João Lourenço disse esperar que a
impunidade “tenha os dias contados” em Angola. Insistiu na “moralização” da
sociedade angolana. Estava a ser ingénuo, imprudente ou suicida? Se calhar,
fazendo a simbiose de tudo isto, está apenas a gozar com a nossa chipala e
fazer de todos nós… matumbos. Seis meses depois da posse a grande diferença
está no embrulho e no acessório.
O Presidente disse, por exemplo,
no dia 23 de Novembro de 2017, ser necessária a “moralização” da sociedade, com
um “combate sério” a práticas que “lesam o interesse público” para garantir que
a impunidade “tenha os dias contados”.
É uma verdade de La Palice. É
verdade há muitos anos e a responsabilidade é do MPLA, partido do qual João
Lourenço foi e é dirigente, tal como foi dos governos de José Eduardo dos
Santos aos quais João Lourenço pertenceu como ministro. Então, durante todos
esses anos, o que fez João Lourenço para combater as práticas que “lesam o
interesse público”?
O chefe de Estado falava no
Palácio Presidencial, em Luanda, na tomada de posse do novo inspector-geral da
Administração do Estado, Sebastião Domingos Gunza, que transitou do Serviço de
Investigação Criminal (SIC).
“No quadro da necessidade de
moralização da nossa sociedade, importa que levemos a cabo um combate sério
contra certas práticas, levadas a cabo quer por gestores quer por funcionários
públicos. Práticas que, em princípio, lesam o interesse público, o interesse do
Estado, o interesse dos cidadãos que recorrem aos serviços públicos”, disse
João Lourenço.
Sendo, repita-se, uma verdade de
La Palice, como tantas outras que constituem o ADN do partido do qual é
vice-presidente, é caso para perguntar se só agora é que João Lourenço
descobriu a pólvora?
Ou será que só agora é que João
Lourenço descobriu que Angola é um dos países mais corruptos do mundo? Que é
líder mundial da mortalidade infantil? Que tem 20 milhões de pobres?
“Esperamos que a tão falada
impunidade nos serviços públicos tenha os dias contados. Não é num dia,
naturalmente, que vamos pôr fim a essa mesma impunidade, mas contem com a ajuda
de todos e acreditamos que, paulatinamente, vamos, passo a passo, caminhar para
a redução e posteriormente a eliminação da chamada impunidade”, concluiu João
Lourenço.
Na cerimónia, Sebastião Domingos
Gunza assumiu o compromisso de “acabar com as más práticas” e os “vícios” na
administração do Estado.
Recorde-se que o Presidente
exonerou a 20 de Novembro o anterior Inspector-geral da Administração do
Estado, Joaquim Mande que, num despacho publicado a 15 de Setembro, gerou forte
polémica em Angola e não chegou a ser esclarecido publicamente.
O documento, publicado 11 dias
antes da tomada de posse de João Lourenço como Presidente, mostrava o que era e
é o MPLA: Determinava que ficavam “arquivados todos os processos da actividade
inspectiva desenvolvida pela Inspecção Geral da Administração do Estado de 1 de
Janeiro de 2013 a 30 de Agosto de 2017”.
Desde que tomou posse, a 26 de
Setembro, na sequência das eleições de 23 de Agosto, João Lourenço começou a
mudar a decoração do país, exonerando diversas administrações de empresas
estatais, dos sectores de diamantes, minerais, petróleos, comunicação social,
banca comercial pública e Banco Nacional de Angola, anteriormente nomeadas por
José Eduardo dos Santos.
Génios e matumbos?
Quando, a 10 de Maio de 2017,
João Lourenço, garantiu em Luanda que o MPLA iria lutar contra a corrupção, má
gestão do erário público e o tráfico de influências… poucos acreditaram. Hoje
há mais gente a acreditar? Já houve mais. As dúvidas continuam a ser mais do
que as certezas.
João Lourenço discursava –
recorde-se – no acto de apresentação pública do Programa de Governo 2017-2022
do MPLA e do seu Manifesto Eleitoral, mostrando a convicção de que – mais uma
vez – os angolanos iriam votar com a barriga (vazia) e que havendo 20 milhões
de pobres… a vitória seria certa. E foi.
