Díli,
24 ago (Lusa) - Um casal de portugueses condenado hoje a oito anos de prisão
por um tribunal timorense declarou-se "chocado" com a sentença, num
processo que dizem ter-lhes roubado três anos de vida, saúde, estabilidade
económica e o bem-estar da família.
"Esta
mentira roubou não só a nossa vida, como também a vida das nossas crianças, a
vida da nossa família, mas também a confiança das pessoas que amam este
país", escrevem Tiago e Fong Fong Guerra numa mensagem enviada à Lusa.
"Nada
temos para devolver a Timor-Leste. Porque nada roubámos, não temos nem nunca
tivemos em nossa posse nenhum valor nem nada que pertença a Timor. Tudo o que
temos e tivemos é do conhecimento do tribunal, comprovado por documentos
emitidos pelas devidas entidades e autoridades", notam ainda.
A
mensagem enviada por correio eletrónico é a primeira reação do casal depois de
um coletivo de juízes do Tribunal Distrital de Díli os ter condenado a oito
anos de prisão efetiva e ao pagamento de uma indemnização de 859 mil dólares
por peculato.
O
casal está retido há quase três anos em Díli impossibilitado de sair do país
tendo vivido a quase totalidade desse período - enquanto aguardavam pelo
julgamento - longe dos filhos que estão com os avós em Portugal.
"A
Justiça Timorense já nos tirou três anos de vida, a nossa saúde, a nossa
estabilidade emocional e económica e, principalmente, o bem-estar da nossa
família e dos nossos filhos", escrevem.
Na
nota o casal considera-se bode expiatório num processo em que "a verdade
deixou de ser relevante" e em que por ser "preciso culpa alguém"
se escolheram os dois portugueses.
Tiago
e Fong Fong Guerra, que assinam a declaração, explicam que sempre confiaram que
o Tribunal de Díli "veria claramente que a história criada pelo Ministério
Público não corresponde à verdade", como dizem ter-se demonstrado no
julgamento.
"Nenhuma
prova incluída no processo, nem nenhuma testemunha corroborou a tese criada
pelo Ministério Público ou confirmou qualquer dos factos que alega. Somos
inocentes e o tribunal tem em sua posse as provas dessa inocência",
escrevem.
O
casal Guerra diz que nos últimos anos sempre fez tudo para colaborar com a
justiça, fornecendo todos os documentos que comprovam a sua inocência, acabando
por ser confrontados com uma sentença que "segue exatamente a história
montada pelo Ministério Público, nuns casos ignorando as provas documentais e,
noutros, fazendo interpretações dos documentos sem qualquer sentido".
"Esta
decisão do tribunal de Díli é chocante para nós. Temos a forte sensação que
estamos a ser acusados, perseguidos e discriminados por termos tido a má sorte
de nos cruzarmos com um burlão profissional que a todos enganou, incluindo a
nós, e é preciso um bode expiatório", refere, confirmando que vão recorrer
do caso.
Os
dois portugueses foram julgados pelos crimes de peculato, branqueamento de capitais
e falsificação documental sendo central ao caso uma transferência de 859 mil
dólares (792 mil euros), feita em 2011 a pedido do consultor norte-americano,
Bobby Boye.
Boye
foi um consultor pago pelo governo norueguês e posteriormente pelo governo timorense
e que chegou a ser coarguido neste processo.
O
tribunal deu como provado todos os factos da acusação considerando que os
arguidos pretendiam com esta operação apropriar-se do dinheiro, dissimulando-o
como fundos próprios para exonerar-se da sua responsabilidade criminal.
Considerando
falso o alegado conluio com Boye, o casal diz que ter sido "enganado e
usado" pelo consultor, da mesma forma que foram os Governos da Noruega e
de Timor-Leste.
"O
mais inacreditável é que, segundo os autos do processo, quem apresentou a
denúncia deste caso ao Ministério Público foram as mesmas pessoas responsáveis
pelo contrato de Bobby Boye, que junto com outros funcionários do Ministério
das Finanças estavam informadas sobre tudo o que ele fazia, enquanto nós nada
soubemos do que se passava até tudo vir a público. Como é possível sermos nós,
que nada sabíamos, acusados e condenados?", escreve, referindo-se a um
processo que consideram "kafkiano".
ASP
// EL
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