Martinho Júnior | Luanda
1-
Desde 4 de Abril de 2002 que em Angola se calaram as armas e as políticas de
Reconstrução Nacional, Reconciliação e Reinserção Social (integrando os
combates à fome, às doenças, ao analfabetismo e à pobreza), estão na ordem do
dia com êxitos minguados (se comparados às imensas aspirações nacionais) e em geometria
variável.
Está
a ser bastante penoso a Angola fugir da cauda dos Índices de Desenvolvimento
Humano para os Índices Médios de Desenvolvimento Humano, apesar dos esforços ao
longo dos últimos quinze anos de luta contra o subdesenvolvimento no país e
isso por causa dos nocivos impactos do capitalismo neoliberal por via do
choque, primeiro, depois por via da terapia.
Para
além da luta contra o subdesenvolvimento decorrente dessa paz relativa, Angola
só pode ser um activo advogado da paz em África, em várias direcções: Golfo da
Guiné, África Central, Grandes Lagos e África Austral…
As
suas projecções contudo têm falências gritantes enquanto Angola não introduzir
uma geoestratégia de desenvolvimento sustentável para o seu próprio espaço
nacional (com fulcro na Região Central das Grandes Nascentes, conforme tenho
advogado) e não se incluir em pelo menos duas iniciativas que se devem
incrementar na África Sub-Sahariana: a “Congo Basin Initiative” e a “Zambezi
Basin Initiative”, que poderão melhor aglutinar os esforços comuns a partir do
espaço SADC, no sentido de melhor equacionar as aproximações e abordagens em
relação às regiões dos Grandes Lagos, à “Niger Basin Initiative” e à “Nile
Basin Initiative”, onde Angola deveria ser pelo menos país observador.
As
abordagens angolanas carecem das componentes de análise dos factores
antropológicos, de forma a melhor compreender as divisões, tensões e conflitos
(e assim trabalhar por via da lógica com sentido de vida e da paz), ao mesmo
tempo que carecem de abordagens físico-geográficas-ambientais que traduzam a
interpretação correcta da dialéctica entre as regiões desérticas ou
semi-desérticas e as regiões tropicais ou equatoriais, para além das abordagens
históricas, sociológicas e outras que se deveriam fazer (como por exemplo a
constante análise das tendências migratórias dentro do continente e as razões
dessas migrações humanas, que se têm intensificado sob os impactos do
capitalismo neoliberal e dos decorrentes fenómenos de tensões, conflitos e
guerras).
A
norte Angola deveria privilegiar as relações com a Nigéria e com o Egipto,
tendo em conta os seus papeis geoestratégicos nas suas regiões, com o Egipto
também por causa do potencial papel na “rota da seda” para dentro de
África.
2-
Sendo imprescindível a formulação das iniciativas em relação ás bacias do Congo
e do Zambeze, Angola não pode esquecer que com fulcro na sua Região Central das
Grandes Nascentes, fluem seis caudais importantes:
-
Os caudais do Cuango e do Cassai, afluindo ao Congo a norte;
-
Os caudais do Luena, Luanguinga, Lungué Bungo e Cuando, afluindo ao Zambeze a
leste.
A
compreensão da necessidade de integração de Angola quer na “Congo Basin
Initiative” (à espera de formação) e na “Zambezi Basin Initiative” (ainda
em formação embrionária), inibe a compreensão da importância em Angola do
fulcro que constitui a Região Central das Grandes Nascentes, matriz da água
interior, assim como da importância das outras bacias hidrográficas: Cubango
(Okawango), Cuvelai, Cunene, Catumbela, Queve, Longa e Cuanza, as cinco últimas
decisivas para a maior densidade de ocupação do território nacional num
triângulo com base em toda a costa do Atlântico e vértice precisamente na
Região Central das Grandes Nascentes (conforme sínteses-analíticas anteriores
de minha autoria).
3-
Se Angola providenciar, em reforço de suas políticas geoestratégias de paz em
África, a sua presença como observador nas instituições referentes aos Grandes
Lagos, e às bacias do Nilo e do Níger, Angola poderá reforçar sua capacidade
inteligente de interpretação corrente dos fenómenos
físico-geográficos-ambientais correlacionados com os fenómenos humanos, o que
irá enriquecer as abordagens múltiplas e multi sectoriais que há a realizar em
reforço das iniciativas geoestratégicas de paz.
