quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Angola. CARNAVAL É FESTA DO POVO



Jornal de Angola, editorial

Estamos em contagem decrescente para o desfile central da maior manifestação cultural dos angolanos que, de acordo com o calendário litúrgico, deve ter lugar na primeira terça-feira, cerca de quarenta dias antes da Páscoa.

Trata-se do Carnaval, uma festa que há trinta e oito anos celebra Angola, a sua cultura, as suas tradições e as suas conquistas como país independente, soberano e dono do seu destino. O Carnaval é a festa do povo, que resiste a todos os ventos, tempos e mudanças, conhecendo uma grande capacidade de adaptação e sobrevivência. 

É verdade que o Carnaval foi um legado da colonização, mas não é menos verdade que, com o  passar do tempo, as festas do Carnaval enraizaram-se profundamente na cultura angolana. Rapidamente a essência europeia do Carnaval cedeu espaço ao folclore  angolano com toda sua exuberância e engenho, celebrado por todas as classes da sociedade com dança e música da terra. Ocorreu, para alegria de milhares de angolanos, a angolanização do Carnaval, uma contribuição incalculável na resistência cultural do povo de Angola ante um legado colonial que tudo negava ao angolano. Inclusive o carácter simbólico e místico das festividades  deram rapidamente lugar à componente secular em que os excessos ao nível da dança, música e vestimenta se impuseram de forma notável. É o Carnaval, provavelmente a maior festa popular que nos primórdios da Angola Independente “agitava” bairros inteiros durante cerca de três dias até ao desfile central. E na Quarta-Feira das Cinzas o balanço era positivo a todos os títulos, salvo algumas situações de desaparecimento de crianças, ajustes de contas, e outras situações caricatas. Assim era a época de Carnaval. 

Durante os três dias do evento,  seis, sete e nove de Fevereiro, Angola inteira vai testemunhar a realização de festas em nome do Carnaval para honrar uma velha   tradição que precisa de ser preservada. As mudanças registadas ao longo de vários anos no que à celebração da efeméride diz respeito são compreensíveis à luz das transformações que a nossa sociedade conhece, sendo o mais importante assegurar a sua continuidade.

Não há dúvida de que em cerca de quarenta anos de festas e danças em nome do Carnaval muito se perdeu relativamente aos aspectos coreográficos, temas expressivos do cancioneiro carnavalesco, entre outros ricos atributos do nosso Carnaval. Mas o fundamental, como tem provado o tempo, tem a ver com o facto de  o Carnaval prevalecer como uma manifestação cultural cuja celebração tem passado de geração em geração um pouco por todo o país. Tal como anunciou o primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto, formulando a intenção de ver o Carnaval regressar aos tempos de maior rivalidade, no bom sentido, entre os grupos para a dignificação da festa, precisamos de regressar a essas tradições. 

Falando do Carnaval de Luanda, a maior e a mais expressiva demonstração da dança e música ligada à celebração, a festa mudou muito ao longo dos últimas duas décadas. A tradição carnavalesca da década de oitenta, em que grupos geriam todas as fases de organização até ao desfile central de forma autónoma, com o apoio das comunidades dos bairros, desapareceu e levou ao desaparecimento de muitos grupos. Muitos resistiram e fruto do apoio das instituições do Estado, a comemoração do Carnaval continua nos moldes actuais, com as inovações e mudanças próprias dos tempos modernos. Sendo a mudança inseparável da vida dos seres humanos, o fundamental tem sido que, relativamente ao Carnaval, as adaptações aos tempos modernos permitem a sobrevivência da festa.
  
Acreditamos que seja ainda possível resgatar a sua mística, numa altura em que muitas vozes alegam a necessidade de reformas nas modalidades em que decorre a organização da festa de Carnaval.

Esperamos que os bairros regressem ao período em que a realização do  Carnaval levava os bairros ao delírio ao som dos principais estilos musicais executados, o semba, a kabetula, a kazukuta, a dizanda e ao exibicionismo magnífico dos bailarinos e bailarinas dos diferentes grupos.  Auguramos que a celebração oficial em todo o país, concentrada nos locais tradicionais,  tenha sido precedida da apresentação espontânea nos bairros das diferentes cidades de Angola. Para complementar a celebração da festa do Carnaval, estão os famosos bailes de quintais ou de sala, realizados nas diversas ruas dos municípios, distritos e comunas em todo país,  oficialmente autorizados pelas autoridades da Cultura.

É bom saber que a Polícia Nacional e o Serviço de Protecção Civil e Bombeiros estão mobilizados, embora fosse igualmente importante que as famílias estivessem sensibilizadas para a  adesão à festa. À semelhança das décadas precedentes em que as populações se mobilizavam para a celebração, o envolvimento das populações é fundamental porque uma das matrizes do Carnaval é a natureza popular da celebração.

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