João Lourenço sublinhou que o
programa do MPLA para os próximos cinco anos “é coerente e consistente”, mas
para a sua aplicação “de modo efectivo e com sucesso” são precisas instituições
fortes e credíveis.
“Para a efectiva implementação
deste programa temos de ter os homens certos nos lugares certos”, referiu João
Lourenço, então ministro da Defesa, efusivamente aplaudido pelos militantes
presentes, na altura (hoje já não é bem assim) formatados e pagos para aplaudir
seja o que for que João Lourenço dissesse.
Ainda de acordo com João Lourenço
o MPLA iria “promover e estimular a competência, a honestidade e entrega ao
trabalho e desencorajar o ‘amiguismo’ e compadrio no trabalho”.
Já antes, no dia 28 de Fevereiro,
prometeu um “cerco apertado” à corrupção, que está a “corroer a sociedade”, e o
fim da “impunidade” no país. Recorde-se que este mesmo MPLA sempre negou, ou
minimizou, que a corrupção fosse um “mal que corrói a sociedade”, dizendo que a
corrupção é um fenómeno que afecta todos os países. Aliás, João Lourenço
advertiu que o problema é a “forma” como Angola encara o problema: “Não podemos
é aceitar a impunidade perante a corrupção”.
“O MPLA reafirma neste programa
de governação o seu compromisso na luta contra a corrupção, contra a má gestão
do erário público e o tráfico de influências”, reitera João Lourenço,
acrescentando que o partido conta com “os angolanos empenhados na concretização
do sonho da construção de um futuro melhor para todos”.
“Vamos contar com aqueles que
estão verdadeiramente dispostos a melhorar o que está bem e a corrigir o que
está mal”, disse numa referência ao lema da campanha do MPLA.
João Lourenço admitiu que o “MPLA
tem consciência de que muito ainda há a fazer e que nem tudo o que foi
projectado foi realizado como previsto”. Por outras palavras, se ao fim de 42
anos de poder, 16 de paz total, o MPLA só conseguiu trabalhar para que os
poucos que têm milhões passassem a ter mais milhões, esquecendo os muitos
milhões que têm pouco… ou nada, talvez seja preciso manter o regime do MPLA
mais 50 anos no poder.
“Contudo, o país tem rumo e
estamos no caminho certo, no sentido da satisfação progressiva das aspirações e
dos anseios mais profundos do povo angolano”, disse João Lourenço.
Segundo João Lourenço, para que
todos os angolanos beneficiem cada vez mais das riquezas do país, o MPLA tem
como foco no seu programa de governação para os próximos cinco anos dar
continuidade ao seu programa de combate à pobreza e à fome, bem como o aumento
da qualidade de vida do povo.
Para a juventude, a franja da
sociedade a quem o MPLA atribui “importância fundamental nos processos de
transformação política e social de Angola”, João Lourenço disse que vai
continuar “a contar cada vez mais com os jovens nas imensas tarefas do
progresso e do desenvolvimento”.
Sobre a consolidação da
democracia angolana, destacou a realização de eleições autárquicas, a permissão
para posicionar o país “num movimento de verdadeira descentralização
administrativa”.
“Com a instauração das
autarquias, a administração estará mais próxima das populações, o que tornará
mais fácil a percepção das suas necessidades e aspirações e também a sua
satisfação”, realçou. Terá João Lourenço descoberto a pólvora?
No Lubango disse: “Uma das nossas
preocupações, depois de Agosto, será precisamente, não digo criar, mas procurar
ampliar ao máximo essa classe média angolana, à custa da redução dos pobres (…)
Fazer com que a classe média seja superior à soma dos pobres e dos ricos”.
Se para esses acólitos do MPLA o
período de guerra civil (apesar de ter terminado em 2002) justifica tudo, para
nós não. Dá jeito ao MPLA estar sempre a falar disso, ir ressuscitando Jonas
Savimbi, e, misturando tudo, renovando que heróis só são os do MPLA. Tudo
porque… ou o MPLA ganhava ou o fim do mundo chegaria no dia seguinte. Mas não é
assim.
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