E assim, de Catum em Catum, ficámos nós que pagamos impostos com uma enorme dívida para pagar que um dia destes vai levar o Governo a aumentar de novo os impostos ou a cortar salários ou a baixar prestações sociais. Mas se fosse só o Catum… Infelizmente, não. Até as empresas de Luís Filipe Vieira deixaram uma dívida de 17 milhões do BPN à Parvalorem, do Estado, e tinham ainda por pagar 600 milhões de crédito do BES. O ex-líder da bancada parlamentar do PSD, Duarte Lima,deixou perdas tanto no Novo Banco como no BPN. Arlindo Carvalho, ex-ministro cavaquista, também está acusado por ilícitos relacionados com crédito concedido pelo BPN para compra de terrenos. E um dos homens fortes do cavaquismo, Dias Loureiro é arguido desde 2009 por compras de empresas em Porto Rico e Marrocos, suspeita de crimes fiscais e burlas. Mas seis anos depois, o Ministério Público ainda não acusou Dias Loureiro, nem o processo foi arquivado.

Dos 50 maiores devedores do BES, que acumulavam um crédito total de dez mil milhões de euros, «o peso de construtores e promotores imobiliários é avassalador». No BPN, «mais de 500 clientes com dívidas iguais ou superiores a meio milhão de euros deixaram de pagar». E a fatura a vir parar sempre aos bolsos dos mesmos. Por isso, o artigo de Pedro Santos Guerreiro e Isabel Vicente é imperdível. Para ao menos sabermos que o que aconteceu não foi por acaso. Que muita gente não pagou o que devia ou meteu dinheiro ao bolso – e esperou calmamente que o Estado viesse socializar os prejuízos enquanto eles privatizaram os lucros.

OUTRAS NOTÍCIAS

Lá fora, a notícia mais importante é a tomada pelo exército iraquiano do controlo da cidade de Ramadi, ocupada pelo Daesh desde maio deste ano, ao conquistar o antigo edifício governamental que até agora funcionava como centro de operações dos terroristas. É o fim da campanha militar iniciada no dia 22, quando o Exército iraquiano, apoiado por aviões da coligação internacional liderada pelos Estados Unidos, conseguiu alcançar o centro da cidade.

Por seu turno, a NATO vai enviar aviões para proteger o espaço aéreo turco. Os aparelhos de vigilância vão ser transferidos da base aérea alemã de Geilenkirchen para a base de Konya, localizada no sul da Turquia. A decisão implica o envio de soldados alemães para o estrangeiro, mas não vai passar pelo Parlamento do país.

A forma de gerir a questão dos refugiados na Europa continua a dividir os governos do Velho Continente. O presidente da República Checa, Milos Zeman,disse taxativamente: «Estou profundamente convencido de que estamos perante uma invasão organizada e não um movimento espontâneo de refugiados». E acrescentou que, embora seja «possível» sentir compaixão pelas crianças, idosos e doentes que chegam de países em guerra, o mesmo não se pode dizer sobre os refugiados mais jovens: «A grande maioria dos migrantes ilegais são homens jovens, solteiros e de boa saúde. Pergunto-me por que não estão estes homens a pegar em armas e combater pela liberdade dos seus países, enfrentando o Estado Islâmico».

Para a ONU, pelo contrário, «o grande desafio é integrar os migrantes». «É vital investir na educação» dos refugiados que receberam direito de asilo, garante o porta-voz da organização intergovernamental.

Entretanto, o Japão e a Coreia de Sul chegaram a acordo sobre as escravas sexuais coreanas que foram obrigadas a servir os soldados do exército nipónico durante a II Guerra Mundial. O primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, pediu desculpa pelas chamadas «mulheres de conforto» e o Japão vai criar um fundo para indemnizar as sobreviventes e as suas famílias.

Por cá, na guerra dos direitos televisivos para a transmissão dos jogos de futebol, depois da NOS ter chegado a acordo com o Benfica por 400 milhões em dez anos, a MEO subiu a parada: 457,5 milhões para o Futebol Clube do Porto também por dez anos. Contudo, os acordos não são exatamente idênticos e o Jornal de Negócios tenta fazer a comparação. Resta agora saber o que irá o Sporting conseguir. E o Braga. E o Guimarães. E outros clubes. Porque o campeonato não se joga apenas com três e se uns tiverem cada vez mais dinheiro e outro menos, isso quer dizer que será cada vez menos competitivo e menos interessante. O que é mau para o negócio.

Uma boa notícia: só 1% das câmaras vão cobrar mais IMI em 2016. A maioria das autarquias do país optou por manter em 2016 as mesmas taxas de IMI cobradas este ano. Houve 46 que decidiram mesmo descer e apenas três subiram. Quase metade ficaram-se pela taxa mínima, de 0,3%.

Outra boa notícia: três em cada quatro empresas querem contratar em 2016, motivadas pela saída da troika e a queda da taxa de desemprego. Os salários deverão manter-se quase inalterados, mas há uma tendência de aposta em benefícios

O treinador do Sporting, Jorge Jesus, deu uma entrevista ao Jornal da Noite da TVI e considerou Benfica e Porto os favoritos à conquista do título de campeão nacional de futebol, «com o Sporting a entrar também de forma muito séria nesse duelo». E ontem à noite manteve-se uma tradição: um jantar de apoio à recandidatura de Jorge Nuno Pinto da Costa, 77 anos, à presidência do FC Porto. E outra tradição: o humor do presidente, quando as coisas não lhe correm de feição. Sobre os assobios para o treinador Julen Lopetegui, disse: «Se com os assobios chegou a primeiro, então que continuem a assobiar mas logo desde o princípio, porque dá sorte».

