“Podemos
mover qualquer coisa através da Pemba. Todos estão comprados” - afirma traficante
de marfim
@Verdade | Tema de Fundo
A
Agência de Investigação Ambiental(EIA, acrónimo em inglês) revelou esta semana
que um grupo de cidadãos chineses, oriundos da cidade de Shuidong, dominam o
tráfico ilegal de marfim do nosso continente para a Ásia e têm preferência pelo
porto da capital de Cabo Delgado. “Francamente, é mais fácil fazer este negócio
em Moçambique ... é mais fácil de operar. Na Tanzânia, nem pense nisso. Podemos
mover qualquer coisa através da Pemba. Todos estão comprados”, confessou um dos
traficantes aos investigadores da EIA.
A investigação publicada esta semana, resulta de cerca de
três anos de trabalho envolvendo agentes infiltrados desta Organização Não
Governamental baseada no Reino Unido, e conseguiu apurar que 80% do tráfico de
marfim que entra na China é controlado por mais de uma dezena de sindicatos do
crime muito bem organizado que estabeleceu-se em África desde os ano 90.
A
localização geográfica da cidade de Shuidong justifica o seu papel central como
“hub” do tráfico de marfim. Está próxima a este do mais movimento porto do
mundo, Hong Kong, que é também uma das rotas preferenciais dos grandes
carregamentos de marfim. A da cidade situa-se a província de Guangxi, que faz
uma fronteira porosa com o Norte do Vietnam onde está localizado o porto Hai
Phong, outro local de trânsito muito usado pelos traficantes. E a Norte de
Shuidong localiza-se a província de Fujian, um dos centros de produção de
objectos de marfim na China.
O
grupo a que a EIA conseguiu acesso, fazendo-se passar por um potencial
comprador, começou por operar na Tanzânia, usando o porto de Zanzibar, mas o
aperto das autoridades do país vizinho ao tráfico viram-se forçados a procurar
outras portas de saída para os seus produtos ilegais, o porto de Pemba foi o
escolhido.
Os
investigadores da EIA ganharam a confiança de um grupo de três elementos
originários desta cidade do sul da China, identificados como Ou Haiqiang, Xie
Xingbang and Wang Kangwen, estabelecidos em Moçambique alegadamente como
empresários de caixilharia de alumínio e da pesca de pepinos do mar e lagosta,
mas que acabaram por confidenciar o seu envolvimento no tráfico de marfim.
A
investigação apurou que este grupo na realidade é uma segunda geração de
traficantes provenientes da cidade de Shuidong.
Os
traficantes relataram aos investigadores da EIA como não correu bem uma
primeira encomenda de 3,5 toneladas de marfim que fizeram a um fornecedor
moçambicano. Embora o transporte até a China tenha decorrido sem incidentes
quando abriram o contentor verificarem ter sido enganados, receberem 2,9
toneladas dos dentes de elefantes e outras 100 quilos cuja qualidade não era
boa.
“Francamente,
é mais fácil fazer este negócio em Moçambique ... é mais fácil de operar”
Posteriormente,
segundo a investigação que estamos a citar, o mesmo grupo voltou a “importar”
marfim ilegal, só que mudou de fornecedor moçambicano e juntou ao grupo um
intermediário tanzaniano, que a EIA apurou ser um frequentador habitual da
cidade de Pemba.
Esta
investigação deixa claro que os traficantes chineses não compram o que existe
mas sim fazem encomendas, e daí os caçadores moçambicanos tratam de matar os
animais para satisfazer a demanda, ganhando entre 80 a 100 dólares por quilo.
Para
o segundo carregamento a encomenda foi de 3 toneladas de marfim. Desta vez, ao
que a investigação indica, os traficantes chineses participaram pessoalmente na
selecção do marfim pré-embarque, sempre acompanhados pelo intermediário
tanzaniano. O carregamento acabou por ser de 2,3 toneladas, que depois de
transportadas para a cidade de Pemba foram embaladas num contentor de 40 pés,
os custos de envio foram de 300 dólares norte-americanos por quilo, tudo pago
em dinheiro vivo.
“Francamente,
é mais fácil fazer este negócio em Moçambique ... é mais fácil de operar. Na
Tanzânia, nem pense nisso. Podemos mover qualquer coisa através da Pemba. Todos
estão comprados”, confessou Ou Haiqiang aos investigadores da EIA.
Recordar
que em Janeiro último, após mais de duas toneladas de marfim que partiram de
Pemba terem sido apreendidas no Vietnam, Amélia Nakhare, a presidente da
Autoridade Tributária de Moçambique(ATM), reconheceu que “os nossos portos
continuam muito porosos sobretudo a nível da Região Centro e Norte. Estamos
conscientes que ainda existe muita porosidade, que ainda temos muito
contrabando das espécies mais preciosas que nós temos, quer ao nível da
madeira, quer ao nível dos troféus das diferentes espécies que efectivamente saem
das nossas fronteiras, apesar do trabalho que está a ser feito, mas não estamos
parados, estamos a trabalhar”.
Entretanto
a EIA apurou que os traficantes servem-se de empresas formais, com negócios
legítimos, de parceiros para não levantarem suspeitas das autoridades não só
moçambicanas mas ao longo do trajecto, e preferem que os contentores não viagem
directamente de África para a China, mas sejam transbordados em pelo menos dois
portos de trânsito onde têm já contactos estabelecidos.
Os
investigadores da EIA acompanharam a chegada do carregamento a cidade de
Shuidong, seis meses após a partida de Pemba, onde o marfim foi revendido por
750 dólares norte-americanos o quilograma a produtores de objectos que são
vendidos legalmente no país asiático.
A
EIA refere na sua investigação que e informação relevante que conseguiu apurar
durante este trabalho foi partilhada com as autoridades dos países
referenciados. Todavia o @Verdade sabe que a Administração Nacional das Áreas
de Conservação (ANAC), entidade que coordena no nosso país a “guerra” contra a
caça e tráfico ilegal, não recebeu informação nenhuma da Agência de Investigação
Ambiental, só teve acesso a investigação publicada.
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