Grupo Moçambicano da Dívida e
Comité para o Jubileu da Dívida querem "ilibar" a população da
responsabilização das dívidas que não contraiu. Qualidade de vida dos
moçambicanos está a degradar-se, diz ONG.
Em Moçambique, enquanto
Governo e credores continuam as negociações com vista a encontrar uma
solução para a reestruturação das chamadas "dívidas ocultas",
degrada-se a qualidade de vida da população.
Com o objetivo de chamar a
atenção nacional e internacional para as consequências que a falta de
financiamento está a ter na vida das pessoas, a organização não-governamental
Grupo Moçambicano da Dívida, em parceria com o Comité para o Jubileu da Dívida,
sediado em Londres, tem estado a levar a cabo campanhas de sensibilização que
visam "abanar consciências" e encontrar "uma solução menos
penosa" para a população.
As duas organizações, que uniram
forças quando veio a público este escândalo, pretendem declarar
"ilegais" estas dívidas. Em entrevista à DW África, Tim Jones, do Comité
para o Jubileu da Dívida, diz isso mesmo. "O que queremos é que a dívida
seja considerada ilegal porque não foi devidamente contraída. Queremos que as
pessoas do Governo responsáveis[por elas] sejam responsabilizadas no
tribunal, assim como os bancos em Londres que emprestaram o dinheiro. Eles são
os únicos que devem pagar e não o povo moçambicano", afirma.
No entanto, não é o que está a
acontecer. Enquanto o Governo moçambicano e os credores não chegam a acordo e
encontram uma solução, a dívida continua a aumentar. Segundo Eufríginia dos
Reis, da ONG Grupo Moçambicano da Dívida, "só em 2018, a dívida poderá vir
a crescer para 33,2 milhões de meticais". Um valor, diz, "que equivale
a 11% do total da despesa do Orçamento de Estado" e que "retira uma
grande parte dos recursos que deveriam ser canalizados diretamente para os
setores considerados chave".
Saúde e educação em risco
Eufríginia dos Reis não tem
dúvidas de que "esta questão da dívida já está a custar ao cidadão".
E prova disso são os problemas, já facilmente visíveis, em áreas como a saúde e
a educação que, em consequência deste escândalo "deixaram de beneficiar do
apoio do Orçamento".
Para esta moçambicana, são
"necessárias medidas urgentes", uma vez que "já não há
medicamentos nos hospitais, nem luvas para fazer partos". "Os
médicos, enfermeiros e técnicos estão lá, querem trabalhar, mas não há
medicamentos. É uma situação a que assistimos e que é muito penosa para o cidadão",
conta a mesma responsável.
"A vítima é o cidadão"
A posição
de Filipe Nyusi em relação a este tema é clara. O Presidente
moçambicano não quer declarar "ilegais" as dívidas contraídas entre
2013 e 2014 por três empresas públicas e com o aval do Estado. E é aí que está
o problema, aponta Eufríginia dos Reis. "É pelo facto do Governo não
querer declarar a ilegalidade das dívidas que o país continua refém desta
ausência de apoios e financiamento naquilo que são as áreas fundamentais para a
vida do cidadão". Para esta responsável, "devia haver mais
sensibilidade na parte política e da parte dos parceiros para que se encontrem mecanismos
mais justos do ponto de vista humano", porque, acrescenta, "a vida
das pessoas não tem preço".
Para já, e ainda sem soluções, o
Estado tem estado a "procurar recursos para se financiar". E isso tem
sido feito através das "despesas sociais", aponta a mesma
responsável. "Vemos os impostos a agravar-se, a coleta de receitas a
agravar-se de um e outro lado, e a vítima é o cidadão, o povo que não tem
nada".
Uma das soluções apontada pelas
organizações é que "as empresas que contraíram as dívidas criem um fundo
ao serviço dos setores chave" da sociedade. Eufríginia dos Reis adianta
que a ideia tem sido apresentada a "algumas personalidades do Governo e
que tem havido alguma aceitação". Acrescenta ainda que, a seu ver,
"os países onde a dívida foi contraída também devem ser
sensibilizados", de modo a "pressionarem os credores para que estejam
recetivos” a algumas destas medidas.
As organizações em causa
reclamam ainda um maior envolvimento da sociedade civil neste debate e a
publicação do relatório completo da auditoria feita às dívidas
ocultas.
Petição
Já no decorrer deste ano, o
Comité para o Jubileu da Dívida levou a cabo uma moção que manifestava
"preocupação com os empréstimos concedidos por bancos sediados em Londres
a empresas moçambicanas sem o consentimento do parlamento". Cerca de 100
deputados britânicos assinaram esta petição. Uma atitude na qual, diz a
responsável da ONG moçambicana, os parlamentares moçambicanos deviam pôr os
olhos. "Se os parlamentares lá fora estão a fazer isto por nós, porque é
que os nossos parlamentares também não podem fazer pelo seu povo? Eles é que
são os representantes legítimos deste povo, por isso queremos sensibilizá-los
para que também eles possam aderir a esta campanha e apoiar com ações
concretas".
Para além das preocupações já
citadas, os parlamentares britânicos exigem medidas mais transparentes para
garantir que todos os empréstimos concedidos pela lei do Reino Unido a
governos, ou com garantias governamentais, sejam divulgados publicamente no
momento em que são feitos e cumpram a lei do país em questão.
Raquel Loureiro | Deutsche Welle
Sem comentários:
Enviar um comentário