Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite* | Porto Alegre
“O livro traz a dupla delícia de
a gente estar só e acompanhado ao mesmo tempo” / Mário
Quintana (1906 -1994)
Muitos podem pensar que o livro de
bolso não é uma invenção tão antiga. Trata-se de um erro. Formato
reduzido e com o preço acessível, o livro de bolso se popularizou na Europa do
século 19, a exemplo da Coleção Charpentier na França, das edições Tauchnitz na
Alemanha e dos livros oferecidos nas estações de trem da Inglaterra.
No Rio Grande do Sul, o livro de
bolso, de acordo com alguns autores, remete-nos à poetisa cega Delfina Benigna
Cunha (1791-1857), nascida em S. José do Norte (RS), na Estância do Pontal.
Entre outras obras, ela é autora de Poesias oferecidas às senhoras
rio-grandenses (1834), considerado o primeiro livro de poesia impresso no Rio
Grande do Sul, reeditado, em 1838, no Rio de Janeiro.
No livro 50 anos de
Literatura / Perfil das Patronas (1993), pág.25, organizado pela Academia
Literária Feminina do Rio Grande do Sul (ALFRS), a escritora Marília Beatriz
Cibils Becker registrou sobre a poetisa cega: “(...) seus livros são de pequeno
tamanho, fáceis de manusear e delicados para a leitura das senhoras (livro de
bolso)”. Esta escritora ocupa, na ALFRS, a cadeira nº 1, da qual Delfina
Benigna Cunha é a patrona. Já o autor Eloy Terra, em seu livro As Ruas de
Porto Alegre (2001), da Editora AGE, pág. 69, ao se referir à obra da poetisa
cega, complementou: “ (...) Era um livro de pequeno formato. Cabia na bolsa das
senhoras da sociedade.”
No Brasil, os primeiros
livros de bolso, em série, são creditados à Coleção Globo, lançada, em 1933,
pela Livraria do Globo de Porto Alegre. Totalizando 24 títulos, os livros
mediam 11 x 16 cm. Em 1942, o seu editor e empresário Henrique Bertaso
(1906-1977) lançou a Coleção Tucano. Infelizmente, ambas as iniciativas tiveram
um sucesso apenas parcial.
Nos anos 60, diante do
êxito de venda do “pocket book”, nos supermercados dos Estados Unidos,
novamente a Editora Globo decidiu investir no livro de bolso. Ao lançar, em
1961, a Coleção Catavento, a editora manteve a sua proposta inicial de difundir
os clássicos literários a preços populares, saindo, assim, do restrito circuito
das livrarias consideradas, à época, elitistas.
Segundo A. Coutinho Leite, em seu
artigo Difusão do livro de bôlso, publicado na revista literária Prêto e Branco,
da Editora Globo, nº 3, de 1961, a Coleção Catavento foi colocada à venda, em Porto Alegre, em
farmácias, confeitarias, supermercados e bares, sendo acondicionada em modernas
estantes de madeira. Alguns números desta revista fazem parte do acervo do Museu
da Comunicação Hipólito José da Costa, atualmente dirigido pela jornalista
Elizabeth Corbetta.
A verdade é que o livro de bolso
esperou algumas décadas, para conquistar um espaço definitivo no mercado,
embora os esforços da Editora Globo, da Edibolso, em consórcio liderado pela
Editora Abril, em 1971, seguido pelas Coleções Sagarana da José Olympio e
Saraiva. Ainda, no final da década de 70, o presidente da Brasiliense Caio
Graco Júnior e o editor da Companhia das Letras Luiz Schwarcz também adotaram o
formato 11x 16 cm na Coleção Primeiros Passos.
Historicamente, é notório de que
havia restrições quanto ao livro de bolso. Como os exemplares eram vendidos a
preços mais baixos, o livreiro não se sentia atraído em receber margens menores
por produto.
Finalmente, em fevereiro de
1997, com o lançamento de uma série, pela editora L&PM, composta de 12
clássicos da literatura universal, o “pocket book” iniciaria a sua consolidação
no mercado. Ivan Pinheiro Machado - um dos fundadores da L&PM - declarou
que a editora, em 2004, já havia alcançando a marca de 1.500 displays dos
pockets “do Belém à avenida Paulista”. Em 2011, a editora atingia a venda
expressiva de mais de dois milhões de livros de bolso em todo o Brasil.
Quanto a nossa
tradicional Editora Globo, em 1986, foi vendida à carioca Rio Gráfica Editora.
Fundada em Porto Alegre, em 1883, sua história permanece viva na memória
cultural dos gaúchos. Entre novidades e tantos sucessos, a Editora Globo foi
pioneira, no Brasil, ao introduzir no mercado o livro de bolso.
*Pesquisador
e coordenador do setor de imprensa do Museu da Comunicação HJC
Texto publicado no jornal gaúcho Zero Hora de
13/06/2018
Bibliografia:
Hallewell, Laurence. O Livro no Brasil / Sua
história. São Paulo: Edusp, 1985
Imagens:
1- Coleção: Collection
of British Authors
Editora: Bernhard Tauchnitz,
Alemanha /1902
2- Ora Bolas / O humor de Mário
Quintana - Juarez Fonseca - L&PM POCKET /2007
3-- Delfina Benigna Cunha (1791-1857),
4-- Poesias oferecidas às senhoras
rio-grandenses (1838) / 2ª edição no Rio de Janeiro.
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