Os casos de mutilação genital
feminina na Guiné-Bissau estão a diminuir, mas, para acabar com a prática, é
preciso apostar na escolarização das pessoas, principalmente, das mulheres,
defende especialista.
Assinala-se esta terça-feira
(06.02), o Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina. A
mutilação genital é uma prática que retira o clitóris e, por vezes vezes,
outras partes do órgão genital feminino. Esta ação pode causar hemorragias, o
que pode levar à morte ou a vários problemas de saúde, como, por exemplo,
a infertilidade. Dados da Nações Unidas revelam que cerca de 200 milhões de
mulheres e de meninas foram submetidas ao fenómeno, comum em vários países.
A Guiné-Bissau é um dos vários
Estados onde mulheres e meninas continuam a ser submetidas a esta prática. No
entanto, o número de casos tem diminuído, graças às campanhas de sensibilização
levadas a cabo pelas autoridades guineenses e organizações internacionais e a
criação, em 2011, da lei que criminaliza a mutilação genital feminina.
Segundo Fatumata Djau Baldé,
ex-ministra guineense dos Negócios Estrangeiros e presidente do Comité para o
Abandono das Práticas Tradicionais Nefastas à Saúde da Mulher e da Criança da
Guiné-Bissau, cada vez mais as comunidades estão a abandonar a prática.
Fatumata Baldé explica que até ao dia 15 de dezembro de 2017, 67
comunidades declararam publicamente o abandono deste prática no país. No
entanto, sublinha que "nessas comunidades, provavelmente, nem todas as pessoas abandonaram.
Acima de 80 por cento eliminaram, até porque tiveram a coragem de o dizer
publicamente".
Uma questão cultural
Por ser considerada por muitos
como parte da sua identidade cultural, não é possível abandonar a prática da
mutilação genital feminina de uma hora para a outra, sublinha Fatumata Djau
Baldé. A aposta na escolarização das pessoas, em particular das mulheres, seria
uma forma eficaz de combater este fenómeno.
Fatumata Djau Baldé acredita que
a escolarização terá um papel fundamental neste processo. "Se
começarmos a falar destes aspetos nas escolas, aos jovens que serão mães e
homens de amanhã, obviamente, que tendo conhecimento dessas práticas, eles
terão mais instrumentos para poderem proteger as sua filhas e não submeterem
elas à mutilação", explica.
O caso do Senegal
No vizinho Senegal, os efeitos
das campanhas contra a mutilação genital feminina também já se fazem sentir,
embora a prática continue a ser uma realidade em regiões mais
conservadoras, como Kolda, no sul do país. Ainda assim, mulheres como Dieynaba
Sowa, que praticavam excisões, abandonaram a tradição com a ajuda de uma
campanha da Associação Senegalesa para o Bem-Estar das Mulheres.
Sowa lembra que percorreu muitas
aldeias para fazer excisões genitais. Até mesmo na fronteira com a
Guiné-Bissau. "Mas abandonámos a prática nas meninas. Temos seis meninas
aqui, mas não foram submetidas à excisão", afirma.
Em maio de 2017, cento e
dezassete aldeias proibiram a mutilação genital feminina na região. E a prática
está a ser erradicada no Senegal.
Evolução no universo masculino
A Guiné-Bissau regista uma
evolução também entre os homens. Se antes eram a favor da mutilação genital -
principalmente os líderes religiosos - hoje, o cenário é bem diferente, diz
Fatumata Djau Baldé.
Publicamente, são poucos os
homens que defendem a prática, porque antes os que defendiam a mutilação
justificavam a mesma como uma recomendação religiosa. Hoje em dia, muitos
desses líderes já saíram a público para dizer que a prática não é uma
recomendação religiosa, realça.
Embora os casos de mutilação na
Guiné-Bissau tenham diminuído, as preocupações continuam em relação à diáspora.
Fatumata Djau Baldé lamenta o facto de muitas pessoas continuarem a seguir este
caminho.
A mutilação genital feminina é
considerada pelas Nações Unidas Unidas uma violação dos Direitos Humanos. Por
isso, a organização lembra neste Dia Internacional de Tolerância Zero à
Mutilação Genital Feminina que as vítimas têm vários direitos violados,
como o direito à saúde, à integridade física e o direito a estar livre de
tortura e tratamentos cruéis ou desumanos.
A erradicação da prática da
mutilação genital feminina é um dos elementos que compõem a Agenda 2030
e vários Estados assumiram o compromisso da sua eliminação.
Ângelo Semedo | Deutsche Welle
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