E por falar em assobios, se o leitor tem a mania de mandar piropos às mulheres que vê na rua, então cuide-se e mude de comportamento. Desde agosto que uma alteração ao Código Penal, que passou despercebida, criminaliza com penas de prisão até 3 anos os tais piropos ou «propostas de teor sexual», como as caracteriza a lei.

No cinema, o mais recente filme da saga Star Wars tornou-se, nos Estados Unidos, o mais visto de sempre no dia de Natal, e tornou-se, globalmente, o mais rápido a gerar mil milhões de dólares em sala. Agora, é esperado que ultrapasse Avatar e Titanic e se torne recordista absoluto de bilheteira.

Enquanto escrevo, as fortes rajadas de vento fazem-se ouvir através de estridentes assobios. O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) colocou 12 distritos sob aviso amarelo, devido à previsão de vento forte entre domingo e segunda-feira,com rajadas de 70 a 100 quilómetros por hora. Lisboa não está na lista. E o mau tempo anda à solta pelo mundo: há cheias na Europa, Ásia e América Latina, onde o «pior El Niño em 15 anos provoca cheias devastadoras».

FRASES

"Sabe para onde vai o Mourinho? Para o Manchester United! Cheira-me, cheira-me, cheira-me". Marcelo Rebelo de Sousa, em Beja, em pré-campanha presidencial, SIC

"O Estado social é para mim, desde sempre, uma prioridade". Idem

"Arranja-me uma colherzinha para eu provar o puré de batata?".Marcelo Rebelo de Sousa, na escola de apoio a crianças desfavorecidas Vidas Coloridas, Beja, SIC

"Todos temos consciência que é necessário um Serviço Nacional de Saúde a funcionar como um relógio". Maria de Belém, em pré-campanha presidencial na Feira da Brandoa, SIC

"Era evidente que cortes a seguir a cortes acabava por dar mau resultado". Sampaio da Nóvoa em Reguengos de Monsaraz e em pré-campanha presidencial, sobre a morte de um jovem de 29 anos por falta de uma equipa de cirurgia, SIC

"(As medidas do Governo no caso Banif) não são de um tempo novo, são da velha política, são da política do antigamente". Edgar Silva, candidato comunista à Presidência da República, dizendo do Governo aquilo que o PCP não ousou fazer até agora, jornal i

O QUE NÃO LI MAS VOU LER

João Lobo Antunes é um dos maiores neurocirurgiões mundiais. Mas é muito mais do que isso. É um pensador. Reflete sobre a vida com a delicadeza mas também a certeza com que usou durante décadas o bisturi. Abriu cérebros, cortou tumores, salvou milhares de vidas. Mas também tem a sua dose de fracassos, como reconhece. «Há um que me vem à memória com frequência. A doente ficou cega e eu percebi no ato cirúrgico que isso estava a acontecer. E não dá para rebobinar o filme». É isso que conta numa magnífica entrevista à minha colega Luciana Leiderfarb, publicada na E, a revista do Expresso, na semana passada, a propósito do lançamento recente do seu livro «Ouvir Com Outros Olhos» (Gradiva).

Conheço Lobo Antunes como pessoa pública. Não mais do que isso. Tenho por ele uma enorme admiração. Mas o seu livro sobre Egas Moniz, o primeiro Nobel português de medicina (e único até agora nesta área) provocou-me, por razões muito pessoais, um enorme desconforto. Lobo Antunes defende os métodos utilizados por Egas Moniz para tratar doentes com disfunções de personalidade ou outras doenças cerebrais – métodos que hoje seriam considerados bárbaros e muito questionáveis. Eu vi o meu pai ser vítima dos métodos de Egas Moniz. Aos 24 anos, após uns súbitos ataques epiléticos, o meu avô e pai dele enviou-o a Portugal (viviam em Angola) para fazer exames médicos com Moniz. Este decidiu fazer uma radiografia de alto contraste ao cérebro, utilizando para isso um medicamento denominado Torotraste, que continha substâncias radioativas. Nada descobriu e os ataques epiléticos passaram. Trinta anos depois, aos 54 anos, o meu pai morreu numa semana. Diagnóstico: cancro no fígado. Ele não bebia nem fumava. O cancro veio do Torotraste, que tinha substâncias radioativas, que passado alguns anos destruíam o fígado dos pacientes sujeitos ao tratamento, provocando tumores. Morreram muitas pessoas por causa do Torotraste. Provavelmente mais de mil. O meu pai foi dos que durou mais: 30 anos. Mas mesmo assim morreu demasiado novo, aos 54 anos. É este o meu desconforto com João Lobo Antunes. Mas não deixarei de comprar este seu novo livro.

E pronto, está servido o Expresso Curto e forte, como convém após uns dias de excessos alimentares e de grande paz de espírito. Amanhã, com a sua pena afiada, a sua inteligência acutilante e o seu estilo inconfundível está cá ao seu dispor o Pedro Santos Guerreiro, com um fantástico Expresso Curto.

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