Por
que razão o IEFP, que tem como missão apoiar os desempregados e encaminhá-los
para uma nova função compatível com as suas competências profissionais, os
trata como suspeitos?
Perder
o emprego é quase sempre uma desgraça. Não é apenas o rendimento que se perde,
é o quotidiano que se esfrangalha, é o isolamento que cresce e o sentimento de
utilidade que fica em causa.
Quem
recebe o subsídio passa ainda a ter de atestar, a cada quinze dias, a
permanência na sua morada oficial, apresentando-se no centro de emprego, na
Junta de Freguesia ou numa instituição que tenha protocolo com o Instituo de
Emprego. Como se tivesse cometido um crime e fosse arguido com termo de
identidade e residência. O não cumprimento, por duas vezes, da obrigação da
apresentação quinzenal, resulta na anulação da inscrição no Serviço de Emprego
e na perda do direito ao subsídio de desemprego.
Para
que raio serve esta humilhação? Por que razão o IEFP, que tem como missão
apoiar os desempregados e encaminhá-los para uma nova função compatível com as
suas competências profissionais, os trata como suspeitos?
Desde
há uns anos, com a disseminação do conceito de “empregabilidade”, introduziu-se
uma lógica de culpabilização do desempregado pela sua situação.
Multiplicaram-se os dispositivos que visam a “ativação dos beneficiários,
passou a punir-se os desempregados diminuindo o valor do subsídio ao longo do
tempo, como se a situação de desemprego não resultasse de escolhas de política
económica, mas sim de défices individuais e como se a solução para o desemprego
pudesse ser imputada exclusivamente aos próprios desempregados. Foi neste
contexto que surgiram as famosas “apresentações quinzenais”.
Dizem
os seus defensores que é um mecanismo de combate à fraude. Mas os
desempregados, os técnicos de emprego e os profissionais das Juntas sabem que é
apenas um calvário burocrático humilhante, cansativo e inútil. Até porque a
justiça e o controlo na atribuição do subsídio de desemprego já estão
garantidos por uma dezena de outras obrigações impostas na lei, cujo não
cumprimento implica a perda de subsídio: comunicar a alteração de residência e
a ausência do território nacional; aceitar o chamado “emprego conveniente” e o
perverso “trabalho socialmente necessário”; aceitar a formação profissional, o
plano pessoal de emprego, as medidas ativas de emprego; provar que se procurou
“ativamente” emprego, mostrando mails e carimbos das empresas; comparecer às
convocatórias do centro de emprego e às entidades para onde foi encaminhado por
aquele.
Em
Portugal, tristemente, a maior parte dos desempregados já não tem sequer acesso
ao subsídio de desemprego, porque teve trabalhos precários que não lhes
permitem aceder àquela prestação ou porque estão desempregados há demasiado
tempo e o subsídio já terminou. Nos centros de emprego, escasseiam as ofertas
de trabalho. Perante isto, conceber os desempregados como uma espécie de
preguiçosos, obrigados a demonstrar que procuram trabalho como quem procura
água no deserto e a fazerem prova de vida quinzenal não serve a fiscalização. É
apenas um desrespeito e uma humilhação inútil que as pessoas não merecem. Devia
acabar.
Artigo
publicado em expresso.sapo.pt em 8 de janeiro de 2015
José Soeiro - Dirigente
do Bloco de Esquerda, sociólogo. Em Esquerda.net
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