Ana
Sá Lopes – jornal i, opinião
As
coisas mudaram, o Bloco faz parte de uma maioria parlamentar, teve resultados
eleitorais extraordinários, mas tem um espectro em cima: a Europa.
A
maior parte dos comentadores políticos, eu incluída, levou um banho quando
decretou a decadência do Bloco de Esquerda, emaranhado em contradições
internas, com cisões estrondosas e divisões que pareciam irreconciliáveis.
Não
eram só os comentadores: dentro do próprio partido, poucos apostavam no sucesso
eleitoral de um partido que depois do afastamento de Francisco Louçã parecia
ter perdido a capacidade de se impor na agenda política. Numa entrevista que
deu ao i na véspera das eleições legislativas, um dos fundadores do partido,
Fernando Rosas, admitia que na situação em que a coisa estava era muito bom que
o Bloco viesse a ter 5%. Acreditava nas “meninas” para aguentarem o barco e não
o deixarem naufragar. Milagre: as “meninas” conseguiram o melhor resultado de
sempre do Bloco de Esquerda. Catarina Martins impôs-se como líder – o que nunca
tinha acontecido na liderança bicéfala que partilhou com João Semedo – e é hoje
protagonista da geringonça que quase todos os portugueses consideravam
impossível de pôr em prática. Antes, Mariana Mortágua na comissão parlamentar
do BES e como porta-voz para os assuntos de economia, e depois Marisa Matias
como candidata presidencial, provaram que era possível solidificar o partido
depois do afastamento dos fundadores. Tinha sido Miguel Portas, numa entrevista
que deu ao i dois anos antes da sua morte, a dizer que a salvação do Bloco
passava pelo afastamento dos fundadores. Estava certo.
As
coisas mudaram, o Bloco faz parte de uma maioria parlamentar, teve resultados
eleitorais extraordinários, mas tem um espectro em cima: a Europa.
Na
entrevista que publicamos nesta edição, Mariana Mortágua admite que o Bloco se
distanciou do Syriza, que já não sabe o que é o Syriza e que nem o próprio
Syriza já saberá o que é. Mas se, hipoteticamente, o Bloco chegasse ao poder
como partido mais votado o que restava? Para não se tornar no Syriza, apenas
sair. Esse é o espectro de que o Bloco já começa a conseguir falar.
Sem comentários:
Enviar um comentário