Angola
deve levar em conta que não será com interpretações de carácter elitista que
poderá aprofundar conhecimentos e convencer; por isso as trilhas indexadas à
hegemonia unipolar e aos expedientes de capitalismo neoliberal, tendo em conta
a história de África desde o século XIX, trilhas que se afiguram menos
apropriadas ou mesmo contraproducentes.
A
trilha da emergência multipolar, perseguindo uma lógica com sentido de vida nos
termos duma globalização inclusiva, afigura-se muito mais coerente com as
aspirações de paz e luta contra o subdesenvolvimento, pois até os processos de
mercado “win-win”, não tocando nas questões de carácter sócio-político,
dão outra desenvoltura às capacidades a instalar a partir dos “soft power”decisivos,
inibindo as pretensões neocoloniais.
Angola
sendo pois uma notável charneira, tem em aberto opções pacientes a fazer, por
vezes com o risco de serem opções contraproducentes, mas com possibilidades de
correcção se a noção em prol dum desenvolvimento sustentável com base numa
geoestratégia baseada nas correlações que acima indico (fenómenos
físico-geográficos-ambientais correlacionados com os fenómenos humanos), forem
adoptadas numa visão para todo o continente, enquanto diapasão-reitor da
orientação.
Ainda
não está formado um núcleo duro em Angola, capaz de alicerçar as visões
geoestratégicas inteligentes mais arrojadas em benefício da paz, da luta contra
o subdesenvolvimento, do aprofundamento da democracia e isso passa pela
compreensão total do que se passa por inteiro em todo o continente-berço da
humanidade, com abordagens que observam os fenómenos do geral para o particular
e nunca perdendo de vista a dialéctica em que esses fenómenos ocorrem!
Ilustrações:
A visão geoestratégica necessária para o continente africano no seu todo; As
quatro maiores bacias hidrográficas de África e os Grandes Lagos, o maior
tesouro africano; A bacia geoestratégica do Congo, de que Angola faz parte com
as bacias do Cuango e do Cassai; A bacia geoestratégica do Zambeze e o Grande
Lago Niassa com foco em Moçambique).
3 comentários:
Onde é que se lembrou dessa teoria das nascentes de água como pólos políticos?
A minh'alma está parva...
Eu, sinceramente, não me acredito nada nestas inteligências raras caídas do céu aos trambolhões.
Que força política está por detrás do sr. M.Junior?
Um dos factores evidentes de potenciais conflitos em África é a procura, sob tensão, de espaço vital irrigado, em função do aumento da área inóspita de desertos quentes a norte (Sahara/Sahel) e sul do continente (Namibe-Kalahári)...
As migrações humanas em África estão intimamente associadas às potencialidades dos conflitos do caos e do terrorismo, algo que também é sentido pelos europeus, conforme as crónicas quotidianas das migrações no Mediterrâneo e as reacções sócio-plolíticas em toda a extenção da UE...
Desconhecer essas questões quando se procuram resolver tensões, conflitos e guerras em África, não favorecem as prementes políticas de paz!
Qualquer geoestratégia para um desenvolvimento sustentável em África terá de levar em conta a ausência ou a existência de água no interior do continente.
Isso interfere como é lógico nas obrigações de cariz sócio-político correntes em todo o continente.
Se assim não for considerado, persistirá o risco não só de desconexão nas projecções económicas do âmbito da diversificação, como também haverá ausência de estudos integrados sobre as nascentes, os lençóis freáticos e os cursos dos rios, bem como sobre os lagos, estudos e investigações que devem levar em linha de conta a preservação de ambientes de forma a tornar o desenvolvimento sustentável e, benefício das futuras gerações.
Verifica-se já que a ocupação vital humana do território continental ocorre nos lugares onde há água interior, aumentando a um ritmo superior às outras áreas onde a escassez de água está efectivamente associada à menor densidade populacional...
Será que há quem queira que África não desperte sobre estes fenómenos?
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