Sempre
que Bruxelas se aventurava por uma maior integração militar chocava de frente
com Londres. A saída britânica elimina um obstáculo, cria muitos outros, mas
permitiu já à União Europeia dar o primeiro passo para criar um quartel-general
europeu, ainda que camuflado e embrionário
Gisa
Martinho - Visão
tro
de comando” ou “quartel-general europeu” eram palavras interditas em Bruxelas
até há uns meses. A ideia de uma maior integração militar dos 28 esbarrava ou
no ‘veto’ de Londres ou na resistência dos estados em criar estruturas
similares às da NATO. A saída britânica da União Europeia (UE) e a chegada à
Casa Branca de um presidente que considera a Aliança Atlântica “obsoleta”
alterou o sentido de urgência militar da UE ou, pelo menos, retirou muitas
reservas. Assim nasceu, por unanimidade, o primeiro quartel-general europeu ou
o seu embrião, para driblar sensibilidades: nova capacidade de coordenação
(MPCC).
“É
uma célula de planeamento operacional e de coordenação para missões militares
não executivas, como as missões de treino que hoje existem na República
Centroafricana, Somália e Mali”, explica à VISÃO Isabel Nunes, Chefe de Equipa
Multidisciplinar do Centro de Estudos e Investigação do Instituto de Defesa
Nacional. Até hoje não havia um comando central neste tipo de missões – sem uso
da força –, ao qual é preciso recorrer em caso de défices ou imprevistos, como
falta de pessoal.
O novo órgão deve arrancar em abril, com uma equipa de 30 pessoas, e ser integrado no Estado-Maior da UE (EMEU) que funciona hoje na Avenida Cortenbergh, em Bruxelas. Sob a liderança do finlandês Esa Pulkkinen, que também comanda o EMEU, a nova célula assessora o corpo diplomático europeu e, com o tempo, ambiciona tutelar também missões executivas. Por enquanto, Londres é contra. Mas os ministros da Defesa da UE, que aprovaram no início desta semana o MPCC, prevêem rever o modelo até ao final de 2018, numa altura em que se espera ultimar o acordo de divórcio entre o Reino Unido e o resto da comunidade europeia.
Ao
lado de França, o reino britânico exibe o maior músculo militar da UE e daí os
estados-membros terem acordado para a necessidade de uma maior organização
militar. O Brexit, no entanto, está de longe de pôr fim a projectos conjuntos
ou parcerias militares entre os dois lados do Canal da Mancha. “A aprovação do
MPCC é reativa ao Brexit, mas o Reino Unido não tem interesse em ficar
marginalizado”, acredita Isabel Nunes. Portugal, por exemplo, advoga que
algumas estruturas “sejam inclusivas até para estados não-membros da UE ou que
deixem de o ser”, disse o ministro da Defesa, José Azeredo Lopes, depois da
reunião em Bruxelas.
A
área de Defesa é mais sensível para países que atravessam uma situação
económica frágil, como a portuguesa. Por sistema, Portugal assinala o interesse
em pertencer ao núcleo duro de uma cooperação estruturada permanente na área da
Defesa, mas tudo depende do esforço financeiro.O Governo português “é favorável
a um reforço progressivo e gradual” da dimensão militar, indicou Azeredo Lopes,
antes de sublinhar que os gastos militares enfrentam, como outras rubricas, o
colete de forças do Pacto de Estabilidade e o Tratado Orçamental. Portugal “tem
três militares no EMUE e um no gabinete do chairman do Comité Militar da União
Europeia”, adianta à VISÃO o ministério da Defesa, que antecipa “um incremento
das necessidades” e “novas vagas”.
Em
cima da mesa está também a criação de um Fundo Europeu de Defesa, para
financiar novas capacidades militares da UE. Uma parte, a da investigação, será
financiada pelo orçamento comunitário com 90 milhões de euros até 2020 – altura
em que dispara para 500 milhões anuais. Já a outra parte, a das novas
capacidades, tem um orçamento de referência de cinco mil milhões de euros por
ano, suportado não pelos estados-membros da UE mas pelos países participantes.
Ursula
von der Leyen, ministra da Defesa alemã, acredita que “os noruegueses têm
grande interesse, tal como os britânicos” em participar em certos projetos
militares ou missões.
Foto:
Yves Herman / Reuters
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