Ana Alexandra Gonçalves* | opinião
Não é surpresa afirmar que a
comunicação social atravessa a sua pior crise. A informação tornou-se acessível
a todos, de forma gratuita, e a comunicação social não foi capaz de pugnar pela
qualidade e pela isenção, estabelecendo dessa forma uma diferença incontornável
com a profusão de informação e opinião que encontramos online. O que resta,
sobretudo em Portugal, é uma comunicação social refém de grandes grupos
económicos, e por inerência dotadas de uma agenda própria.
A televisão, designadamente o
sector do entretenimento, não escapa à celeridade das mudanças tecnológicas. A
forma de se ver televisão está a mudar inexoravelmente com clara vantagem para
os serviços de streaming. Este contexto não pode ser dissociado do lixo que
abunda nas televisões. A SIC propõe ir ainda mais longe, recorrendo a um
programa de televisão ((Super Nanny) em que as crianças, com a autorização dos
pais, são usadas para se atingir um determinado patamar nas audiências. E mais,
depois da polémica e após ainda a intervenção de várias instituições que visam
a protecção dos direitos das crianças, a SIC insiste e recorre a uma
argumentação que passa invariavelmente ao lado do essencial: as crianças e o
direito à sua dignidade que passa também pela não exposição gratuita de imagens
suas (amiúde as piores por se inserirem em contextos particularmente difíceis).
Insiste-se não só no carácter alegadamente inócuo, como por vezes se tenta até
chamar à colação aspectos alegadamente positivos do programa, como se se
tratasse de um instrumento para as melhores práticas de parentalidade. E mesmo
que tudo isso seja verdade, o essencial mantém-se: é tudo à custa da dignidade
de crianças que, naturalmente, ainda não podem fazer escolhas
conscientes.
O drama das televisões, do seu
modelo anacrónico e da impossibilidade de se manter como sector rentável, dá
origem a más decisões, fundamentadas com outras más decisões, designadamente
aquelas que encontramos online.
Paralelamente, se o programa é
transmitido em mais de 20 países - argumento de peso da SIC - então qual é
problema? Por aqui também se depreende a qualidade da argumentação da SIC.
Em suma, o programa da SIC
"Super Nanny" é o resultado do drama vivido pelas televisões. O drama
daqueles que vislumbram o seu fim e perdem o que lhes resta de discernimento. E
todo este esforço pode ser contraproducente, sobretudo se os principais
patrocinadores abandonarem o barco, como parece já estar a acontecer.
* Ana Alexandra Gonçalves | Triunfo da Razão
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