Alexandra
Campos - Público
Observatório
de Saúde diz que desigualdades aumentaram entre 2005 e 2014. Risco de adoecer
cresce devido aos baixos rendimentos e pouca escolaridade. “Continuam a ser os
mais pobres os mais doentes”.
As
desigualdades sociais em saúde agravaram-se nos últimos anos em Portugal. “Seja
qual for a doença, a desigualdade aumentou claramente entre 2005 e 2014,
independentemente do sexo e da idade”, concluem os investigadores do
Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS) no relatório de Primavera
que esta terça-feira é apresentado em Lisboa. Os riscos de adoecer aumentam
exponencialmente com a ausência de escolaridade, com os baixos rendimentos ou
nos idosos, sublinham. “Continuam a ser os mais pobres os mais doentes e os
mais doentes os mais pobres”, sintetiza José Aranda da Silva, um dos
coordenadores do observatório.
A
problemática das desigualdades em saúde é um principais temas em foco no
relatório de Primavera deste ano do OPSS - que não se pronuncia sobre as
políticas deste Governo por terem passado “apenas sete meses entre a posse” do
executivo e a conclusão do documento. O fenómeno das desigualdades é
determinante, até porque tem um impacto significativo na esperança de vida,
como provou um recente estudo publicado no Journal of American Medical
Association - que demonstrou que, entre 2001 e 2014, “os homens mais ricos
dos Estados Unidos da América viveram em média mais 14,6 anos do que os homens
mais pobres”.
Em
Portugal, este tipo de avaliação está por fazer. O que se sabe é que, em 2014
(Inquérito Nacional de Saúde) as pessoas sem formação apresentavam um “risco de
ter má saúde” seis vezes superior em comparação com as pessoas com mais
educação (ensino secundário ou mais). “Para o mesmo indicador, a desigualdade
parece ter aumentado no intervalo de dez anos, tal como para a doença crónica”,
sublinham os investigadores. Para se ter uma ideia, o risco de diabetes é mais
de quatro vezes superior no grupo sem formação secundária e superior. E
enquanto a prevalência desta doença na população em geral com mais de 15 anos
era 11,3% em 2014, passava para 24,1% se analisado o mesmo grupo etário
só com formação básica.
Sistematicamente
superiores ao observado noutros países europeus (em 2014, o “risco de má saúde
auto-reportada” para as pessoas sem educação era 6,5 vezes superior em Portugal
quando na Europa era 3,5 vezes superior), as desigualdades em saúde devem ser
combatidas através da aposta num sistema de educação de alta qualidade desde os
primeiros anos de vida, com programas sistemáticos de prevenção e rastreios,
com empregos de qualidade na idade adulta e com impostos e regulação, por
exemplo nas gorduras, sal e açúcar, lê-se no relatório.
“Procuram-se
novos caminhos”
Começando
com uma retrospectiva dos últimos seis anos, os investigadores do OPSS insistem
na necessidade da procura de “novos caminhos” - é esse aliás o título
deste relatório -, após os duros anos de crise económico-financeira que o país
atravessou.
Na
saúde mental, uma das áreas “mais fustigadas” pela crise económica e outro dos
temas em foco neste documento – que destaca o aumento dos suicídios, sobretudo
nos homens em idade laboral, e o problema da demência que afecta pelo menos 60
mil idosos –, os investigadores preconizam que se passe de uma concepção de
cuidados generalizados para “uma concepção de cuidados especializados”,
se reactive o Plano Nacional para a Saúde das Pessoas Idosas e se defina
um orçamento nacional para esta área.
Também
é abordada a questão de prescrição excessiva de bezodiazepinas (ansiolíticos e
hipnóticos). Recorda-se, a propósito, um recente estudo com doentes internados
num serviço de psiquiatria ao longo de um ano e que concluiu que 80% da amostra
apresentava valores correspondentes a oito comprimidos diários de diazepam, o
que é “deveras preocupante”.
Foi
igualmente avaliada a participação das associações de doentes na definição de
políticas de segurança, que parece ser ainda residual - por exemplo, apenas
7,5% das notificações de reacções adversas dos medicamentos são feitas por
pacientes. Seis associações de doentes foram ouvidas e as conclusões
também não são animadoras: há múltiplos constrangimentos à sua participação no
desenvolvimento de políticas para a segurança e faltam meios humanos e
financeiros. Aqui, defende-se a necessidade de definir o estatuto legal do
“doente perito”. “Se os doentes não forem envolvidos no sistema, isto vai por
água abaixo”, avisa Aranda da Silva.
A
falta de unidades de cuidados paliativos, num país em que 62% dos doentes morre
nos hospitais (cerca de 65 mil pessoas por ano), também merece censura.
Além dos números de camas e de apoio domiciliário de cuidados paliativos
continuar consideravelmente abaixo do recomendado, há muitas assimetrias
regionais, lamentam.
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