Manlio Dinucci*
Embora a imprensa internacional
tenha distorcido o conteúdo da Cimeira da NATO, o Establishment norte-americano
compreendeu perfeitamente o único desafio: o fim da inimizade com a Rússia. Por
esta razão, interromper a Cimeira USA-Rússia de Helsínquia, tornou-se a sua
prioridade. É necessário, por todos os meios, opôr-se a uma reaproximação com
Moscovo.
“Temos de discutir sobre tudo, do
comércio aos assuntos militares, aos mísseis, à energia nuclear, à China”:
assim fez a sua estreia, o Presidente Trump, em 16 de Julho, na Cimeira de
Helsínquia. “Chegou a hora de falar detalhadamente sobre as nossas relações
bilaterais e sobre os pontos nevrálgicos internacionais”, salientou Putin. Mas
para decidir quais serão, no futuro, as relações entre os Estados Unidos e a
Rússia, não são só os dois presidentes.
Não é coincidência que, assim que
o Presidente dos Estados Unidos estava prestes a reunir-se com o Presidente da
Rússia, o Procurador especial, Robert Mueller III, incriminava 12 russos sob a
acusação de manipularem as eleições presidenciais nos EUA, penetrando nas redes
de computadores do Partido Democrata para prejudicar a candidata Hillary
Clinton. Os doze, acusados de serem agentes do serviço secreto GRU, são
oficialmente denominados “Os Conspiradores” e indiciados por “conspiração
contra os Estados Unidos”.
Na mesma altura, Daniel Coats,
Director da National Intelligence e principal Conselheiro do Presidente sobre
esta matéria, acusou a Rússia de querer “minar os nossos valores básicos e a
nossa democracia”. Lançava, assim, o alarme sobre a “ameaça dos ataques
cibernéticos alcançarem um ponto crítico” semelhante ao que precedeu o 11 de
Setembro, da parte não só da Rússia, “o agente estrangeiro mais agressivo”, mas
também da China e do Irão.
Ao mesmo tempo, em Londres, os
“investigadores” britânicos comunicavam que o serviço secreto russo GRU, que
sabotou as eleições presidenciais nos Estados Unidos, é o mesmo que em
Inglaterra envenenou um antigo agente russo, Sergei Skripal, e a sua filha,
inexplicavelmente sobreviventes a um gás extremamente letal. O objectivo
político destas “investigações” é claro: sustentar que o chefe dos
“Conspiradores” é o Presidente russo, VladimirPutin, com quem o Presidente
Trump se sentou à mesa das negociações, apesar da vasta oposição bipartidária
nos USA.
Após a incriminação dos
“Conspiradores”, os Democratas pediram a Trump para cancelar o encontro com
Putin. Mesmo que não tenham conseguido, permanece forte a pressão deles sobre
as negociações. O que Putin tenta obter de Trump é simples, mas, ao mesmo
tempo, complexo: aliviar a tensão entre os dois países. Para isso, ele propôs a
Trump, que aceitou, uma investigação conjunta sobre a “conspiração”.
Não se sabe como se desenvolverão
as negociações sobre as questões cruciais: o estatuto da Crimeia, a condição da
Síria, as armas nucleares e outras. Nem se sabe o que Trump vai perguntar. No
entanto, é certo que toda concessão pode ser usada para acusá-lo de conivência
com o inimigo. Opõem-se a um afrouxamento da tensão com a Rússia, não só os
Democratas (que, com uma inversão dos papéis formais, desempenham o papel dos
“falcões”), mas também muitos Republicanos, incluindo representantes destacados
da própria Administração Trump. É o ’Establishment’ não só nos USA, mas também
na Europa, cujos poderes e lucros estão ligados às tensões e às guerras.
Não serão as palavras, mas os
factos a demonstrar se a atmosfera descontraída da Cimeira de Helsínquia se
tornará realidade.
Acima de tudo, com uma não
escalada da NATO na Europa, isto é, com a retirada das forças nucleares
USA/NATO enviadas contra a Rússia e o bloqueio da expansão da NATO para Leste.
➢ Mesmo que, sobre estas questões, fosse alcançado um acordo entre Putin e Trump, seria este último capaz de o concretizar?
➢ Ou, na realidade, essas mesmas questões serão decididas pelos poderosos círculos do complexo militar-industrial?
Uma coisa é certa: não podemos,
em Itália e na Europa, permanecer meros espectadores de negociações das quais
depende o nosso futuro.
Manlio Dinucci*
| Voltaire.net.org | Tradução Maria Luísa de
Vasconcellos | Fonte Il Manifesto
(Itália)
*Geógrafo e geopolítico. Últimas
publicações: Laboratorio
di geografia, Zanichelli 2014; Diario di
viaggio, Zanichelli 2017 ; L’arte
della guerra / Annali della strategia Usa/Nato 1990-2016, Zambon 2016.
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