Recordam-se 41 anos do “Golpe de
27 de Maio de 1977” ou “Fratricídio do 27 de Maio de 1977” entre militantes do
MPLA, então MPLA-Partido dos Trabalhadores; recorda-se, rememora-se ou há quem
persista em mantê-lo para que, sem coragem, de outra forma, o conservar sempre
na memória do colectivo um Processo que persiste em estar na anamnese da
sociedade?
Eugénio Costa Almeida (*) | Folha 8 | opinião
Há uns anos, no portal Notícias
Lusófonas, por ocasião dos 30 anos desta data, escrevia sobre uma entrevista, a
um jornal português, creio que o Público, sobre este tema, de um dos
comandantes cubanos que, na altura, estava em Luanda – Rafael del Pino, autor
de “Proa a la Libertad” (Rumo à Liberdade) – a um jornal português, onde aquele
apresentava o “Golpe de 27 M” como tendo sido um “jogo de poder” entre cubanos
e soviéticos (algo que parece vir-se confirmando, cada vez mais, em recentes
investigações académicas).
Ora, escrevi na altura – como
agora –, que aquela entrevista parecia reforçar a ideia que Agostinho Neto não
teria morrido, em Moscovo, devido à doença de que padecia e que levou à mesa de
operações, mas que teria sido vítima de um eventual macabro jogo de interesses
soviéticos (um assunto nunca cabalmente esclarecido e que, ainda hoje, é
assunto tabu, nem mesmo nos documentos desclassificados do KGB e já – alguns –
transcritos por autores diversos, este assunto é tratado).
Nesse mesmo texto recordava – e
mantenho – que sobre o 27M, talvez fosse altura de todos os que nele
participaram se juntarem num conclave nacional, tipo Comissão de Reconciliação
e de Verdade, e todos, mas TODOS, expiarem as suas culpas – aqueles que
participaram no Golpe e os que purgaram no pós-golpe –, permitir às famílias
fazerem o luto oficial – muitas hão que desconhecem onde estão enterrados os seus
entes queridos vitimados (foram cerca de 30 mil as vítimas) nas purgas
posteriores ao Golpe – e, finalmente, reconciliar a sociedade.
Há que dar oportunidade de
milhares de famílias obterem as certidões de óbito dos seus familiares
desaparecidos. Não basta dizer que a Guerra acabou quando na Sociedade ainda
persiste uma ferida muito grave por sarar; (vários depoimentos recentes, no
Folha 8, sobre este persistente assunto, assim o demonstram)!
Citando, Rafael Marques, em
entrevista ao referido jornal português que entrevistava del Pino, que só
quando isso acontecer haverá um processo “genuíno de reconciliação” e,
finalmente, os mortos poderão “repousar na memória colectiva da sociedade, ser
emocionalmente enterrados pelos seus entes queridos e justificar o perdão a
mandantes e carrascos”.
Porquanto numa sociedade, onde
todos os anos o espectro do 27 de Maio de 1977 renasce e sempre com cargas
emocionais traumáticas e, por vezes, descompassadas, porque numa sociedade onde
não haja entendimento nem reposição da verdade, reabilitação da injustiça,
reconhecimento das responsabilidades individuais e colectivas, do pedido
genuíno do perdão – e este deve ser feito por todos os que estiveram no
processo – temos que concluir que será sempre uma sociedade castrada.
É altura de todos olharmos para
Angola como um País que enterrou todos os seus dramas.
É altura do MPLA abrir-se, de
vez, à comunidade e criar, internamente ou mesmo através do Governo nacional,
na linha do que fez, e muito bem, a África do Sul e, mais recentemente, o
Brasil, a tal Comissão de Verdade onde tudo pudesse ser transmitido à
comunidade e libertar todos os fantasmas.
Recordemos que o MPLA está a
caminho de uma nova direcção em Setembro, data prevista para a passagem de
testemunho na liderança do MPLA entre José Eduardo dos Santos e João Lourenço –
se não houver surpresas de última hora;
Se João Lourenço, que já está à
frente dos destinos do País, e que – tudo o parece estar a mostrar nesse
sentido – deseja ser um reformador (já que não quer ser o Gorbatchov nacional,
como eu alvitrei num artigo no Africa Monitor e numa entrevista ao jornal
Público) do tipo Deng Xiaoping;
Então que, se não for antes, haja
– como ainda ontem alguém, com pertinência, o referir – uma Setembrina e, nessa
altura, o partido se abra, de vez, à sua comunidade interna e ao País e o tema
27 Maio de 1977, passe, descansadamente, à História.
Ou seja, todos os que
participaram neste processo se juntem num conclave nacional, numa Comissão de
Reconciliação e de Verdade, e todos, mas TODOS, redimirem os seus erros e
culpas, permitir às famílias fazerem o luto oficial e, finalmente, reconciliar
a sociedade.
Quando isso acontecer Angola será
mais forte, mais una, mais fraterna, mais solidária! Têm a palavra o “donos o
processo 27M”!
(*) Investigador do Centro de
Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL) e Pós-Doutorando da Faculdade de
Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto.
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