segunda-feira, 21 de março de 2016

PORTUGAL ENFRAQUECIDO, DE NOVO, NA CPLP



Paulo Guilherme – África Monitor, opinião

Bem se esforçou Augusto Santos Silva por relevar a “solução de consenso” sobre o próximo secretário executivo da CPLP - que não será indicado por Portugal, como os estatutos da organização claramente preveem – o que o bloco africano, com Angola à cabeça, rejeita. E, em boa verdade, a posição em que estava não era fácil, Mas depois do embaraçoss “atropelo” de Portugal na adesão da Guiné Equatorial à CPLP, em Julho de 2014, XIV reunião extraordinária do conselho de ministros da CPLP foi mais um sinal de fraqueza de Portugal.

Os estatutos são claros. E o argumento invocado por Angola era débil – um “acordo verbal” antigo para que o país-sede prescindisse do seu direito de nomear o secretário executivo, quando o sistema de rotação ditasse que era a sua vez. Brandindo um “princípio não escrito” de que não se recordava nenhum dos “cavalheiros” que presidiram à criação da organização (Marcolino Moco, Luís Fonseca…), a diplomacia angolana assumiu um duro o tom – como bem sabe fazer – basicamente acusando Portugal de usurpação. E Lisboa deixouse intimidar.

A propósito, o que seria se as organizações internacionais se passassem a reger por “acordos verbais” nunca antes invocados, em vez de pelo que está, de facto, escrito e assinado? E se os Estados Unidos invocassem um “acordo verbal” para que a partir de agora os secretários-gerais da ONU fossem escolhidos pelo seu Departamento de Estado?

Depois de Angola “partir a loiça”, o MNE Augusto Santos Silva foi contemporizando, desvalorizando, e agarrando-se a um “direito estatutário” - de que realmente dispunha. Direito esse de que afinal, a 17 de março de 2016 em Lisboa, acabou por prescindir. Portugal não vai indicar o próximo secretário executivo. Cede a vez a São Tomé, que por sua vez reparte o mandato (em 2018-2020) com Portugal.

Mas é pior do que isso: o meio-mandato com que Portugal saiu da reunião de Lisboa será o primeiro – e pode ser também o único. Porque ficou acordado que os estatutos terão de ser revistos no que diz respeito à rotação – e Portugal não parece ter quaisquer apoios à sua pretensão.

"O que ficará para o futuro - é outro termo do nosso acordo de hoje - é a necessidade, conveniência, de se rever o acervo normativo da CPLP, com o objetivo de eliminar quaisquer futuras divergências" de interpretação, disse Augusto Santos Silva. “Depois vamos acertar as regras para que, depois, isso seja resolvido para o futuro”, adiantou Georges Chikoty).

Só faltou Portugal assumir a existência do tal “acordo verbal”. Sai desta cimeira isolado, incapaz de reagir à postura agressiva de Angola, destituído de apoios. Angola, que curiosamente vive um período de fragilidade interna e externa, sai forte, à cabeça de um “bloco” africano coeso.

É bom de ver que a importância diplomática da CPLP para Portugal é mais simbólica (o poder do “bloco lusófono”) do que prática. E a situação foi-se encaminhando para um ponto em que um bloqueio institucional na nomeação do sucessor de Murade Murargy era a única alternativa à posição de força assumida por Angola. Porque a decisão teria sempre de ser tomada por consenso. 

Um bloqueio seria ainda mais prejudicial para a imagem de coesão do “bloco” da CPLP e, logo, para Portugal – cujo poder de influência externa se resumiria, ainda que simbolicamente, ao de uma Eslovénia ou Ilhas Quiribati. Se alguma coisa conseguiu assegurar neste processo foi que a CPLP continue a funcionar. Agora, só é preciso que CPLP seja mais do que um palco para consensos de última hora.

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